O que destrói a liderança é o ego, diz renomada headhunter que entrevistou mais de mil CEOs

Fatima Zorzato compartilha as habilidades de lideranças bem-sucedidas e aponta como a educação executiva pode desenvolver profissionais em carreiras avançadas

12 nov 2024 - 06h30
(atualizado às 10h30)

Com larga experiência no mercado de sucessão de CEOs, a headhunter Fatima Zorzato já entrevistou cerca de 1,5 mil CEOs, presidentes e heads de business unities. Ao longo da carreira, a veterana desenvolveu um estilo próprio na hora de identificar as características em comum entre lideranças bem-sucedidas. Hoje, à frente da INWI Consulting, empresa especializada em executive search e executive assessment, com foco em sucessão de CEOs, membros de conselhos e posições de C-Level, Zorzato destaca três aspectos inegociáveis para líderes de sucesso: estratégia, comportamento e alinhamento emocional.

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Na contramão dessas habilidades, Zorzato aponta o ego como um grande obstáculo na liderança. "Quando o líder entra na empresa, o ego entra antes dele. Então, ele não consegue se relacionar e ouvir", alerta. Para combater o problema, a educação executiva entra como uma ferramenta de apoio, mas não resolve o problema.

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Em entrevista ao Estadão, ela relembra episódios da carreira de headhunter, comenta o atual cenário da educação executiva no Brasil e as oportunidades de CEOs diante das mudanças no mundo do trabalho.

Confira trechos da entrevista:

Quais são as principais habilidades que observa entre grandes líderes?

Temos o líder funcional e o líder de empresa. Com o líder funcional, a profundidade técnica e analítica é o que vai diferenciá-lo durante a carreira. Mas quando ele vai crescendo, a profundidade técnica não é suficiente porque torna-se necessário as características de liderança, que são as softs skills, como a capacidade de mobilizar pessoas.

No caso dos líderes empresariais, que podem ser empresas pequenas, médias ou grandes, diria que existem três características. A primeira é a capacidade de visão e de estratégia. O segundo é o comportamento, o líder fala e faz a mesma coisa, são transparentes. Eles não ficam em cima do muro e sabem como se comportar em público, sem público, em momentos fáceis e nas situações de pressão.

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Por fim, o bloco emocional que combina todas as softs skills, principalmente a capacidade das pessoas simpatizarem com você. Não é ser bonzinho, é ter as variações necessárias para lidar com diferentes situações.

Somado a essas três características, a liderança precisa ter o repertório de business para saber falar de estratégia e tem que entender a execução para mobilizar pessoas. Olhar o líder é observar o comportamento, a estratégia e o alinhamento emocional. Por exemplo, existe um líder que é muito bom para a acionista, mas quando você olha para baixo a empresa está pegando fogo. O bom líder tem que ser 360º.

Existem outras habilidades predominantes em líderes bem-sucedidos?

O nível de resiliência. Por exemplo, não gosto de quem faz uma carreira de três anos em cada lugar. Porque em dois, três anos, você está na lua de mel. Faço a analogia com a árvore, você não faz raiz e não finca.

Então, o líder não tem como falar que entregou transformação porque demora mais de seis anos. No máximo, deu um tapa. A resiliência é para alegria, tristeza, para passar por relações difíceis, por turbulências no negócio e na economia.

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Gosto muito de líderes resilientes. Eles leem livros, fazem programas educacionais, olham vídeos, e ao ver ou conversar com alguém relaxam e conseguem ter insights.

Muitos líderes leem livros variados, esses têm um nível de curiosidade maior que as demais pessoas. Esses líderes chegam e perguntam: "me conta de você". Não é só para saber do outro, é para ouvir e aprender com os episódios que aconteceram com a outra pessoa.

Isso se repete no aprendizado da educação executiva?

A educação executiva é muito propícia, mas não pode ser o dar e receber. Tem líder que vai fazer educação executiva e fica nervoso porque são situações tensas. Por exemplo, podem ser atividades com pessoas da mesma empresa, então, o líder vai se sentir avaliado. Se for inglês e precisar apresentar um caso, vai aumentar a barra. Só esse fator já reduz a possibilidade de aprendizagem.

Quando você vai em um ambiente de educação executiva fora do Brasil, em que conhece outras pessoas, fica mais aberto porque não tem preconceito, não tem baias. Você ouve as pessoas, olha exemplo de outras empresas, mas não se sente vigiado.

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Nos programas executivos fora do Brasil mais do que o conteúdo é a troca de experiência em ver pessoas de 30 nacionalidades.

Na hora de escolher um curso de educação executiva, o que a liderança deve levar em consideração?

A educação executiva tem alguns formatos. Temos os Programas Customizados in Company, em que trabalham o que é o problema comum e o que eles querem apresentar de método. Por exemplo, método de gestão ou de liderança.

Quando você vai para os Programas Abertos temos vários níveis, como programas mais voltados para liderança. Por exemplo, muita gente com formação técnica procura programas voltados para administração ou para finanças, que pode ser um MBA ou certificados.

Ainda temos os programas que são de soft skills, é a educação continuada voltada para soft skills e liderança. Diria que 100% das pessoas são líderes no começo de carreira ou pessoas mais velhas que desejam dar uma revisão. No meu caso, fiz um programa de CEO que deu o insight para escrever um livro. Demorei muito para fazer o curso porque achava que não precisava, depois me questionei por que não entrei antes.

Hoje em dia, o que acaba diferenciando as pessoas é: qual é o tamanho da sua curiosidade?

Por que?

Um dos itens que avaliamos em assessment (diagnóstico elaborado para apontar tendências de comportamento e desempenho do profissional) é a curiosidade. Alguns líderes são super curiosos naquilo que é especialista, conhece tudo, mas somente de um assunto. Temos outro perfil de liderança que conhece pouco de muita coisa. O balanço entre um e outro é legal.

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Não dá para aprender habilidades em cursos, mas é possível ter insights. Tem alguns livros que falam de coisas específicas. Poder é uma coisa que cega ou às vezes ajuda.

É possível aprender a controlar o ego?

Não dá para ensinar, mas se a liderança lê coisas que falam que o ego é um problema e começa a aumentar os feedbacks, ela pode se preocupar e notar que a escuta ativa é importante. Escuta ativa significa não falar e não ter que ser a última voz. Isso dá para ensinar.

Então, de alguma forma, a educação executiva pode ajudar o líder a combater o ego?

Por meio do ensino da liderança, a educação executiva pode mostrar exemplos de comportamento inadequado. Ainda que de um jeito superficial, pode ajudar na autopercepção. A percepção mesmo vai ser com terapia ou com assessment, em que realiza testes e que tenha um feedback do seu estilo e dos seus pontos fortes.

Muitos líderes usam isso com propriedade e fazem as pessoas ficarem encantadas. E o que encanta as pessoas? Pessoas comuns, que você olha fala: "é humano como eu, acorda, escova os dentes, vai ao banheiro, mas se preparou e tem visão para ser o nosso líder." É uma pessoa normal. Este é o grande segredo.

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Pessoas com baixo nível de energia não conseguem mobilizar ninguém. A liderança tem um kit pessoal com tom de voz, vibração e energia. Estes são atributos que ajudam a empoderar-se mais.

Pensando nas mudanças mais recentes do mundo do trabalho, o que o mercado está exigindo de lideranças?

O primeiro é o básico: comportamento de inclusão. Hoje ainda existem empresas que têm líderes que são baias, eles gostam de pessoas igual a eles. É mais fácil trabalhar com igual, é mais difícil trabalhar com uma pessoa diferente, mas é na diferença que a gente aprende.

Já vi empresas desligarem por comportamentos de liderança discriminatórios ou verbais. Estou falando de vida real.

A outra coisa é que ainda não sabemos lidar com a nova geração. Sabemos que o modelo de comando e controle que existia antes não vale mais. A liderança tem que ser inclusiva e interativa.

O mais difícil é entender como é o modelo para lidar com a nova geração, que fala: "não quero mais trabalhar, eu vou parar e viajar por um ano." Estamos vivendo tudo isso. Parte tem a ver com o modelo, outra parte tem a ver com educação familiar. Por exemplo, não obedecem à hierarquia. Na empresa você não vai resolver isso.

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Temos uma população jovem, super talentosa, trabalhadora, que vai para as startups. Do outro lado, temos jovens que ainda não se acharam. Diria que a diferença da velha geração é que tínhamos carreiras mais bem definidas e que eram mais longas. A pessoa começava e terminava na empresa. Nos últimos tempos, vemos que as pessoas têm saído de uma carreira e entrado em outra.

No seu livro "O que faz a Diferença", cita que as pessoas mais realizadas são as que tomam iniciativas. Qual conselho deixa para os profissionais saírem da zona de conforto?

Saltar no escuro é ter a coragem de fazer algumas mudanças para sair do status quo e experimentar. Quando falo saltar no escuro é colocar energia, fazer dar certo e ter resiliência. Ir até o fim e estudar.

É muito importante escolher algumas pessoas para serem o seu copo de vitamina. Ou seja, com quem conversa quando tem dúvida ou quando quer dividir uma ideia? É necessário se ouvir e ser obrigado a falar em voz alta. Se você tem vergonha e não quer dividir com ninguém, escreva e depois guarde. Um mês depois, leia de novo ou escolhe alguém que confia.

Segundo: é muito importante ter mentores. Pode ser informal. Escolha alguém para conversar uma vez por ano. Tem gente que pode pagar, tem gente que não pode. Mas é interessante ter um coach ou mentor. Se puder fazer terapia, faça também.

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Essas coisas ajudam a aumentar a autoavaliação. As chances de te envolver e querer trabalhar com você é maior se você for uma pessoa mais leve e feliz. Quando falo em saltar no escuro é não ter medo do medo, porque ele é amigo da gente.

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