BRASÍLIA - O movimento do governador de São Paulo, João Doria, de acirrar o clima de confronto com o presidente Jair Bolsonaro e se distanciar do governo federal tem encontrado resistência no PSDB. Segundo integrantes da sigla, o projeto eleitoral do paulista, que tenta ser uma alternativa ao bolsonarismo em 2022, ainda não tem respaldo no partido, que, nesta quarta-feira, 21, lhe impôs uma derrota ao rejeitar um pedido de expulsão do deputado Aécio Neves (PSDB-MG).
Doria defendia a saída do ex-presidenciável tucano, acusado de corrupção, como uma forma de evitar que a presença de Aécio no partido gerasse futuros constrangimentos. O recado da Executiva da sigla, porém, foi de que o governador não conseguirá impor sua vontade sem um aval da cúpula tucana, na qual Aécio mantém influência.
A tentativa de Doria de se distanciar do presidente leva em conta um cálculo político de que é preciso antecipar a discussão eleitoral para fortalecer um "caminho de centro". Após associar sua imagem a Bolsonaro e cunhar o voto "Bolsodoria" em 2018, o tucano começou a se afastar gradualmente nos últimos meses e a criticar iniciativas do governo.
Nesta quarta, em entrevista no Palácio dos Bandeirantes, Doria atacou a indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, como embaixador brasileiro em Washington. "Jamais nomearia meu filho nem ninguém da minha família para nenhuma função pública", disse. Ele também reagiu à divulgação pelo BNDES da lista de contratos de jatos executivos financiados pelo banco, em que aparece como beneficiário. "O uso político do BNDES é tão condenável hoje quanto foi no passado, no governo do PT", afirmou.
Deputados ouvidos pelo Estado, no entanto, avaliam como erro já partir para o confronto direto com Bolsonaro, uma vez que o capital político do presidente da República é alto e tê-lo como inimigo poderia atingir as candidaturas tucanas nas eleições municipais do ano que vem.
Em alguns casos, como em Mato Grosso do Sul, onde o governador Reinaldo Azambuja (PSDB) é aliado ao Planalto, políticos locais ainda apostam no apoio da rede bolsonarista para ter sucesso nas urnas.
O movimento para estancar a antecipação da disputa eleitoral no PSDB nasceu com os chamados "cabeças brancas", lideranças parlamentares mais experientes, como os senadores Tasso Jereissati (CE) e José Serra (SP).
Oficialmente, Doria tem declarado que o PSDB deve se manter independente, sem se posicionar como oposição ao presidente. Contudo, a filiação do deputado Alexandre Frota (SP), ex-PSL, ao partido por suas mãos foi vista por parte da bancada do PSDB na Câmara como um ato de confronto a Bolsonaro. O parlamentar rompeu com o presidente e é uma das vozes mais críticas ao atual governo no campo da centro-direita.
Aécio
A votação desta quarta que salvou Aécio de ser expulso do PSDB sinalizou que Doria não tem maioria no partido. A Executiva da sigla rejeitou o pedido por 30 votos a 4. A decisão de livrar Aécio do processo de expulsão foi feita a portas fechadas. A discussão durou mais de quatro horas e, por mais de uma vez, os dirigentes tiveram que interromper para acalmar os ânimos.
Doria defendia a expulsão do deputado para levar adiante o que chamou de "faxina ética" no PSDB, que no ano passado teve o seu pior desempenho eleitoral da história. Em nota, o tucano criticou a decisão da direção do partido, que, segundo ele, "escolheu o lado errado".
"Respeito a votação, mas ela não reflete o sentimento da opinião pública brasileira. Cada membro da Executiva deve responder por sua posição. A minha é clara: Aécio Neves deve se afastar do PSDB e fazer sua defesa fora do partido", afirmou o governador de São Paulo.
Aécio presidiu o partido de maio de 2013 a setembro de 2017 e mantém forte influência na sigla. Sua saída do comando da legenda foi antecipada após as primeiras denúncias da Lava Jato contra ele. O mineiro é alvo de ao menos oito inquéritos, abertos após delações da Odebrecht, da J&F e do ex-senador petista Delcídio Amaral. Ele também é réu sob acusação de corrupção e obstrução da Justiça. O tucano nega a prática de crimes.
O deputado Celso Sabino (PSDB-PA), relator do pedido de expulsão, alegou que Aécio não foi condenado e, por isso, não havia motivo para expulsão. Na avaliação de parlamentares, caso levasse o afastamento adiante, o partido daria força ao discurso de criminalização da política.
Após o resultado, Aécio afirmou que a decisão da Executiva foi democrática e negou significar uma derrota de Doria. "Acho que isso permitirá que o PSDB cumpra seu papel de um partido de centro, com a grave preocupação social e que pode voltar a ser protagonista no processo político brasileiro", disse. / COLABOROU PEDRO VENCESLAU