"Talento não é suficiente": chef Erick Jacquin celebra 30 anos de carreira no Brasil

Chef francês radicado em solo brasileiro revive datas marcantes, como início na gastronomia, vinda ao Brasil e dez anos de MasterChef

19 jul 2024 - 05h00
(atualizado às 10h24)
Chef Erick Jacquin celebra aniversários de datas marcantes na carreira
Chef Erick Jacquin celebra aniversários de datas marcantes na carreira
Foto: Gabriel Gatto/Terra

Sessenta anos de idade, 45 de carreira, 30 desde a chegada ao Brasil, além de 10 anos à frente das câmeras de um dos mais longevos programas da televisão brasileira. Números exatos para definir alguém tão humano quanto o chef Erick Jacquin, francês radicado brasileiro que, em 2024, celebra datas importantes tanto em sua carreira quanto em sua vida pessoal. 

Além do esforço exigido por uma carreira que, como ele próprio citou em entrevista exclusiva ao Terra, o obriga a trabalhar "enquanto os outros se divertem", Jacquin reconhece o valor daqueles que, ao longo de sua trajetória, o estenderam a mão. Um dos ícones que marcaram a carreira do chef é o restauranteur Vincenzo Ondei.

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Em 1995, o empresário, especializado em restaurantes, trouxe o aspirante francês para assumir as cassarolas do Le Coq Hardy, estabelecimento que se tornou um dos ícones da alta gastronomia francesa em São Paulo. O local também foi berço de uma sobremesa amplamente difundida no Brasil, apresentada pelas mãos de Jacquin, o petit gâteau.

"Um dos homens que mudou a minha vida", cita o chef, que deixou a pequena Saint-Amand-Montrond para aprender com os maiores nomes da gastronomia em Paris.  

Entre experiências bem-sucedidas e outras que serviram de aprendizado, como a falência do restaurante La Brasserie, Jacquin deixou de ser apenas o "homem da cozinha" para se tornar, também, o "cara da TV" em 2014, com a estreia do MasterChef, da Rede Bandeirantes. Desde então, já são 17 temporadas, entre as versões Brasil, Júnior e Profissionais. 

"Tirando a saúde, todo o resto, se você não abaixar o braço, sempre tem algo de bom ao lado. Tudo que é negativo tem uma coisa positiva para compensar, eu tenho certeza disso. Só que precisa saber pegar na hora certa. Não pode deixar passar, deve olhar a tudo e pegar. Eu fiz isso", analisa o chef.

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Confira a entrevista completa a seguir!

Convidado a comandar restaurante francês em São Paulo em 1995, Jacquin permaneceu no Brasil
Foto: Reprodução/Instagram/@erickjacquin

Como começou a relação com a gastronomia? 

Eu sempre quis ser cozinheiro, nunca pensei fazer outra coisa. Mas o contexto era muito diferente de hoje. Na época, não tinha chef famoso na televisão, não tinha revista com chef. A gente não comia em restaurante porque era só para um momento muito especial e, na maioria das vezes, meus pais não levavam a gente, iam com amigos, pessoas adultas.

Então, eu não sabia o que era um restaurante, não sabia o que era um chef, não sabia nada, mas eu sabia era o cheiro da comida. Eu quis ser cozinheiro por isso, pelo cheiro da comida. O meu pai me falou: 'Você vai trabalhar no dia em que os outros vão se divertir, não esquece isso'. Eu pensei bem e falei: 'Quero ser cozinheiro mesmo'.

Comecei com 14 anos, trabalhava no fim de semana, à noite. Estudava no colegial e meu pai me botou numa escola de cozinha por dois anos. Minha mãe cuidava muito mais dos estudos do que meu pai. Saí de lá com 18 anos, 17 e meio, e comecei a trabalhar ao lado dos melhores. Porque o mais importante é trabalhar do lado das pessoas que sabem trabalhar.

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E então eu tive uma escolha muito grande na época, quando conheci uma pessoa que me convidou para trabalhar com ele. Esse homem perguntou: 'Você gosta de roupa bonita? Gosta de carro esportivo? Gosta de passar o fim de semana na praia com amigo? Ir em festa e tomar champanhe?' Eu disse que gosto. E então ele falou: 'Você vem comigo que você não vai ter isso, nenhum pouco, nada. Porque você vai ganhar pouco. Muito pouco. Mas eu vou te ensinar a trabalhar. E pode ser que um dia você vá ser um chef'.

E ele ainda falou: 'Posso te achar um trabalho em que você vai ganhar quatro vezes mais no primeiro dia, você vai chegar a ganhar seis vezes mais. Mas daqui a 50 anos você vai estar fazendo a mesma coisa. Vai ser o mesmo personagem, vai ter uma mulher que te enche o saco e morar em um apartamento em Paris, sua vida vai ser isso'. Perguntei se podia pensar e ele disse: 'Pode, você tem três minutos e já passou um'. Então eu fui com ele para Paris, para um restaurante com uma estrela Michelin.

Como era trabalhar com cozinha no período?

Havia um respeito muito grande, a hierarquia muito forte, quase militar. Trabalhava sem falar, não tinha barulho na cozinha. Todo mundo tem sua posição e ficava ali. Não olhava relógio. Às vezes saía do restaurante e já estava na hora de voltar. A gente ia no bistrô ao lado, tomava um café e voltava. A gente cozinhava porque gostava, gostava da profissão, da cultura de vida.

Hoje, acho que a maioria das pessoas não querem ser cozinheiros, querem ser chef. A gente nunca pensava em ser chef. Hoje, quando se faz uma entrevista com uma pessoa, a primeira pergunta dela é o dia da folga, se trabalha em almoço ou jantar, se precisa vir todo dia, quando são as férias. Eu nunca falei disso com meu patrão, não tinha coragem de perguntar a folga, o salário a gente sabia que tava ruim, então não precisava perguntar.

Mas a motivação das pessoas é muito diferente. Ser chef hoje é mais para tirar foto para revista, aparecer na televisão, que para cozinhar. Tem muito mais chefs de TV que de cozinha, e isso é dramático. E hoje pego pessoas que vêm trabalhar comigo e fazem tudo errado. Eu não sou professor. Quando a gente entrava para trabalhar, era para produzir. Ganhava um salário para isso e hoje, não, viramos professores.

Existe um curso de editor-chefe de jornal? Não. Existe um curso de jornalismo e depois você vira o patrão. Na cozinha é a mesma coisa. Não existe curso de presidente da República, de ministro. Você estuda economia, finanças, administração. Você aprende quem é o seu país e, depois, pode ser que um dia você vá ser ministro ou presidente.

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E em dado momento da carreira, você recebeu uma proposta para vir ao Brasil. Como foi esse momento?

É um dos homens que mudou a minha vida [Vincenzo Ondei]. Ele veio me buscar em Paris, se apresentou, disse que tinha um restaurante em São Paulo, no Borba Gato, em Santo Amaro. Eu nem sabia onde era São Paulo, imagina Borba Gato. E ele me falou: 'Preciso de uma pessoa igual a você, sinto que você vai se adaptar no Brasil. Estou sentindo que você é uma pessoa que precisa trabalhar comigo'.

Eu disse que não conhecia ele, e ele respondeu: 'Não tem importância, eu vou mudar a sua vida, você vai ser rico'. Ele mudou a minha vida e tudo, mas eu não sou rico, ele me deve isso (risos). Agora, ele está lá do céu, mas a presença espiritual fica, tenho certeza disso. 

E então ele me deu uma passagem, eu vim para o Brasil, conversei, visitei muitos lugares e ele me convenceu, me ofereceu um bom salário: quatro vezes o que eu ganhava na França, até mais. Tive um apartamento, casa na praia, carro, décimo-terceiro, tudo isso que não existe na França. 

Voltei pra França, falei com minha ex-mulher e a gente botou tudo isso na balança, o negativo e o positivo. Então eu vim e não me arrependo, eu imaginava passar três anos, ganhar dinheiro e voltar, comprar um restaurante na França. No fim, fiquei e passaram-se 30 anos. 

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Em 2003, você optou pela naturalização. Por que?

Meu filho mais velho veio a nascer em 1997 e pude me naturalizar. Não é obrigação, mas peguei essa nacionalidade e virei brasileiro. Não me arrependo nem um pouco. Eu voto, posso falar a minha opinião. E quem quer participar, morar em um país, precisa se integrar em todos os aspectos. Faz parte do que você quer ser.

A política, por exemplo, vem depois. Eu não faço política porque sou comerciante. Cada vez que abro a boca, as pessoas não entendem p**** nenhuma. Pensam que eu sou bolsonarista, outros pensam que sou petista, ou pensam que sou alguém que fica aqui no Brasil e deveria votar no meu país, então é muito complicado.

Na realidade, quando você nasce em um lugar, é muito difícil mudar, se naturalizar. Quando tá tudo certo, você é maravilhoso. Se tem um problema no país, você é o filho da p*** que vem ao Brasil. E na França é a mesma coisa, os franceses falam do mesmo jeito.

E como encarou a barreira do idioma?

Nunca foi um problema porque eu não sou tímido, não sou vergonhoso. Eu falo do jeito que penso ser melhor. Na rua, falam: 'Pô, o Jacquin não aprendeu português ainda'. Eu digo que não, porque se eu começar a falar bem, preciso baixar meu preço na televisão, porque é o que as pessoas gostam.

Agora, no dia em que eu me naturalizei teve a prova de português, aí foi difícil. A mulher olhou na minha cara e falou: 'Vai com Deus', eu já entendi que tava ferrado o negócio. Me lembro dela até hoje, a Dona Lúcia.

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E consideraria passar por essa mudança, novamente, em outro país?

Quando olho para trás, eu vejo esse mundo inteiro. Eu não conheço, nunca fui na Ásia, por exemplo. Mas eu acho que nasci para ser do Brasil. Para mim, tem os outros países do mundo e o Brasil. Eu virei brasileiro para falar isso, Deus é brasileiros (risos). Porque o Brasil é um país que não tem igual, pode procurar no mundo.

É um país de contradições gigantes, tem gente bilionária e gente que não tem nada, precisa falar a verdade. Tem que gente que pode entrar no hospital agora e quem pega três meses de fila. Isso é que é injusto, isso é a democracia errada.

Jacquin durante preparação de prato no restaurante La Brasserie, em SP, em outubro de 2009
Foto: J. F. DIORIO/ESTADÃO CONTEÚDO

A verdadeira democracia é todo mundo igual. Mas o Brasil é um país que tem uma evolução muito grande, muito maior do que a gente imagina. Em trinta anos que cheguei aqui, de todos os caras que iam embora comigo de ônibus, hoje a maioria vai de carro, de moto.

Mas não que ônibus seja ruim, mas restaurante fecha uma hora da manhã, onde você vai pegar o ônibus? Em que horário? Isso é que é péssimo, deveria ter mais ônibus. Às vezes eu pego para ir para casa, as pessoas olham e perguntam: 'Será que é ele? Mas ele não pega ônibus'. Mas eu gosto.

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E como o Brasil te acolheu?

Muito bem. Nunca vou me esquecer, todo mundo fez de tudo para eu me sentir bem, acolhido. Uma vez precisei comprar shampoo, fui a uma loja onde não tinha. Mas o cara me botou no carro dele, pagou para mim e me deixou no hotel. Um francês nunca vai fazer isso, não dá para explicar.

E ao longo da carreira, também houve momentos de crise, negócios fechados. Como você lidou com isso?

Eu aprendi muito com essas fases da minha vida, que foram difíceis, mas nada é impossível. Se foi minha culpa, eu é que devo resolver. Se a comida queima, não é culpa da panela, é culpa do cozinheiro. Você é quem controla o fogo e controla a sua vida. Eu errei, paguei e foi caro.

Como você errou?

Eu não obedeci a administração, administrei muito mal. Confiei em pessoas que estavam erradas, que também administraram muito mal e não pensavam no futuro, só no dia a dia. Perto de fechar, eu tentei 'sair da água', estava afundando. Se você afunda, afundou, é melhor fechar. Acrescentei a dívida e quando vi tava uma bola gigante, uma bola que você não consegue carregar.

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Eu vou falar com sinceridade. Se a TV não aparece, naquela época, não sei se estou aqui conversando. Eu devo tudo ao 'MasterChef', devo tudo à TV e devo tudo ao Brasil. O Brasil me deu tudo e eu só posso agradecer por isso.

Mas não pense que veio sozinho, eu trabalhei por isso. Muito. Eu não parei ainda, trabalho por isso. Não vou quebrar duas vezes, quebrei uma e foi suficiente.

Leva algum arrependimento?

Não me arrependo de nada, é fase da vida, é bom. Vou dar uma dica: tirando a saúde, todo o resto, se você não abaixar o braço, sempre tem algo de bom ao lado. Tudo que é negativo tem uma coisa positiva para compensar, eu tenho certeza disso. Só que precisa saber pegar na hora certa. Não pode deixar passar, deve olhar a tudo e pegar. Eu fiz isso.

Você falou sobre o MasterChef, que estreou em 2014. Como foi esse começo?

No primeiro dia da gravação – eu nunca vou esquecer, foi no Pacaembu – estávamos nós três [Jacquin, Henrique Fogaça e Paola Carosella] no parque com a Ana Paula Padrão. A gente não se conhecia muito, eu conhecia a Ana Paula como jornalista famosa e hoje ela é uma das melhores amigas que tenho no Brasil. E 30 segundos antes de gravar, ela me falou: 'Jacquin, vou te dar uma dica. Não procure as câmeras, elas vão te procurar e te amar. Se as câmeras te amam, você vai ser o melhor'. Eu obedeci.

Na época, eu precisava muito. Quando encontrei o 'MasterChef', não quis nem saber quanto ia ganhar, eu quis fazer para meu telefone voltar a tocar, só por isso. Meu telefone não tinha parado, mas quem me ligava eram os oficiais de Justiça, os advogados, os bancos. Amigos você tem quatro, três, dois, um, você nem sabe.

E o que aconteceu com o MasterChef? Acho que é o único programa de gastronomia do Brasil na TV aberta, e na fechada até, que deu vontade à população de se alimentar e de cozinhar em casa. Antigamente, as pessoas não procuravam fazer coisas diferentes. Eram as receitas de família, arroz, feijão, feijão, arroz, uma carne, um peixe. Hoje, as pessoas começaram a comprar material de cozinha, uma batedeira, um fuê, um chinoy.

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E dez anos depois, como vê essa trajetória?

Eu não acredito ainda. Precisa ter o pé no chão, não pode subir à cabeça, precisa respeitar. Às vezes, a primeira palavra que eu ouço no dia não é um 'bom dia', é só um 'tira foto comigo'. Mas é um carinho muito grande. Minha esposa fala: 'Se não quer tirar foto, fica em casa. Você não pode falar não, você deve tudo a esse negócio. E o dia que você parar, vai ficar muito mais preocupado que no dia que começou'. E ela está certa.

Considera que houve uma mudança de direcionamento na carreira?

Na verdade, eu sou o homem da TV e o homem da cozinha. Às vezes, eu não sei se o cara da TV vai para a cozinha ou se o cara da cozinha vai para a TV. E ao mesmo tempo eu sou empresário e aprendi a obedecer. Meu lado como empresário é obedecer ao meu sócio, que é o verdadeiro empresário, é quem administra. Hoje, eu compro e vendo só se ele autorizar, e não tenho vergonha de fazer isso.

O ego é muito forte. Quantas vezes vi moleque falar 'agora eu sou sócio'. Você é sócio na empresa, mas participa, tem obrigação, não pode fugir, ir embora. É pior que um casamento, em que você dá 'tchau' e vai. Na empresa você não pode falar isso. A responsabilidade é grande. Hoje, a gente tem um monte de gente, de colaborador, e tem que pagar todo mundo. Não é brincadeira, por isso que eu obedeço.

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Chef Erick Jacquin celebra aniversários de datas marcantes na carreira
Foto: Gabriel Gatto/Terra

E como é sua relação com a cozinha hoje?

Hoje, eu cozinho mais em casa do que no restaurante. Faço a comida de minha mãe, de família, que bota a panela na mesa. Essa é a verdadeira cozinha, que tem cheiro, em que você vai se servir duas vezes. Não é um negócio pequenininho, que você bota na boca porque vai fazer um barulho. Você nem lembra do barulho depois.

Vai em um restaurante em que se faz comida que não é comida, mas uma interpretação de um produto, e pergunta na saída o que as pessoas comeram?! Elas não sabem! Elas vão falar que é um prato com fumaça. Mas o que tem nesse prato com fumaça? Elas não se lembram. A comida é uma coisa que você deve se lembrar.

E o que é preciso para ser um cozinheiro profissional, assumir um restaurante?

Para ser cozinheiro precisa gostar e amar. Tem que ter paladar. Experimentar. Procurar fazer o melhor. Não existe um dia bom ou ruim, todo dia deve ser igual. Eu sempre falo que se o restaurante é péssimo, mas está lotado todo dia, não pode mudar. Fica péssimo, funciona. Se o restaurante está vazio, aí precisa mudar alguma coisa.

É saber que a exigência maior é o trabalho. Esse homem que mudou minha vida, quando cheguei ao Brasil, me disse: 'Restaurante é uma fábrica de problema. Quem inventou a comida é Deus, quem inventou o chef é o diabo'.

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E essa é a verdade. Restaurante é uma fábrica, a gente fala de energia, luz, gás, vidro, porta, toalha, do chão, almofada, cheiro, barulho. A comida, para fazer um prato, entram 30 ingredientes diferentes, um sal ali, uma pimenta aqui. E parece nada, se fala em uma pitada de sal, mas quanto é uma pitada ao final do ano? Esse é o negócio. Eu não sei, mas meu sócio sabe.

Então, quem quer abrir e fazer vai trabalhar no dia em que os outros vão se divertir. Se você abre um restaurante pelo glamour, para comer igual a um cliente, não precisa, vai no restaurante dos outros, você vai economizar muito dinheiro.

E o talento não é suficiente, é uma parte da vida, mas é preciso ser corajoso. Tem muita gente que não tem talento, mas que são muito corajosos, e as pessoas que são talentosas, mas querem fazer p**** nenhuma, só pensam em fazer festa. E quem não tem o talento desses meninos, mas é corajoso, aplica muito, aprende muito, hoje são os melhores. O talento é preciso para ser criativo, mas, para cozinhar, precisa aprender.

Outro fato marcante da sua trajetória é a apresentação de um prato que se tornou um símbolo da sobremesa, o petit gâteau. Como foi esse trabalho?

Cheguei há trinta anos, fiz o petit gâteau e mudei o nome, porque não se chama assim na França. Se você pedir um petit gâteau lá, ninguém sabe o que é. E foi uma coisa maravilhosa, que todo mundo copiou.

Lá, se chama moelleux, que quer dizer 'molinho', que derrete.

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Eu poderia chamar de 'derretinho', mas petit gâteau é mais chique, e hoje é a palavra francesa mais falada no Brasil. Antigamente era je t’aime, mon amour, ménage à trois, e hoje é petit gâteau. Não é bonito isso? (risos). 

Olhando para a carreira até aqui, quais os planos para o futuro? 

A expectativa que eu tenho é cuidar um pouco mais da minha vida pessoal. Eu gostaria de descansar um pouco mais com meus filhos, tenho um de 27 anos e gêmeos de 5, então quero aproveitar um pouco mais sem parar de trabalhar, mas de forma mais suave.

Mas eu faço o que eu gosto. Eu só gostaria de cozinhar mais no meu restaurante. No Brasil, antigamente eu cozinhava todo dia, hoje é às vezes. Acaba sendo bom para todo mundo. E hoje invisto no trabalho para construir a aposentadoria, deixar uma casa para meus filhos. Mas gostaria de dar um passo para trás e estar mais junto da família.

No fim do ano passado, eu perdi a minha mãe, foi muito difícil. Percebi que uma grande parte do que eu faço na cozinha veio de minha mãe. Antigamente, eu não sentia isso, então eu gostaria de escrever um livro de cozinha com as receitas dela, refazer a cozinha de minha mãe para as pessoas sentirem o que é uma cozinha de família.

Eu chegava na casa de meus pais, sentia o cheiro e sabia o que ia comer, isso com sete, oito anos. E nessa idade eu já fazia de tudo, até massa folheada. Eu não brincava, eu cozinhava, fazia bolo. Isso pelo incentivo de dentro da própria casa.

Além do livro de receitas, há outros projetos em mente?

Eu vou comemorar 30 anos no Brasil, 60 anos de idade, então eu tenho o projeto de fazer o livro. Vou lançar um charuto do Jacquin, que eu adoro charuto. Vou lançar uma espumante do Jacquin com a [Casa] Perini. Vai sair, também, uma linha de avental e roupas de cozinha, uma manteiga brasileira, de boa qualidade. Vamos lançar um prato comemorativo, já temos o menu todo pronto. 

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Vou lançar também uma linha de panelas de ferro fundido brasileiras, mas muito acessíveis. Vai sair um gin tipo London, com cacau, caju. Na França, tem uma bebida feita com álcool de anis, eu vou fazer um brasileiro. 

Mas meu sonho é fazer uma peça de teatro. Eu gostaria de ser ator uma vez na minha vida. É um sonho fazer a reverência, abaixar a cabeça. Uma peça sobre um restaurante, uma cozinha. Se algum diretor quiser fazer uma peça comigo, a hora é agora. 

Fonte: Redação Terra
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