Uma médica negra aprovada para o cargo de professora de otorrinolaringologia na Universidade Federal da Bahia (UFBA) teve sua nomeação barrada por uma liminar, que concedeu a vaga a uma candidata branca com pontuação mais alta, que contestou na Justiça Federal o uso das cotas como critério de seleção. A universidade afirmou que recorrerá da decisão.
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O caso foi compartilhado pela própria médica que perdeu a vaga, Lorena Pinheiro Figueiredo, em uma postagem no Instagram. Na publicação, a profissional contou que foi aprovada no concurso para docente da Faculdade de Medicina da UFBA, em dezembro do ano passado, e afirmou que seria a primeira mulher negra a conquistar a vaga por meio da lei de cotas.
"Eu seria a primeira docente aprovada pela lei de cotas da Faculdade de Medicina da Bahia", afirmou. No entanto, a nomeação foi impedida por uma liminar concedida a partir de uma ação judicial movida pela candidata de ampla concorrência, que argumentou contra a nomeação da cotista.
De acordo com Lorena, mesmo após a UFBA e a procuradoria jurídica da instituição justificarem o respeito às políticas afirmativas e à legislação de cotas, a 1ª Vara Federal Cível da Bahia decidiu em favor da candidata que questionou o resultado.
"Uma juíza concedeu esse parecer, violando o meu direito, impedindo que uma cotista assumisse a vaga. Eu fiquei completamente sem chão, eu me senti completamente violada, completamente desrespeitada", disse, afirmando que, apesar de suas qualificações e conquistas, a decisão judicial desfez o resultado que a colocava como primeira colocada.
Lorena também levantou um debate sobre a sub-representação de profissionais negros na medicina e em cargos acadêmicos. "Quantos médicos e médicas negras você vê nos consultórios? Quantos desses fizeram mestrado, doutorado? Quantos desses estão na universidade tocando pesquisa?", questionou, ao afirmar que a desigualdade não está na qualificação, mas no racismo estrutural que impede o acesso equitativo a essas oportunidades.
A médica finalizou seu relato pedindo um debate amplo sobre a questão das cotas e a desigualdade racial no Brasil. "A gente precisa conversar sobre isso e, por mais doloroso que esteja sendo esse momento para mim, é preciso falar sobre o assunto, convidar toda a sociedade para um debate", destacou.
Em nota, a UFBA afirmou que realizou, em dezembro de 2023, concurso para professores do magistério superior, regido pelo Edital n. 01/2023, no qual foram oferecidas 30 vagas para 28 áreas do conhecimento.
"Na área da Otorrinolaringologia foi homologada como primeira colocada a candidata Lorena Pinheiro Figueiredo, autodeclarada negra. Ela não foi nomeada por conta de decisão judicial movida por outra candidata, que determinou à universidade, por meio de liminar, que 'convoque a impetrante, classificada em 1º lugar, para nomeação, posse e exercício, a fim de assumir a única vaga aberta para o cargo', abstendo-se ainda de 'convocar e nomear candidatos cotistas para a vaga disputada' ", explicou a universidade sobre a decisão da Justiça.
De acordo com a instituição, diante da determinação determinação judicial, a universidade teve que nomear para a vaga a candidata Carolina Cincurá Barreto, impetrante da ação. No entanto, a UFBA irá recorrer da decisão.
"A decisão foi firmada sem que a universidade fosse intimada a se manifestar, tendo a Pró-Reitoria de Desenvolvimento de Pessoas (PRODEP) tomado conhecimento do processo já na fase de cumprimento da decisão. Ato contínuo, a PRODEP elaborou os subsídios para a defesa da universidade, encaminhados à Procuradoria Federal junto à UFBA, órgão competente para a representação jurídica da instituição, para as providências de recurso da decisão, estando o processo em andamento", destacou a universidade.
O Terra entrou em contato com o hospital em que a médica Carolina Cincurá trabalha, mas foi informado, por meio de uma funcionária da unidade hospitalar, que ela não "está disposta a falar sobre o assunto".