Os cientistas alertam que estamos próximos de ultrapassar pontos de não retorno, também conhecidos como tipping points, que representam limites críticos nos quais pequenas mudanças podem desencadear transformações abruptas e irreversíveis nos ecossistemas e no clima global.
Essas transições ocorrem tanto em sistemas biológicos quanto físicos, como a Floresta Amazônica, a circulação oceânica e as camadas de gelo da Groenlândia e Antártica. Uma vez ultrapassados esses pontos, ocorrem efeitos em cascata, resultando em perda significativa da biodiversidade em diferentes escalas, elevação do nível do mar, secas prolongadas e alterações severas nos padrões de chuvas e temperatura.
Por outro lado, os pontos de inflexão positiva representam intervenções estratégicas capazes de catalisar mudanças benéficas e acelerar a transição para um futuro sustentável. Nesse contexto, a Educação Climática surge como um desses pontos de inflexão, oferecendo uma ferramenta social para conter o avanço da crise climática.
Os impactos dos pontos de não retorno vão além do meio ambiente. Eles afetam diretamente a vida humana e a estrutura social. Um dos setores atingidos é a Educação. Em 2024, quase 250 milhões de crianças e adolescentes tiveram seus estudos interrompidos devido a desastres naturais, como furacões, enchentes e ondas de calor.
O fechamento de escolas compromete o aprendizado, amplia desigualdades e limita a capacidade das novas gerações de compreender e responder à crise climática. Esse cenário reforça a necessidade de integrar a Educação Climática nas estratégias de mitigação e adaptação, garantindo que futuras gerações tenham o conhecimento necessário para desenvolver soluções sustentáveis.
O Tipping Points Report, um estudo global sobre os pontos de não retorno da Terra, destaca a educação como um fator de inflexão positiva capaz de impulsionar mudanças em direção à sustentabilidade. Ao formar cidadãos mais conscientes e preparados para enfrentar os desafios climáticos, a Educação estabelece bases para transformações duradouras que impactam diversos setores da sociedade.
Educação: o pilar ignorado na luta contra a crise climática
Mesmo sendo um fator importante para a mitigação e adaptação climática, a Educação Climática ainda é amplamente negligenciada nas políticas climáticas globais. Enquanto governos e organizações investem em políticas emergenciais e tecnologias de mitigação, ambas fundamentais, a formação de cidadãos preparados para atuar na transformação social e ambiental segue subestimada.
No entanto, especialistas apontam que a Educação não apenas amplia a compreensão sobre os desafios climáticos, mas também desempenha um papel estratégico como catalisador de mudanças estruturais, fortalecendo comunidades resilientes e engajadas na construção de soluções sustentáveis.
Um levantamento sobre as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) revela que apenas 3% dos países possuem um plano estruturado para integrar a Educação Climática nos currículos de ensino formais e não formais. Enquanto isso, 46% das NDCs sequer mencionam o tema, e 28% fazem referência à Educação Climática sem definir estratégias concretas de implementação.
Essa ausência de diretrizes claras demonstra que, apesar do reconhecimento de seu potencial transformador, a Educação continua à margem das políticas climáticas. Sem um compromisso efetivo dos governos para incorporá-la às estratégias nacionais, perde-se uma ferramenta essencial para preparar as futuras gerações e impulsionar as transformações necessárias para evitar os pontos de não retorno.
No Brasil, iniciativas que conectam escolas à natureza têm demonstrado impactos positivos na conscientização ambiental dos alunos e na adoção de práticas sustentáveis pelas comunidades locais. O movimento "Escolas pelo Clima" se destaca como a maior rede de instituições comprometidas com a Educação e a ação climática no país, reunindo mais de 1.100 escolas signatárias, sendo 72% da rede pública, impactando mais de 1 milhão de estudantes e 70 mil educadores.
Além disso, o manual Benefícios da Natureza no Desenvolvimento de Crianças e Adolescentes reforça a importância de experiências ao ar livre e do contato com a natureza para o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes. Essas iniciativas demonstram que a Educação Climática deve ir além do conteúdo curricular, tornando-se uma ferramenta ativa de mobilização social e acelerando a transição para sociedades mais sustentáveis.
Educação Climática no Brasil e estratégias para evitar pontos de não retorno
No Brasil, a Educação Climática ainda enfrenta desafios estruturais. Segundo a pesquisa Ativismo e Educação Climática, 69,1% dos ativistas climáticos brasileiros não tiveram aulas sobre mudanças climáticas na Educação formal. Muitos adquiriram conhecimento por conta própria ou por meio de organizações da sociedade civil. Além disso, o levantamento revelou que 51,7% dos ativistas entrevistados estudaram em escolas públicas, reforçando a importância dessas instituições na formação de uma consciência climática crítica.
Para evitar a ultrapassagem dos pontos de não retorno, é fundamental implementar estratégias educacionais que garantam que o tema climático seja abordado de forma sistemática e acessível. Isso exige a incorporação da Educação Climática de forma transversal nos currículos escolares. Além disso, é essencial capacitar professores, oferecendo formação continuada e materiais didáticos que facilitem o ensino sobre mudanças climáticas e seus impactos.
Outro ponto essencial é a integração da Educação Climática às políticas públicas. O Brasil, por meio de suas NDCs, comprometeu-se a reduzir 53% das emissões de gases de efeito estufa até 2030 e alcançar a neutralidade de carbono até 2050. Para que essas metas sejam cumpridas, a Educação Climática deve ser tratada como uma estratégia prioritária, assegurando que a sociedade compreenda a urgência da crise e participe ativamente da construção e na prática de soluções.
Além disso, a Educação Climática pode ser um mecanismo poderoso para fortalecer a resiliência social e ambiental, prevenindo impactos severos da crise climática. Ao integrar estudantes em projetos práticos e conectá-los a iniciativas locais de sustentabilidade, cria-se um ciclo de aprendizado contínuo que beneficia tanto a comunidade quanto o meio ambiente.
Projetos escolares que envolvem reflorestamento, gestão hídrica e energia renovável podem transformar a Educação em um verdadeiro vetor de mitigação climática, além de contribuir para uma efetivação da Educação Ambiental no país, que foi limitada a práticas de reciclagem e uso racional da água.
Educação Climática na COP 30: uma oportunidade para ação global
A COP 30 no Brasil representa uma oportunidade estratégica para consolidar a Educação Climática como um pilar central das políticas globais de mitigação e adaptação. Para enfrentar os desafios do futuro, é essencial que governos, instituições educacionais e a sociedade civil se mobilizem para integrar o tema climático nos sistemas de ensino de forma transversal, garantindo que cada cidadão tenha conhecimento e ferramentas para agir.
A Educação Climática não pode ser tratada apenas como um complemento pedagógico, como tem sido feito com a Educação Ambiental. Ela é uma estratégia fundamental para conter o avanço da crise climática, evitar a ultrapassagem dos pontos de não retorno e garantir um futuro habitável para todos.
Atualmente Tâmara Lima trabalha para a Universidade Federal Rural da Amazônia, tem ações de pesquisa e extensão em colaboração com instituições públicas e privadas, não presta consultoria.
Thalison Correa não presta consultoria, trabalha, possui ações ou recebe financiamento de qualquer empresa ou organização que poderia se beneficiar com a publicação deste artigo e não revelou nenhum vínculo relevante além de seu cargo acadêmico.