As escolas de todo o Brasil ainda estão em estado de choque após o país ter vivido no período de 90 dias, três eventos brutais de violência escolar: um ataque em uma instituição de ensino em São Paulo, que vitimou uma professora; outro atentado a uma creche em Blumenau (SC), que causou a morte de quatro crianças; e mais recentemente, um ato na cidade de Cambé, interior do Paraná, vitimando fatalmente dois adolescentes.
Além de chamar a atenção pela brutalidade, os casos reforçam o alerta para o aumento de violência nas escolas, observado principalmente diante do retorno ao presencial, após o período mais crítico da pandemia.
Para se ter uma ideia, dados do Placon (Plataforma Conviva), sistema em que são registradas as ocorrências escolares, apontam que, em média, acontecem 108 ocorrências de agressão física a cada dia letivo nas quase 5 mil escolas de São Paulo.
Diante dessa complicada realidade, a procura por parte das escolas por palestras com temáticas de ansiedade, depressão, racismo, entre outros assuntos correlacionados, cresceu 15 vezes durante a primeira quinzena de abril.
E todo esse aumento se torna justificável sobretudo em preocupação com as crianças, que apresentam diferentes tipos de reações comportamentais após conviver ou apenas tomar conhecimento de eventos traumáticos como esses que vem acontecendo no país.
Não existe fórmula mágica para a situação
Como psicólogo, quero ressaltar de antemão que não há uma fórmula pronta para lidar com esse tipo de situação, pois cada criança é única e tem suas necessidades específicas. Sendo assim, é fundamental observar as necessidades apresentadas por cada estudante, como sua capacidade de expressar e nomear as suas emoções, e informar como se sente perante a esses acontecimentos.
Dessa forma, é preciso que se avalie como cada criança reage e apresente as suas necessidades específicas para adotar a melhor forma de lidar com a situação. No entanto, algumas atitudes básicas podem ajudar os responsáveis a auxiliar no momento de acolher e compreender os sentimentos dos jovens.
Um exemplo prático é que frequentemente uma criança acaba silenciando seus sentimentos e emoções perante uma situação traumática. Essa atitude de silêncio é considerada um mecanismo de defesa utilizado pela criança para evitar lidar com emoções intensas causadas por esses eventos.
No entanto, por mais que esse silêncio deva ser respeitado num primeiro momento, é crucial que os pais, pessoas e instituições próximas, como a própria escola, possam dar voz a esses sentimentos. Esse movimento de traduzir externamente em palavras acaba sendo importante para que esse trauma não fique internalizado na criança.
Compartihamento de emoções
Vale ressaltar ainda que o ato de compartilhar emoções e vivências, sobretudo em um grupo de pessoas que vive a mesma realidade deles, como, novamente, é o caso da escola nesse contexto, é crucial para gerar um sentimento de pertencimento a esse grupo. Essa sensação compartilhada é um importante fator protetivo para toda essa comunidade, que sabe que não está lidando sozinha com aquela emoção.
Além disso, é crucial considerar ainda o acolhimento da família, que também pode estar impactada pela situação. O núcleo familiar deve se sentir preparado para lidar com o assunto ou, caso perceba a necessidade, buscar apoio para poder apoiar a criança. Buscar ajuda especializada pode ser um farol diante da dor.
Um psicólogo pode auxiliar no processo de elaboração das emoções, ajudando a criança a expressar seus sentimentos de forma saudável e segura, simbolizando, muitas vezes, o suporte necessário para que o jovem consiga superar essa situação traumática e retome o caminho do bem-estar emocional.
Vale ressaltar ainda que, se tratando de episódios de violência vivida na escola, como são os casos que temos visto recentemente, não podemos esquecer ainda de assegurar esse acolhimento também para os profissionais da escola, que podem estar tão impactados quanto as crianças e também precisam desse tipo de ajuda ou suporte para retomar suas vidas.
Em casos traumáticos e tragédias é muito complicado tentar mensurar ou comparar o significado daquela dor em cada pessoa. No entanto, é inevitável pensar que essa comoção será intensificada na medida que ocorra a identificação da pessoa com aquela situação trágica.
Assim sendo, se o Brasil inteiro está tocado com os eventos recentes, é essencial que crianças, família e os profissionais da escola se unam e se apoiem nesse momento para que possam atravessar esse momento da melhor forma possível. O processo de cura pode ser demorado, mas estar ao lado de quem entende a dor pode ser acolhedor e impulsionador.
(*) Rossandro Klinjey é educador, psicólogo, palestrante e autor especializado em saúde mental e desenvolvimento humano. Ele é o fundador da edtech Educa.