É comum acreditar que o salário de um médico seria o mais alto em um concurso público, no entanto, outras profissões da mesma área podem ser melhor remuneradas em salários iniciais, como é o caso da vaga para auditor fiscal do trabalho (AFT) no Concurso Público Nacional Unificado (CPNU). Apesar de a Medicina exigir mais estudo, a profissão tem carga horária menor do que outras, o que poderia justificar o salário mais baixo.
Neste ano, o CPNU, ou apenas CNU, anunciou remuneração de R$ 5.513,72 para médicos atuarem na Advocacia-Geral da União (AGU), valor pouco maior do que o anunciado para os psicólogos, que é de R$ 5.488,70, com a mesma lotação. A remuneração inicial mais alta anunciada pelo concurso foi no valor de R$ 22.921,71 para atuar como Auditor Fiscal do Trabalho (AFT) no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). As profissões fazem parte do Bloco 4: Trabalho e Saúde do Servidor no concurso.
De acordo com o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, os salários do CPNU são calculados conforme o disposto na legislação específica do cargo em seu referido órgão. Os valores são obtidos a partir da Tabela de Remuneração dos Servidores Públicos Federais Civis e dos Ex-Territórios.
Retificações
Os salários iniciais do CPNU foram anunciados no edital do concurso, e no dia 18 de janeiro, foi feita uma retificação, e os salários de algumas vagas aumentaram. A alteração foi publicada no Diário Oficial da União de 18 de janeiro. Confira os cargos com aumento no salário inicial:
• Especialista em estatística - R$ 10.233 para R$ 10.453 (duas vagas)
• Especialista em geografia - R$ 10.233 para R$ 10.453
• Especialista em demografia - R$ 10.233 para R$ 10.453
• Especialista em indigenismo - R$ 7.697 para R$ 8.263 (15 vagas)
• Engenheiro agrônomo - R$ 6.804 para R$ 7.296
• Médico - R$ 4.407 para R$ 5.513
• Psicólogo - R$ 5.488 para R$ 5.513
• Técnico assuntos educacionais - R$ 5.488 para R$ 6.761
• Técnico em indigenismo - R$ 5.331 para R$ 6.987
• Técnico em geografia - R$ 4.008 para R$ 3.741 (quatro vagas)
• Especialista em Letras - R$ 9.252 para R$ 8.453
O Ministério da Gestão e Inovação também flexibilizou a exigência curricular para as vagas de Auditor-Fiscal do Trabalho (AFT), que tem salário inicial de R$ 22 mil. Antes era necessária uma especialidade em auditoria e fiscalização, agora podem se inscrever candidatos de especialistas em “qualquer área de conhecimento”.
Além do aumento de alguns salários, foram incluídas novas regras de segurança para a realização das provas. Segundo o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, o objetivo das retificações é evitar interpretações divergentes do edital e garantir a lisura na seleção dos candidatos que ingressarão no serviço público.
Em publicação no site oficial, o Sindicato dos Médicos do Pará afirma que houve desvalorização da profissão médica no CPNU, e que chamou a atenção o fato de que a profissão, que exige seis anos de graduação, tenha um dos menores salários entre os cargos disponíveis.
“Quando foi lançado, o edital previa salário de R$ 4.407 aos médicos. Após a alteração, o valor foi corrigido para R$ 5.513. Ainda assim, bem abaixo do valor ofertado a outros cargos. [...] O que poderia explicar que profissionais graduados em outras áreas ganhem até quatro vezes mais do que os médicos especialistas?” diz o sindicato na publicação.
“O salário ofertado aos médicos neste edital é um escárnio. Demonstra o desprezo deste governo para com a categoria médica. O Sindmepa protesta e repudia! Vamos continuar lutando por salários dignos e a carreira médica”, afirmou o diretor do Sindmepa, Waldir Cardoso.
O que dizem os especialistas?
O advogado Carlos Figueiredo Mourão, vice-presidente da Comissão da Advocacia Pública da OAB São Paulo, explica que o concurso em andamento tem como previsão uma carga horária para os médicos de 20 horas semanais, diferente dos demais. “Além deste fato, os médicos costumam receber adicional de insalubridade, periculosidade e horário noturno, podendo, ainda, acumular mais um cargo de médico no serviço público”.
“Todos os cargos públicos são criados por lei, bem como a remuneração correspondente. A União tem a obrigação de corrigir qualquer eventual erro nos editais, sendo que deve tornar público da mesma forma que o edital original e, se for o caso, prorrogar os prazos”, completa.
O professor Heitor Ferreira, que dá aulas na Alfa Concursos, diz que o estranhamento na disparidade de salários oferecidos pelo CPNU vem de uma crença de que a medicina é uma das áreas mais bem remuneradas na nossa sociedade.
“Gera-se um estranhamento porque, no Brasil, a gente tem um estereótipo de que a profissão de médico é a que mais ganha dentro da nossa sociedade. Como, de fato, a gente sabe que ela ganha muito mais do que o teto de diversas outras profissões. Mas dentro do CPNU, a gente tem essa variação, por especificidade e também por exigência de formação. Ainda no mesmo bloco, a gente pode citar o cargo pra Auditor Fiscal do Trabalho, que é, de longe, o melhor salário do concurso”, diz.
Segundo Ferreira, olhando para os blocos temáticos de vagas, é possível encontrar vagas de nível intermediário com salários acima do teto previsto, como é o caso do cargo de Técnico em Indigenismo, com salário de R$ 6.987,19.
“A variação está muito no que tange à carga horária. Então, há essa grande variação salarial. Mas, sem dúvida, dentro do CPNU, a questão do trabalho traz pra gente muitas perspectivas e possibilidades, inclusive para quem tem só o ensino médio completo, para ganhar um salário de quase de 7 mil reais, por exemplo”.
Tatiane Florentino é coordenadora de enfermagem da Sanar, editora especializada em livros para concursos na área da saúde. Ela diz que as vagas do CPNU consideram o nível de graduação, diminuindo a disparidade e a super ou subvalorizacao de categorias profissionais.
“Quando o CPNU estabelece o salário por níveis de formação - graduação, mestrado, doutorado - a mensagem que deixa implícita é que entende-se que todas as profissões tem valor e preço pelo seu trabalho equivalentes. Isso impacta para categoria como médicos, porque, historicamente, nos concursos públicos, principalmente municipais, são ofertadas salários maiores que as demais categorias considerando a necessidade de retenção de médicos no interior do Brasil”, diz.
Ela pontua, entretanto, que de maneira geral, há remunerações em todas as vagas que não são justas e atendem estritamente a subsistência básica.
Explorar outros blocos pode ser uma alternativa
O professor Heitor Ferreira aconselha que os candidatos procurem vagas além daquela que diz respeito à sua área de atuação ou de interesse, inclusive, em outros blocos do CPNU.
“Os blocos 4, 7 e 8 vão ter uma procura muito elevada, é um grande fato. O bloco 7 porque tem 1.748 vagas, e é a parte de gestão governamental e administração pública, aceitando, na maioria das vagas, só o nível superior completo. O bloco 8 porque é o nível intermediário e o bloco 4 porque tem o AFT, que muita gente estudava para este certame”, diz.
“A minha dica é, dê uma olhadinha para além dos salários, nos blocos que vão ficar quase vazios. Muitos blocos vão ter uma concorrência bem pequena, e talvez a escolha de um bloco, olhando para a premissa salarial, mas também olhando para a concorrência que você enfrentará, pode colocar você dentro de uma vaga, o que seria mais difícil, talvez, em um bloco que tem uma concorrência tão elevada”, aconselha.
O professor também chama atenção para a regionalização das provas, e afirma ser mais vantajoso escolher uma vaga no próprio Estado ou cidade do candidato, com remuneração mais baixa, do que vagas que paguem mais, mas que estejam a 2 mil quilômetros de distância, por exemplo. "Essa escolha, pode ser bastante importante nesse cenário", aponta.
Sobre a escolha dos blocos do CPNU, Tatiane Florentino pensa que, para fazer a escolha, o candidato deve avaliar a própria formação e as exigências das vagas. “Um ponto, é entender quais atividades prevista para as vagas. Pois, ali está definido como será seu processo de trabalho e dá para perceber o nível de exigência e o impacto que os resultados apresentados gerará”.
Assim como o professor Heitor, Tatiane recomenda atenção ao local de atuação. “Existem vagas que o local de atuação é apenas em Brasília ou no Rio de Janeiro. Isso porque, para candidatos que precisem mudar de endereço, a análise financeira/salarial ofertada na vaga será um passo importante!”.