Aluna diz que foi vítima de transfobia e racismo na UFBA; professora reconhece erro mas critica linchamento

Estudantes realizaram um abaixo-assinado denunciando a conduta da servidora pública e organizaram um ato na universidade

13 set 2023 - 05h00
(atualizado em 26/10/2023 às 18h47)
O caso aconteceu na Faculdade de Comunicação (Facom)
O caso aconteceu na Faculdade de Comunicação (Facom)
Foto: Divulgação/Mara Mércia

A estudante de Produção Cultural Lizz Reis, de 26 anos, denunciou, na tarde desta terça-feira, 12, uma professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA) por transfobia e racismo. O caso foi registrado na 7ª Delegacia Territoral do Rio Vermelho, em Salvador, e está sendo investigado.

Ao Terra, Lizz detalhou as agressões que teria sofrido. Segundo ela, a professora a chamou pelo pronome masculino depois de discordar das inserções que a estudante fez na sala de aula.

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"Ela perguntou qual era o meu nome. E eu respondi, 'meu nome é Luisa Lizz'. Ela disse, 'eu acho que você está chateado'. Respondeu assim, porque eu estava trazendo viéses políticos e ela achou que isso era uma revolta", considerou a aluna.

Lizz explicou que a disciplina ministrada pela professora é Produção e Circulação de Conteúdos em Mídias Digitais. Na ocasião, a turma discutia um texto sobre curadoria, mas Lizz, que é cantora lírica, disse que teve suas ponderações enquanto artista e estudante desvalidadas pela professora.

O caso gerou comoção entre os estudantes da Faculdade de Comunicação (Facom), que se mobilizaram e criaram um abaixo-assinado denunciando a professora Jan Alyne Barbosa Prado.

O texto, que foi escrito de maneira coletiva, se solidariza com a situação de Lizz e reforça a história contada por ela. Os alunos planejam para a quarta-feira, 13, um ato na Facom rumo a outro instituto da universidade.

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Lizz é cantora lírica e se sentiu desvalidada enquanto aluna por não ter tido suas falas consideradas
Foto: Reprodução/Instagram/@lizzoficiau

"Depois de alegar que a aluna estava atrapalhando sua aula, ela [a professora] se retirou da sala e voltou com um servidor técnico, que veio com deboche corroborando com o racismo/transfobia generalizada, destituiu a imagem da mesma [de Lizz] a chamando de "figura” e que estava em "surto psicótico" pela reação a violência expressada de forma visível", diz trecho do manifesto, que recebeu 516 assinaturas até a noite desta terça-feira.

Lizz diz que, antes de ir à polícia, procurou pelo colegiado da faculdade, mas foi recebida com as portas fechadas. "Quando eu cheguei completamente abalada emocionalmente, eles trancaram a porta", afirmou. A aluna realizou ainda uma denúncia na ouvidoria da UFBA, de forma online.

Em entrevista ao G1, Jan Alyne reconheceu que errou ao usar o pronome masculino ao invés do feminino na discussão e que interpretou mal a identidade de gênero da estudante. "Eu não a conhecia, nunca a tinha visto e não fiz a chamada no início da aula. Ela não foi identificada como mulher trans para mim. Eu confundi a minha interpretação, de fato. Eu poderia ter identificado ela tanto como um homem gay, tanto como uma mulher trans. Eu errei", afirmou Jan Alyne ao G1.

Na sequência, a docente falou sobre sua autonomia dentro da sala de aula e criticou o linchamento ao qual foi submetida. "Eu tenho um programa, eu tenho autonomia. Ela não pode ser a professora, e ela queria ser a professora ali. É chocante. Ela me desqualifica por não fazer slide, desqualifica o meu estilo de lecionar. Nunca aconteceu comigo, nunca fui linchada nesse nível, mas eu não posso me destituir da minha autonomia, porque eu tenho autonomia docente, ralei muito para fazer meu doutorado, fazer mestrado, passar em concurso", disse ao G1.

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Ao Terra, a professora Jan Alyne disse que não iria se manifestar, mas enviou um áudio de mais de 1 hora de duração, com toda a discussão ocorrida em sala. “Minha versão é o que aconteceu na aula”, disse a docente.

A discussão começa pouco depois dos 40 minutos de gravação, quando Jan e a aluna, que estavam em um debate dentro da aula, se desentendem. Em dado momento, a professora pergunta qual é o nome de Liz, e repete a pergunta algumas vezes, sem compreender o que foi dito.

Jan diz que Liz está fugindo do tema. "Vamos voltar, a gente vai para um hipertexto e não volta mais. Você já está mudando de assunto", disse a professora. "Eu acho que a senhora não está querendo falar o real, do real. Você está querendo fazer superficial", respondeu a estudante. Em dado momento, Jan diz que Liz está "chateado" e é corrigida em seguida.

A aula continua e Liz permanece fazendo inserções, até que Jan se mostra irritada: "A professora aqui, sou eu." Nesse momento, a situação sai de controle e Liz ameaça processá-la por ter errado seu pronome "até fazer a minha existência como aluna aqui dentro dessa sala não existir".

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Em nota, a UFBA afirmou ser "reconhecidamente inclusiva, diversa e predominante negra, jovem e feminina". "Sendo assim, qualquer forma de assédio é considerada não apenas uma agressão aos que foram vitimados, mas ao próprio espírito da universidade, devendo ser rigorosamente apurados e, uma vez devidamente comprovadas as acusações, punidos conforme as leis do país e os regulamentos da Universidade Federal da Bahia", diz trecho do texto.

A instituição disse ainda que a estudante foi acolhida pela pró-reitora de Ações Afirmativas e Assistência Estudantil Cássia Maciel e orientada a prestar queixa na ouvidoria da universidade.

Leia abaixo a nota da UFBA na íntegra:

"A Universidade Federal da Bahia é reconhecidamente inclusiva, diversa e predominantemente negra, jovem e feminina. Este novo perfil de comunidade - em que três a cada quatro estudantes de graduação da UFBA são negros e de baixa renda - é o resultado de uma década e meia de ações afirmativas protagonizadas pela instituição, que a norteiam. A criação de cotas para pessoas trans, em vagas supranumerárias, é uma das ações de inclusão criadas por esta universidade.

Sendo assim, qualquer forma de assédio é considerada não apenas uma agressão aos que foram vitimados, mas ao próprio espírito da universidade, devendo ser rigorosamente apurados e, uma vez devidamente comprovadas as acusações, punidos conforme as leis do país e os regulamentos da Universidade Federal da Bahia.

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Quaisquer denúncias devem ser encaminhadas através dos canais institucionais, ou seja, à direção da unidade ou diretamente à ouvidoria da UFBA aos quais cabe dar prosseguimento ao processo investigativo, que será conduzido pela Unidade Seccional de Correição, unidade vinculada à reitoria de UFBA.

A sua missão está intrinsecamente ligada às atividades relacionadas à prevenção e apuração de irregularidades, no âmbito da universidade, através do acompanhamento de procedimentos correcionais. As denúncias são apuradas e os processos transcorrem de modo a assegurar o amplo direito de defesa dos acusados, assim como preservando-se as partes envolvidas, até o final do devido processo legal.

Em relação ao caso levantado pela reportagem, a UFBA informa que a estudante foi acolhida pela pró-reitora de Ações Afirmativas e Assistência Estudantil Cássia Maciel, que a ouviu, atendeu e orientou-a quanto aos procedimentos necessários. A estudante registrou queixa junto à Ouvidoria da UFBA. Seguindo os procedimentos legalmente estabelecidos para apuração, o caso será encaminhado para processo investigativo, transcorrendo conforme descrito no parágrafo anterior."

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Fonte: Redação Terra
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