"Brasil tem boas práticas na educação", diz consultor inglês

12 out 2015 - 17h41

Em tempos de crise econômica e austeridade, é ainda mais importante para o Brasil criar um ambiente em que a educação avance e que boas práticas existentes possam ser compartilhadas, diz o especialista britânico David Albury, que participa de projetos educacionais em diferentes partes do país.

Para consultor, Brasil pode se beneficiar da colaboração entre as redes de ensino, disseminando boas práticas
Para consultor, Brasil pode se beneficiar da colaboração entre as redes de ensino, disseminando boas práticas
Foto: Pedro Ribas / Associação Nacional dos Procuradores da República

Albury é professor visitante de Estudos de Inovação no King's College, em Londres, diretor da Global Education Leaders' Partnership (comunidade de líderes e consultores em educação) e presta consultoria a redes de ensino em 13 países.

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Na cidade gaúcha de Viamão (RS), ele participa de um plano na rede municipal a partir da metodologia chamada de problem-based learning (ensino baseado em problemas), em que questões relevantes aos alunos e suas comunidades são o ponto de partida para o aprendizado prático e para a busca de soluções pelos próprios estudantes.

Albury esteve em São Paulo recentemente para participar do seminário "Liderança e Inovação na Educação", da Fundação Santillana. Ele conversou com a BBC Brasil por telefone:

BBC Brasil - Como é o projeto do qual o senhor participa em Viamão (RS)?

David Albury - Pela (metodologia de) "ensino baseado em problemas", os estudantes participam de projetos e os usam para adquirir conhecimento. Os projetos levantam questões (relativas à comunidade), e os estudantes apresentam ao restante da escola o resultado das pesquisas.

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Os estudantes ficam realmente motivados e ganham mais aptidão a aprender, pesquisar, desenvolver habilidades.

Consultor está participando de ação em cidade gaúcha de Viamão, onde diz que as crianças têm se envolvido mais com projetos da comunidade
Foto: Prefeitura de Viamão

BBC Brasil - Como melhorar o desempenho dos estudantes brasileiros, atualmente muito mal posicionados em rankings internacionais de educação?

Albury - De fato é um grande problema: como dar a todos os estudantes do país as habilidades e os conhecimentos que eles precisam para serem bem-sucedidos e prosperarem no século 21.

A primeira coisa é dar condições e apoio para que as escolas e professores desenvolvam boas práticas de ensino, usando exemplos do Brasil e de outras partes do mundo.

É preciso fazer com que as escolas trabalhem juntas de modo que sintam que estão colaborando com um ensino do século 21. Se você cria esse ambiente nas instâncias municipais, estaduais e federal, acho que o (cenário do) país é promissor.

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Há centenas de exemplos de inovação de grandes escolas, mas é preciso criar as condições para que essas práticas sejam compartilhadas.

BBC Brasil - Que boas práticas viu no país?

Albury - Fiquei impressionado em especial com uma escola de Viamão em que os estudantes, em grupos, estão realizando projetos nas comunidades ao redor (por exemplo, com reciclagem e arte nas aulas). Dá para ver pelo seu envolvimento que eles estão aprendendo a pesquisar e a resolver problemas.

Há outros projetos em andamento pelo país, como o Escola Digital (plataforma gratuita com videoaulas, jogos e outros recursos de apoio à educação), que ajuda muitas escolas no Brasil a desenvolver recursos digitais e usar tecnologia.

BBC Brasil - Como disseminar mais essas práticas? Uma boa escola pode ajudar uma que não vá tão bem?

Albury - Muito do meu trabalho é ajudar grupos (de determinadas escolas) a se juntarem e compartilharem (seu trabalho), reunindo os professores e elaborando workshops que resultem na criação, em conjunto, de práticas de trabalho com os estudantes.

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Espero conseguir também trazer processos e redes de contato do redor do mundo para ajudá-los nesse processo colaborativo e a pesquisar com os próprios estudantes o que eles acham relevante em sua educação.

David Albury presta consultoria em diferentes cidades e Estados do país
Foto: Divulgação

BBC Brasil - O país ainda tem uma enorme desigualdade na educação. Como combater isso?

Albury - Mesmo nas escolas (que trabalham) em circunstâncias muito difíceis, mesmo nas escolas cujas crianças vêm de famílias muito pobres, é possível criar um ambiente fantástico de aprendizado, que envolva o estudante e o permita desenvolver habilidades básicas.

Claro que é algo de longo prazo, mas o que temos de fazer é juntar a energia e paixão dessas escolas e desses professores.

O governo tem o papel de criar condições para que escolas, professores e entidades parceiras possam colaborar e compartilhar o conhecimento, atravessando fronteiras estaduais.

Não é só uma questão de achar projetos (bem-sucedidos), mas conectá-los para que se tornem ações mais poderosas de aprendizagem.

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BBC Brasil - Podemos melhorar a educação no atual ambiente de austeridade e cortes de gastos na educação?

Albury - Claro que algumas mudanças são muito mais difíceis de serem feitas quando há grandes cortes. Mas sei, a partir de exemplos ao redor do mundo e até de alguns lugares no Brasil, que se você (valorizar) o trabalho e o comprometimento de professores que querem ter um impacto no ensino dos alunos, é possível fazê-lo mesmo em tempos de austeridade.

Muitos estudos mostram que quando países estão diante de dificuldades econômicas, a principal prioridade deve ser fomentar a capacidade dos jovens para que eles se tornem agentes da economia.

Então, em tempos de dificuldades econômicas, é ainda mais importante criar um ambiente em que a educação possa melhorar.

Consultor defende ensino mais baseado em projetos ligados à vida real dos alunos
Foto: Thinkstock

BBC Brasil - O ensino médio é considerado a etapa mais problemática atualmente e convive com altas taxas de evasão e defasagem.

Albury - Temos de ser honestos: a principal razão pela qual tantos estudantes desistem da escola é que eles simplesmente não acham a educação oferecida relevante para suas vidas.

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Muitas vezes não é que o estudante esteja desconectado da escola, mas sim que a escola está desconectada dele.

Isso é abordado no "aprendizado baseado em problemas": criar projetos que despertem o interesse dos jovens, que lhes façam sentir que o aprendizado é realmente relevante para ele e sua comunidade.

Nosso trabalho como educadores e líderes é desenvolver modos que permitam aos estudantes aprender dessas experiências (práticas), focadas em questões que tenham sentido. É assim que você reduz taxas de evasão e aumenta a adesão.

BBC Brasil - O Reino Unido realizou uma reforma educacional alguns anos atrás. Podemos tirar alguma lição dela?

Albury - A primeira lição é: se você liberar o potencial de professores e estudantes para desenvolver boas práticas, ficará surpreso com o poder das inovações que eles produzem.

A segunda é que a reforma focou muito em dar autonomia a cada escola. O que aprendemos desde então é a importância da colaboração, de facilitar que as escolas trabalhem juntas - dar liberdade para as escolas para que elas consigam desenvolver boas práticas mas também apoio com ferramentas, estrutura e condições de compartilhar suas experiências.

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