Há quase 16 anos a costureira e empresária Edna Schulze, de 43 anos, decidiu apostar em um sonho antigo e construir uma carreira profissional como modista. Com dois filhos para criar, ela tinha apenas uma máquina de costura, mas, com o apoio do pai, com quem aprendeu a costurar, criou uma escola que hoje tem mais de 10 mil alunos, fatura mais de R$ 1 milhão por ano, sendo uma das maiores do Brasil.
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Ao Terra, ela conta que o desejo surgiu depois de se separar do seu ex-marido, com quem ficou junto por oito anos até descobrir uma traição e depois se ver sozinha tendo que criar dois filhos, um menino de 6 anos e uma menina que ainda estava na barriga.
“Nesse período, eu estava grávida de oito meses da minha menina e com o meu filho de 6 anos. E tudo o que tinha, naquela época, era R$ 75 e uma máquina de costura. Foi um impacto tão forte, tão grande na minha vida, o olhar de tristeza do meu filho, que decidi que seria um orgulho para eles e ali me reergui”, relembra Edna.
Edna conta que se inscreveu em um curso técnico na área de modelista. “Na época, eu pagava R$ 300 por mês. Eu, como estava sustentando meus filhos, me reerguendo de uma separação, só paguei a primeira parcela. Mas ali, com aquele curso, consegui entrar em uma vaga e ali comecei a minha trajetória”, diz.
Dessa forma, ela manteve o sustento da casa por quase 10 anos, equilibrando a carreira e os cuidados com os filhos, muitas vezes, em turnos dobrados. Com a costura, Edna conseguiu pagar as participações dos torneios de xadrez do filho mais velho. “Ele foi viajar o mundo, representando o Brasil. Tudo isso com a minha máquina de costura”, relembra.
Consolidada na carreira e casada novamente, Edna decidiu que queria dar um segundo passo e começou a dar aulas para mulheres no Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar). A paixão por ensinar foi tanta que a empresária resolveu pedir demissão do emprego que tinha na época e criar sua própria escola, onde ela e o pai pudessem trabalhar juntos. Porém, veio a pandemia da covid-19 uma semana depois.
“E agora? Eu só tinha realmente o salário do mês. Eu era casada, mas meu marido também era assalariado e ganhava menos do que eu. E aí, eu olhei na internet e vi que as pessoas estavam ensinando de forma online. Pensei: ‘Meu Deus, como é que elas fazem isso?’. Resolvi fazer a minha primeira live”, conta Edna.
Ao lado do pai, a costureira fez uma live no perfil do Instagram dela e, para surpresa de Edna, teve público. E assim nasceu a escola de costura Alfaiate & Filha. O nome, segundo ela, foi inspirado na fé dela em Deus.
“Um dia, sentada, pedindo direção a Deus, veio. É como se fosse o regresso [ao lar]. Trabalhei com ele [o pai] dos 15 aos 25 anos. E agora, com 40, eu estava voltando. De novo, eu e ele juntos”, relembra, emocionada.
Sucesso da escola
Edna conta que, a partir das lives, conseguiu abrir a escola. Primeiro, com 2 mil alunos; agora, são mais de 12 mil alunos, em 24 países diferentes, sendo a maioria mulher. As aulas são gravadas pelos dois, em Blumenau, Santa Catarina, e compartilhadas em uma plataforma online voltada para cursos.
“O que a gente descobriu, e que, na verdade, eu já sabia, é que o conhecimento que nós tínhamos podia realmente mudar a qualidade [de vida] das costureiras, modelistas do País. O que eu realmente não sabia é que esse conhecimento transformava a vida financeira de milhares de famílias”, fala.
“Você vê transformação. Era aluna que estava com depressão e começou a costurar. Era aluna que estava com as máquinas todas cobertas, não sabia que conseguia fazer renda com a costura e, de repente, ela viu que podia”, enumera.
“Por conta da minha história, de ter sustentado dois filhos sozinha, e principalmente, [porque] falo sempre: ‘Se deu certo pra mim, que sou uma mulher negra, em uma cidade alemã, que, na primeira vez que fui trabalhar como modelista, fui confundida com a faxineira, vai dar certo para vocês também”, diz.
O primeiro reality show de costura do Brasil
Em 2024, a carreira de Edna deu mais um passo. Inspirada pela história de vida das próprias alunas, ela decidiu criar uma reality show voltado para costura. De acordo com ela, o primeiro no Brasil a mostrar a profissão como ela é.
“Eu quis trazer a vida secreta dessas mulheres que não são valorizadas, que fazem a moda no Brasil e não são valorizadas. Queria que elas se sentissem amadas porque recebo milhares de mensagens de mulheres dizendo que não têm conhecimento suficiente para aprender a fazer um molde, por exemplo, porque tem matemática. Eu quis trazer essa valorização e idealizei o reality”, conta a empresária.
Durante quatro dias, cinco participantes foram levadas para um hotel para aprender. Nos últimos dois dias, eram desafiadas a entregar uma roupa feita por elas e apresentá-las em um desfile. A vencedora ficou com um prêmio de R$ 5 mil. Para o próximo ano, já há planos para uma nova temporada.
“Recebemos centenas de depoimentos, e muita gente assistiu. Foi muito forte. Foi de chorar mesmo. Mulheres que tinham até vergonha de chegar num banco e dizer que eram costureiras e agora se sentem valorizadas e não tem vergonha de falar a profissão. Foi muito legal”, detalha.