Neste Dia do Diplomata, 20 de abril, iremos explorar mais sobre a realidade desta profissão. Um dos caminhos para se tornar diplomata é pela formação em Relações Internacionais e a posterior aprovação no Instituto Rio Branco.
Para compreender mais sobre essa formação, conversamos com os professores de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Eduardo Viola e Oliver Stuenkel. Veja o que descobrimos!
Alunos de Relações Internacionais
Primeiro, questionamos os professores se eles percebem características comuns aos alunos de Relações Internacionais (R.I). Eduardo explica que são jovens com muito interesse no mundo e que, costumeiramente, são de famílias que têm o hábito de ler notícias sobre economia e cultura.
Outro aspecto que o professor Eduardo reconhece é o desejo de se possuir uma carreira internacional. Nesse momento, ele explica que a diplomacia não é o único caminho para os graduados em Relações Internacionais (R.I), há outros espaços em empresas e até mesmo repartições públicas.
Além destas, Eduardo destaca a dificuldade com matemática, também comum nos alunos de R.I. Apesar desta constatação, o professor reconhece que com a maior cobrança por matemática nos vestibulares, a habilidades dos alunos têm melhorado.
Já Oliver ressalta a curiosidade e a disposição de considerar outros pontos de vista, pois, segundo ele, a essência da diplomacia é a negociação e compreensão de que outras culturas enxergam o mundo de maneiras diferentes. Além disso, o professor afirmou que os aluno de R.I são apaixonados pelo mundo, possuem vontade de conhecer outros países e sociedades.
Falando deste aspecto, Oliver lembra que quem quer seguir essa carreira precisa de uma determinação a mais para manter vínculos familiares e de amizade à distância. O que para os brasileiros, segundo Oliver, pode ser um desafio grande, pois, nossa cultura é muito associada às relações familiares.
Brasil no futuro das Relações Internacionais
Com as transformações ambientais e climáticas que o mundo observa, o Brasil ganhou mais atenção no cenário político internacional. Questionamos ao professor Eduardo como esta realidade interfere na formação dos alunos de R.I.
Eduardo nos diz que a maioria dos cursos tem pouca presença de questões de política ambiental e climática. Ele falou:
No máximo, uma disciplina. No caso do meu curso, na Fundação Getúlio Vargas, que eu dou o curso de Política Climática
Ele explica que, no currículo estabelecido pelo MEC, a presença desta matéria é limitada. O professor diz que o currículo mínimo estabelece muitas coisas, mas que nesse aspecto, ele está atrasado.
O professor também destaca que há colegas de profissão que não são especialistas na matéria, mas que se dedicam a estudar o tema e abordam as questões climáticas em outras aulas.
Ao professor Oliver, perguntamos quais mudanças podem ser recebidas na formação de R.I em relação à ascensão de países asiáticos, africanos e latino-americanos no cenário internacional. Ele responde que o Ocidente está perdendo espaço no centro dos debates diplomáticos, um exemplo que ele fornece para explicar sua afirmação é o número de embaixadas brasileiras em países africanos, de 30 anos para cá, o número aumentou muito.
Não só as embaixadas, como as empresas internacionais brasileiras também têm aumentado a sua atuação em países do sul global. Ele diz que se torna necessário ser mais global, Oliver conta que, anos atrás, ele sempre lia notícias do Brasil, da Europa e dos Estados Unidos; hoje em dia, ele também precisa ler periódicos da China, da Índia e de países africanos.
Essa nova realidade impõem novas necessidades na formação dos alunos. Oliver conta que, além de adaptar suas aulas, ele, quando era coordenador de intercâmbio, se esforçou muito para fechar acordo com os países em desenvolvimento, como África do Sul, Coreia do Sul, Egito, China, entre outros.
Por fim, Oliver ressalta que os alunos em formação, atualmente, terão posições de destaque daqui há dez, vinte anos; e quando esse tempo chegar, o mundo estará em um novo contexto político, com mais influências da Ásia, por exemplo.
Diplomacia brasileira nas questões climáticas
Questionamos também qual futuro Eduardo enxerga para a diplomacia brasileira com a crescente relevância das questões climáticas e ambientais. O professor nos explica a posição proeminente do Brasil neste assunto.
Segundo ele, o Gigante das Américas é uma potência ambiental, agrícola e energética. O energético e o ambiental estão muito ligados, pois, é necessário fazer a transição da energia fóssil para as fontes sustentáveis.
Eduardo explica que, apesar do Brasil estar aumentando sua produção de petróleo e se tornando um exportador relevante, temos uma matriz energética de média intensidade em liberação de carbono, comparado com a maioria dos países. Então, a transição energética, aqui, está avançando.
Mas, Eduardo diz que isso não é um plano consciente, e sim, que acontece por conta da vasta utilização de hidrelétricas.
Por fim, ele explica que apesar da importância brasileira em vários aspectos, a centralidade só é um fato quando falamos de biodiversidade ou de agricultura. Pois, quando o assunto é transição energética, ainda temos cifras tímidas.
Já em relação à exportação de alimentos, o professor explica que o Brasil é o 4º maior produtor do mundo, porém o 2º maior exportador, atrás apenas dos Estados Unidos.
Mudanças na política internacional e o futuro do Brasil
Com o acirramento de disputas internacionais, o retorno de guerras na Europa, o crescimento chinês e a expansão dos Brics, fica a dúvida de qual papel será imposto ao Brasil neste cenário de mudanças. Oliver nos explica que a política externa brasileira é pragmática e multi relacionada, no ponto de vista do professor, nem mudanças internas, nem externas irão alterar esta característica brasileira.
Ele diz:
Mesmo no contexto de grandes tensões, entre Rússia e Estados Unidos, China e Estados Unidos, o Brasil, a princípio, se posiciona de tal forma que possa manter laços produtivos com todos os lados e isso pode produzir vantagens econômicas e diplomáticas. Me parece bastante provável que esta continuará sendo a estratégia brasileira
Dificuldades dos alunos em Relações Internacionais
Por fim, perguntamos a Eduardo quais dificuldades ele identifica nos alunos ingressantes no curso de Relações Internacionais. O professor começa dizendo que a resposta vai variar muito de acordo com a turma que está sendo analisada.
Ainda assim, ele conta que é perceptível a dificuldade e o baixo preparo quando o assunto é matemática. Outra dificuldade é uma formação histórica e geográfica insuficiente, pois, são matérias muito exigidas ao longo do curso de Relações Internacionais.
O professor também fala que não há problemas se você não teve acesso a isso na escola secundária, desde que você decida dedicar tempo para estudar estas matérias durante a graduação.
Conselhos para futuros diplomatas
Pedimos ao professor Oliver que fornecesse conselhos aos jovens que querem cursar Relações Internacionais com o intuito de se tornarem diplomatas. Ele fala ser necessário muito estudo e também uma dedicação em relação à vida social e familiar, pois, diplomatas, além de viajar muito, podem ir viver em países distantes.
Ele também ressalta os espaços em que se pode trabalhar com diplomacia fora do Itamaraty, como na Polícia Federal, no BNDES, no Banco Central, no Congresso, em Prefeituras, governos estaduais, ONGs e também na iniciativa privada. Ele declarou:
Eu, por exemplo, apesar de não ser diplomata de carreira, apesar de ser pesquisador, eu, ao longo dos últimos anos, fiz várias viagens para negociar acordos de cooperação com universidades no exterior também. Então, eu acho que isso é algo importante levar em consideração
Por fim, ele nos conta de conversas que tem com diplomatas aposentados, eles percebem cada vez mais a estrutura multipolar que se estabelece na política internacional. É necessário conhecer mais países e mais culturas, o que, segundo Oliver, deixa a profissão mais interessante.
Por Tiago Vechi
Jornalista