Do jardim ao 1º ano: como ajudar as crianças nessa nova fase

Aumento de responsabilidade não pode se tornar uma pressão sobre as crianças, e pais e professores precisam saber como ajudá-las no processo

18 jul 2015 - 11h00

“Eu chorava depois de deixá-lo na escola, mas nunca na frente dele.” É assim que Angela Moura, moradora de Brasília, descreve a entrada do filho mais novo na primeira série, em 2014. Mas não foi só a mãe que custou a se adaptar: ela refletia a angústia do caçula, que sentiu a diferença em relação às atividades lúdicas que tinha antes. “Ele reclamava que não tinha parquinho na escola, que quase não brincava e tinha apenas 15 minutos de recreio para comer e brincar. Ele sentiu demais”, relata.

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Angela, como outros pais, acredita que as crianças entram muito cedo no primeiro ano. A Lei 11.274, de 2006, ampliou para nove anos a duração do ensino fundamental, determinando o ingresso dos estudantes ao seis anos, em vez de aos sete. Antes da nova lei, algumas escolas, quando entendiam que a criança não estava pronta para a nova etapa, sugeriam aos pais a permanência na pré-escola por mais um ano. A medida visava auxiliar a transição, mas também era motivo de polêmica. Professor do curso de pedagogia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Ítalo Francisco Curcio não acredita que fosse uma boa opção. “A avaliação na pré-escola é feita com acompanhamento e registro do desenvolvimento, sem objetivo de promoção.”

A partir do 1º ano, até a organização espacial da criança muda: há menos colegas e também menos tempo para brincadeiras
A partir do 1º ano, até a organização espacial da criança muda: há menos colegas e também menos tempo para brincadeiras
Foto: Reprodução

Para ajudar o filho, Angela apostou no diálogo. “Tive que conversar muito e mostrar que ele estava crescendo, que não era mais um bebê e que, como era um rapazinho, teria que estudar”, conta. A mudança de rotina pode ser complicada para as crianças que não estudavam antes, e até mesmo para as que estavam na pré-escola. Maria Carmen Silveira Barbosa é professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e lidera um grupo de pesquisa sobre educação infantil. Ela ressalta que até a organização espacial muda. No jardim de infância, as crianças, normalmente, sentam ao redor de mesas maiores, em pequenos grupos. A nova realidade apresenta classes individuais e menos momentos para brincadeiras.

Segundo a especialista, muitas famílias têm um choque ao perceber que os filhos cresceram. “A primeira série termina com o bebê da casa, marca a passagem dos pequenos. Agora, são crianças maiores.” O despreparo com que alguns alunos chegam ao ensino fundamental também aumenta o impacto da transição. Maria Carmen lembra que alguns ainda não sabem amarrar os tênis ou ir ao banheiro sozinhos.

Mostrar que a mudança é normal e que não existem motivos pra preocupações é uma medida que auxilia na transição. Por outro lado, algumas tentativas de preparação, explicando que a nova etapa é mais séria, que as responsabilidades aumentarão, acabam assustando os pequenos. Essa mudança de postura não precisa ser colocada pelos adultos, a própria escola vai estimular, de acordo com o ritmo das crianças.

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Para especialistas, a escola é a principal responsável por minimizar as mudanças na cabeça das crianças
Foto: Reprodução

Segundo a pedagoga Letícia Boari Gomes, cabe à instituição escolar diminuir o impacto das mudanças. Ela defende que as séries iniciais precisam ser mais lúdicas. Na mesma linha, Maria Carmen acredita que é possível ensinar por meio de brincadeiras. “Para uma criança de seis anos, é muito mais interessante somar utilizando bloquinhos de madeira do que fazendo risquinhos no caderno.”

Os pais também podem auxiliar propondo brincadeiras sobre o conteúdo que esteja sendo trabalhado na escola. Mas é importante não confundir diversão com pressão: no momento em que a criança não estiver gostando, é hora de parar.

Acompanhar as tarefas para a casa também é importante e estimula os pequenos, mas Letícia alerta: auxiliar no dever não é responder pela criança. Mesmo quando perceber um erro, o adulto não deve simplesmente corrigir, mas ajudar o aluno a ver se não existem outras possibilidades.

O próprio conceito de erro é questionado por Letícia. A professora prefere o termo hipótese. Por exemplo, se o estudante em fase de alfabetização escrever a palava “casa” com “z” no lugar de “s”, isso não deve ser encarado como erro. Durante a alfabetização, primeiro é desenvolvida a relação da grafia com o fonema. Então, escrever “caza” é uma hipótese, já que a letra utilizada produz o som emitido. A correção ortográfica é trabalhada mais tarde.

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Mas saber os limites entre auxiliar e corrigir, incentivar e pressionar não é tão simples. A tarefa pode ficar mais fácil se existir diálogo entre família e educadores. Este contato também permite que possíveis dificuldades encontradas pelas crianças possam ser combatidas em conjunto pelos adultos. No entanto, nem sempre a comunicação é fácil, lamenta Letícia. “Tenho 20 alunos. Na última reunião que fiz, vieram quatro pais.” A falta de tempo muitas vezes é responsável pela ausência dos pais. Mas, para a pedagoga, a escola também precisa atrair os adultos. Cabe ao setor de orientação educacional estimular a parceria com a família.

Cartola - Agência de Conteúdo - Especial para o Terra
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