'Vem passar um dia de blogueiro CLT comigo?': influencers mostram rotina de trabalho e perrengues nas redes sociais

A proposta virou nicho de criação de conteúdo e viralizou ao mostrar pessoas comuns no dia a dia da profissão

23 dez 2024 - 05h00
Thainá Freire faz conteúdo para a internet sobre sua rotina no trabalho
Thainá Freire faz conteúdo para a internet sobre sua rotina no trabalho
Foto: Reprodução/TikTok

Ao rolar o feed nas redes sociais, é quase impossível passar ileso dos perfis de influenciadores mostrando o novo carro de luxo ou se 'mimando' com bolsas de grife. Em meio aos vídeos de ostentação, um conteúdo salta aos olhos. De dentro de uma condução, alguém olha para a câmera e faz um convite: "Vem passar um dia de blogueiro CLT comigo?". A proposta virou nicho de criação de conteúdo e está fazendo sucesso na internet.  

Os chamados "blogueiros CLT" são pessoas comuns que decidiram criar conteúdo para as redes sociais mostrando os perrengues da rotina, principalmente no dia a dia de quem tem carteira assinada.

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Alguns se destacam no nicho, como o carioca Pedro Bonvivant, que acumula 600 mil seguidores e 11 milhões de curtidas apenas no TikTok. A paulistana Miwa é outro case de sucesso. Na mesma plataforma, a internacionalista mostra sua rotina de trabalho para mais de 720 mil pessoas. 

'Sinto que vou ser engolida de tanta coisa para fazer'

Com o boom desses criadores e o interesse cada vez maior dos usuários em consumir influenciadores 'pé no chão', a jovem Thainá Freire decidiu investir nessa empreitada. "Eu sempre via esses vídeos e me perguntava: como faz para dar conta de ter uma rotina de CLT e ainda criar conteúdo?", questiona. 

Ainda cedinho, Thainá sai de casa com sua marmita do almoço para trabalhar em um comércio na cidade de Presidente Prudente, em São Paulo, onde vive há seis meses.

Para ir e voltar, a paulistana enfrenta ônibus lotado e, quando chega em casa, ainda precisa se certificar que está tudo em ordem. A jovem só se deu conta do quanto suas 24h são exaustivas em conversa com o Terra.

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"Trabalho na jornada 6x1, de 9h até as 22h. Tenho que pegar condução, ônibus lotado, ser dona de casa, ser esposa, ter vida social, gravar conteúdo, entrar em contato com marca, tentar publicidade, negociar valor... Olha, quando paro para listar, como eu estou fazendo agora, sinto que vou ser engolida de tanta coisa para fazer", desabafa Thainá Freire. 

Aos 29 anos, a paulistana conta que trabalha desde os 14 anos, quando entrou em programas de jovem aprendiz. De lá para cá, seu currículo conta com atuações diversas: atendente em uma unidade do McDonald's, auxiliar administrativo de hospital e funcionária de comércio. 

Em um descanso ou outro, ela se distraía vendo tutoriais de maquiagem nas redes sociais, sem nunca pensar em produzir conteúdo. 

Foi só quando arranjou um emprego em uma clínica de dermatologia na Avenida Angélica, em São Paulo, que entrou no 'mundo das blogueiras'. Por lá, era um entra e sai de pessoas fazendo preenchimento, botox, harmonização facial e outros procedimentos queridinhos por personalidades da internet.

Durante um workshop para testar uma máquina nova na clínica, Thainá teve o rosto 'estudado' e levou um susto com o diagnóstico: o aspecto da sua pele parecia o de uma pessoa muito mais velha que ela. Foi então que decidiu se cuidar e passar as dicas de skincare nas redes sociais.

"Eu gravei um vídeo que não tinha edição nenhuma, postei nos Stories e mandei para minhas amigas. Elas gostaram muito, salvaram, compraram os produtos que eu indiquei... Aí pensei: 'Se eu postar no feed, talvez consiga ajudar outras pessoas também'. E foi o que eu fiz! Desde então, posto dicas na internet, além da minha rotina de trabalho", conta. 

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'Virei blogueira CLT porque não me sentia representada'

Ao entrar no perfil do TikTok de Thainá, o usuário pode ler, logo de cara: "Diário virtual de uma blogueira CLT". Foi assim que ela escolheu apresentar seu conteúdo na rede social. A jovem ainda dá dicas de maquiagem e cuidados com a pele, mas investe mesmo no nicho dos "trabalhadores da internet". 

A decisão de entrar no meio não foi apenas pelo boom dos blogueiros CLT ou pelo sucesso quase espontâneo de criadores do nicho. Na verdade, ela queria servir de inspiração. 

"Vi o conteúdo de algumas blogueiras CLT mas não me sentia representada por elas, até porque muitas eram de classe média. Eu queria me ver ali, ver algum vídeo de uma menina que veio do mesmo lugar que eu, que tem as mesmas lutas que eu. Não estou falando de dificuldade financeiras apenas, mas dos 'nãos' que só nós levamos", argumenta. 

Como blogueira CLT, Thainá não precisa sentar em frente à câmera para gravar um tutorial de maquiagem ou sua rotina de skincare. Basta filmar tudo o que acontece em seu dia de trabalho e tirar um tempinho para a edição e publicação, o que já é bastante em uma rotina apertada como a dela. 

"A ideia é mostrar que, independente de você ser CLT ou não, de você ter uma rotina intensa ou não, que você pode, sim, criar os seus conteúdos e sonhar em um dia ser reconhecida", diz.

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Ela conta que, no trabalho, as colegas acompanham seus conteúdos e até mesmo alguns clientes a abordam sobre o assunto. A interação com a chefia, no entanto, ela prefere manter apenas no âmbito profissional. "Por mais que o meu conteúdo seja falando que eu sou CLT, eu não quero vincular a empresa que eu estou porque eu posso mudar amanhã", reflete. 

Mesmo que faça alguns vídeos uniformizada, Thainá diz que prefere não mencionar ou destacar o nome da loja em que trabalha, justamente para não expor a empresa.

"Só apareço me arrumando para ir trabalhar ou passando maquiagem usando a blusa, mas, mesmo assim, estou pensando em não colocar nos próximos vídeos. E se um dia eu aparecer com uma camisa de outro lugar e alguém comentar: 'Mudou de emprego, o que aconteceu?'. Eu não quero ter que falar", explica. 

Mesmo preferindo separar o lado profissional da "blogueiragem CLT" - por mais irônico que pareça -, ela aposta no crescimento do nicho nas plataformas, em especial no TikTok.

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"Esses influenciadores famosos, alguns você vê 10 postagens da pessoa e 9 são publicidade. Os usuários querem ver além. Como essa pessoa leva a vida dela? Como que é a realidade dela? O que ela tem para ensinar?", questiona.

Para o futuro, a influenciadora tem planos de alcançar ainda mais usuários e busca a monetização no TikTok. No entanto, por enquanto, Thainá ainda não pensa em deixar a CLT para apostar na carreira na internet.

Qual o limite da criação de conteúdo no ambiente de trabalho?

Assim como Thainá Freire, outros criadores de conteúdo passaram a apostar na carreira de "blogueiro CLT". Mas como não deixar as redes sociais interferirem no trabalho, a partir do momento que a internet também se torna um ganha-pão?

Segundo a especilista em Recursos Humanos Daniele Malafronte, as empresas já estão atentas à superexposição nas redes sociais. "Há uma preocupação sobretudo com a segurança e a exposição de informações sobre onde são armazenados produtos de valor, possíveis pontos de entrada, posição de câmeras de segurança e também de dados confidenciais", enumera. 

Mesmo com o alerta 'ligado', não é proibido gravar conteúdos da rotina de trabalho, desde que acordado com a empresa.

"Desde que não seja uma proibição assinada em contrato, não há problema em expor a rotina diária nas redes", pondera Daniele. 

Afinal, até mesmo as empresas têm a ganhar com os conteúdos dos "blogueiros CLT". Isso porque, segundo a especilista em RH, os vídeos podem dar visibilidade às firmas e criar conexão com o público externo. O segredo, segundo Daniele, está na distribuição de tempo gasto nas duas 'causas': a internet e o trabalho CLT.

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"A internet é um mundo volátil, um pouco diferente de uma carreira no mercado corporativo, que tende a ser mais estável. Então, é preciso ponderar onde concentrar esforços. Para lidar com isso, o caminho é manter uma boa comunicação com a liderança e buscar sempre alinhamento entre as duas atividades, para que ambas se fortaleçam paralelamente e com seus pontos de interseção", aconselha. 

Fonte: Redação Terra
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