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ChatGPT para produzir aulas? Entenda proposta do Governo de SP e o que dizem especialistas 

Neste mês, veio a público um projeto da Seduc-SP que visa utilizar a ferramenta de inteligência artificial para elaboração de aulas

26 abr 2024 - 05h00
Foto: Reprodução/Getty Images/Nikolas Kokovlis

A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) quer utilizar o ChatGPT, ferramenta de inteligência artificial (IA), no processo de elaboração de aulas. O projeto, que veio a público na última semana, foi questionado pelo Ministério Público e criticado pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp).

A Seduc-SP garante que planeja implementar um "projeto-piloto" em que a IA passe a ser utilizada em uma das etapas do processo de atualização e aprimoramento de aulas já no terceiro bimestre deste ano. A iniciativa contemplaria os anos finais do Ensino Fundamental (do 6º ao 9º ano) e do Ensino Médio.

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Atualmente, a rede estadual conta com 90 professores curriculistas, que são os responsáveis pela elaboração dos materiais usados em sala de aula. A partir disso, segundo a secretaria, aulas que já foram produzidas por esses profissionais e que já estão em uso deverão ser "aprimoradas" pela IA.

Segundo a pasta, a tecnologia deverá inserir novas propostas de atividades, exemplos de aplicação prática do conhecimento e informações adicionais que enriqueçam as explicações de conceitos-chave de cada aula. Mas esse material será avaliado e editado em duas etapas pelos professores. Também está prevista uma fase de revisão de direitos aurtorais e design.

"Se essa aula estiver de acordo com os padrões pedagógicos, será disponibilizada como versão atualizada das aulas feitas em 2023", assegura a Seduc-SP.

Apesar de o próximo bimestre estar próximo, a pasta informou que não há previsão para a tecnologia começar a ser utilizada, e que o fluxo editorial descrito ainda será testado. Por meio de telefonema, foi informado à reportagem que a ideia não partiu de um estudo prévio, nem de recomendação preliminar. Também não foram dadas explicações sobre o que motivou o projeto, quais seus objetivos, nem quem foi o responsável pela ideia.

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No último dia 18, o Ministério Público questionou o secretário da Educação, Renato Feder, sobre como, especificamente, será o uso do ChatGPT para a elaboração do conteúdo. Também foi questionada a finalidade pedagógica que o governo busca satisfazer, e os estudos ou pesquisas usados como base para a proposta.

O MP também questionou evidências científicas ou experiências bem-sucedidas a respeito do uso de ferramenta para esse fim e, diante das mudanças na rotina de elaboração do material didático, se foi ou será contratada empresa para prestar serviços à Secretaria de Educação para o cumprimento dessa diretriz --  qual o nome da pessoa jurídica contratada.

O Terra procurou o Ministério Público, mas o órgão não informou se a Seduc-SP emitiu parecer sobre as questões. A reportagem também acionou o Ministério da Educação sobre o projeto. A pasta federal afirmou que as secretarias de Educação têm autonomia e independência, e não há nenhuma diretriz superior com relação ao uso da inteligência artificial na elaboração de materiais didáticos.

Professores foram consultados?

Em nome da categoria, o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) disse não ter sido consultado sobre a utilização de inteligência artificial no processo de elaboração de materiais. Em posicionamento enviado à reportagem, a entidade de classe afirmou: "Não houve qualquer diálogo com os professores".

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Segundo o sindicato, os professores curriculistas da rede apenas foram notificados sobre o então projeto-piloto.

"Consideramos essa decisão absurda e irresponsável, que representa uma nova e grave tentativa de precarização dos profissionais da Educação e um ataque aos direitos dos estudantes", afirmou a Apeoesp, que avalia risco de demissões dos professores.

"Os recursos gastos nesse tipo de inovação questionável bem poderiam ser revertidos em valorização salarial dos professores", sugere. 

Apesar de o sindicato afirmar que o projeto tem como objetivo substituir professores pelo ChatGPT, a Seduc-SP frisa que o projeto não se trata disso. 

Quais os limites?

Walter Goya ministrou o workshop "Existe Limite da Tecnologia na Educação? Uma Experiência com ChatBots" na Bett Brasil, na última terça-feira, 23
Foto: Terra/Beatriz Araujo

O pesquisador Walter Goya, que é consultor em tecnologias educacionais pelo Transformative Learning Technologies Lab, membro do Laboratório de Sustentabilidade da USP e colaborador do Instituto Catalisador, avalia que a inteligência artificial não irá substituir o professor - seja na sala de aula, ou no desenvolvimento de planos de aula. 

"Temos que tomar muito cuidado [com a inteligência artificial] porque nem os próprios desenvolvedores sabem como é que funciona. Já temos questões aprovadas de viés no ChatGPT, dependendo de como você o alimenta. Com dados enviesados, você pode estar propagando mais preconceito, discriminação… E aí, imagina isso acontecendo num currículo, em uma sequência didática que está sendo desenvolvida para as crianças?", provoca Walter Goya.

A ressalva, no entanto, não significa que a ferramenta não possa ser útil, se for usada com parcimônia. Ele cita, por exemplo, que o ChatGPT é bom para correções ortográficas, o que pode agilizar as tarefas de professores ou prestar algum tipo de suporte.

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Na criação de sequências didáticas com referências, no entanto, a inteligência artificial pode inventar as fontes, o que é chamado de "alucinação da inteligência artificial".

"As pessoas acham que tecnologia é neutra. Mas, na verdade, não. Porque quem usa a ferramenta, quem a desenvolve, pode acabar, até que de forma inconsciente, influenciando no resultado final dos produtos – seja uma sequência didática, uma aula, uma atividade ou assim por diante", explica.

Por mais que não "condene cegamente" o uso do ChatGPT, o especialista alerta que ter a ferramenta para gerar a base de algo na educação – como, por exemplo, quais tópicos do currículo serão abordados em alguma aula –, pode ser perigoso.

Bons usos da IA

Idelfranio Moreira conversou com a reportagem durante a Bett Brasil
Foto: Terra/Beatriz Araujo

"Todo professor que puder ser substituído por uma tecnologia, deve ser substituído por uma tecnologia". Foi a frase, de autoria do cientista da computação e teórico educacional indiano Sugata Mitra, que veio à mente de Idelfranio Moreira, gerente de ensino e inovação da SAS Educação, quando a reportagem o questionou sobre os limites da utilização da IA na educação.

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Para ele, a frase evidencia que em lugares onde o "professor não chega" e há possibilidade de aplicar algum recurso tecnológico para levar o ensino a pelo menos um aluno, essa substituição deve ser feita. Isso não significa, no entanto, que os professores perderão seus postos para a tecnologia, nem que são descartáveis.

O caminho ideal, para ele, é que os professores não deixem de se atualizar com relação às novas tecnologias, porque elas também podem auxiliar em funções que facilitem sua rotina. 

"Eu posso usar, lá na ponta, a inteligência artificial para, por exemplo, adaptar um conteúdo para um caso de educação inclusiva, tornar um conteúdo acessível. Ou eu posso utilizar o ChatGPT para ler o meu conteúdo, produzir um resumo dele para eu estudar, gerar perguntas para organizar um roteiro de estudo...", sugere.

O gestor compara a IA a um "copiloto" do professor, em que o educador deve sempre seguir no comando. O 'limite', para ele, está no propósito. 

"Importa para você se a resposta do ChatGPT é completamente correta ou não? Se não importa, então use o ChatGPT, porque você sabe que ele vai produzir coisa errada. Agora, importa para você que esteja correto? E você tem expertise para analisar a resposta do ChatGPT? Se você não tem, não use", acrescenta.

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Fonte: Redação Terra
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