Sentada em um ônibus na ilha de Malta, em abril de 2012, uma brasileira de 70 anos viajava sozinha. Encantada com a paisagem, acabou atrasada para a aula de inglês na ilha europeia. Ao explicar o motivo do deslize para a turma, com adultos dos mais diferentes países, sua professora se espantou com a coragem, mais comum entre jovens mochileiros, acostumados a andar desacompanhados.
Malta foi o primeiro destino escolhido por Ilse Nadir Mancuso, de Novo Hamburgo, Rio Grande do Sul, para fazer intercâmbio de 14 dias - logo no ano em que completou seu septuagenário. Depois foi a vez de visitar Vancouver, no Canadá. Agora, prepara as malas para aprimorar seu inglês em Boston, Estados Unidos. Não pretende parar.
“Viajo quando dá vontade. Não planejei ir de ano em ano. Mas tem que ser meio rápido. A idade está apertando. Daqui a pouco não consigo carregar as malas”, brinca a aposentada, hoje com 72 anos. Dois a mais de quando aceitou o conselho da filha, ignorou o medo e arrumou as malas para estudar inglês na Europa.
“Fazia um curso de inglês em Novo Hamburgo, para fazer alguma coisa mesmo. Mas achei a turma muito parada”, conta Ilse. Diante da queixa, a filha Rosana, que havia viajado a estudos com 18 anos, comentou com a mãe sobre sites que falavam de intercâmbio para pessoas com mais de 50 anos.
Não deve ter sido tão difícil de achar. De acordo com pesquisa de 2013 da Associação Brasileira de Organizadores de Viagens Educacionais e Culturais (Belta), 10% das agências de intercâmbio já têm cursos específicos para esse público. O número é maior do que em 2011, quando somente 2,8% ofereciam o serviço.
Com cursos de idiomas à disposição em todo o Brasil, a experiência cultural é o que costuma impulsionar o intercâmbio nessa faixa de idade - muito mais do que o certificado. “O jovem tem toda uma carreira profissional pela frente, quer construir currículo para o mercado de trabalho. As pessoas mais velhas procuram um ganho cultural mais amplo”, diz Marcelo Albuquerque, diretor financeiro da Belta.
O desejo de aprender um novo idioma seria o motivo para esse público procurar mais do que um simples passeio, enquanto a vontade de conhecer lugares e pessoas diferentes o afastaria das salas de aulas brasileiras. “Eles querem aprender uma língua, sim, mas não estão loucos por um certificado de proficiência. Depois de certa idade, com as coisas já estabelecidas, você quer mesmo é se divertir, aproveitar o momento que está vivendo”, afirma Gabriel Lloyd, diretor da Fit Intercâmbio.
Segundo Luciano Timm, diretor da Education First Brasil, o curso sênior pode montar turmas misturadas ou com somente pessoas de mesma faixa de idade - no caso, mais de 50 anos. A postura positiva, ansiosa por conhecer pessoas, garante a vivência em grupo e o aprendizado mais efetivo, afirma Timm.
A carga horária e as acomodações durante a viagem também são flexíveis, de acordo com Marcia Mattos, gerente de cursos da STB. Ela relata preferência do público por programas de curta duração e pela privacidade de hotéis ou apartamentos individuais.
Culinária, dança, teatro, golfe
Famoso por promover o ensino de idiomas rapidamente, os intercâmbios para pessoas mais velhas costumam focar em atividades extracurriculares como forma de atrair o estudante para fora de sua zona de conforto.
Pode ser por meio de um curso de italiano voltado ao estudo da arte nos museus de Florença, ou de uma sala de aula cheia de estrangeiros prontos a aprenderem francês e degustarem a culinária e os vinhos de Paris. O certo é que cada destino apresenta uma atividade extra relacionada intimamente à cultura local.
Ainda assim, a matrícula nessas atividades não costuma ser obrigatória - são pacotes adicionais. É possível seguir o exemplo de Ilse: pegar um ônibus qualquer nas tardes livres, com destino mais ou menos certo, só para ver a cidade como qualquer outro turista. E praticar o novo idioma, claro.