Nos últimos dias, milhares de pessoas que moram em Maceió (AL) tiveram de deixar suas casas por conta do risco de colapso de uma mina de sal-gema que pertence à empresa petroquímica Braskem. O solo de diversos bairros está afundando e, segundo a Defesa Civil, uma cratera do tamanho do estádio do Maracanã pode se abrir no local.
Embora a repercussão tenha aumentado nas últimas semanas, o problema não é recente e se arrasta pelo menos desde 2018. Afinal, Maceió vai afundar? O GUIA DO ESTUDANTE explica neste texto o que está acontecendo na cidade, o histórico de exploração do minério e quais as consequências para a população. Também conversamos com professores de Geografia e Química para mostrar como o tema pode aparecer nos vestibulares.
Por que Maceió está afundando?
O problema ocorre pela longa exploração de sal-gema na região, combinada com a localização das minas em uma área de falha geológica. A extração desse minério gera pontos de fragilidade no subsolo, que começa a ceder. É como se fossem formados grandes buracos nessa camada que, se não são preenchidos, levam ao afundamento do solo. A partir disso os bairros da área afetada começam a afundar, pois parte da estrutura rochosa que lhes dava sustentação foi retirada pelo processo de mineração.
Especialistas afirmam que ainda será necessária uma longa investigação para entender como a situação chegou a este ponto, mas que, definitivamente, o agravamento da situação não tem um fundo somente natural. Provavelmente houve atraso ou inadequação nas medidas de prevenção ao ocorrido.
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A exploração histórica de sal-gema em Maceió
A situação que Maceió enfrenta hoje tem origem em décadas atrás. Desde os anos 1970, diferentes empresas, com liderança da Braskem no período mais recente, vêm extraindo sal-gema do subsolo de bairros da cidade. Essa extração intensiva e prolongada, especialmente em áreas de falha geológica, vai deixando buracos no subsolo. Esses buracos se transformam em cavernas artificiais e as paredes entre essas cavernas começam a ceder - o que também acontece com a estrutura rochosa como um todo.
Em 2018, isso começou a resultar em rachaduras e afundamento do solo, afetando principalmente os bairros de Pinheiro, Mutange e Bebedouro, e deslocando milhares de pessoas até chegar na situação atual. Já foram mais de 60 mil pessoas removidas da região, que hoje está próxima de um colapso.
O que é sal-gema e como é realizada sua extração?
Para começar, é importante saber que tudo que se chama 'gema' é minério. O sal-gema é o minério de sal, ou seja, é um minério de NaCl (cloreto de sódio). Também chamado de halita, ele é encontrado em jazidas subterrâneas formadas a partir da evaporação do oceano, como explica Pietro Escobar, professor de Química do Curso e Colégio Oficina do Estudante.
No Chile, o sal-gema é extraído do deserto; aqui no Brasil, é extraído das minas, localizadas principalmente em estados da região Nordeste como Alagoas. Essa matéria-prima é usada pela indústria química na produção de soda cáustica e bicarbonato de sódio, além de produtos de limpeza e higiene.
A extração do sal-gema pode ser feita de diferentes maneiras. Quando o minério está em uma região mais profunda e já existem bairros ou outras ocupações em cima das áreas a serem exploradas, a extração ocorre por meio de túneis. Eles são escavados e recebem água para dissolver o sal-gema, posteriormente bombeando esse material dissolvido para a superfície. Era isso que a Braskem fazia.
O problema é que esses túneis precisam, depois, ser preenchidos com areia, o que nem sempre é feito de maneira adequada. Cria-se então uma situação de muita instabilidade nos solos — especialmente quando por cima desse local existem edificações pesadas, como casas, prédios e avenidas, além da passagem de máquinas, tratores, ônibus.
Segundo Augusto Neto, autor de geografia do Sistema de Ensino pH, a melhor forma de explorar sal-gema sem causar tragédias envolve duas ações: um monitoramento geológico preciso e meticuloso, buscando evitar áreas com falhas tectônicas, e o preenchimento das cavidades que são criadas pela extração, evitando que o solo ceda.
"Para evitar esse cenário, essas cavernas deveriam ter recebido areia, mas das 35 minas da Braskem, só 5 foram preenchidas pela empresa. Isso significa que a grande maioria ficou fragilizada. Em 2019, a extração foi paralisada, mas o processo de afundamento continuou e se aprofundou nas últimas semanas", explica Murilo Medici Navarro da Cruz, Coordenador Pedagógico do Poliedro.
Em comunicado oficial, a Braskem afirma o afundamento no bairro do Mutange, o mais recente e que ganhou visibilidade nas últimas semanas, está sendo monitorado e que toda a área já foi evacuada. Segundo a empresa, a situação pode se desdobrar de duas maneiras: "um cenário é de acomodação gradual e estabilização; o segundo é uma possível acomodação abrupta".
Quais são as principais consequências?
O principal dano causado pelas minas da Braskem em Maceió é humano. Mais de 60 mil pessoas já foram deslocadas às pressas, abandonando seus lares e bairros inteiros. Os custos para relocação, indenizações, aterramento e reconstrução de imóveis é imensurável. Em entrevista à BBC Brasil, uma moradora que ainda morava no bairro do Mutange contou que foi despejada às pressas na madrugada da última quinta-feira (30). Ela ainda não havia deixado a região porque considerou a oferta de indenização da Braskem muito abaixo da avaliação.
"Esse movimento de remoção forçada das pessoas é muito grave porque já se trata de um bairro onde vivem pessoas socioeconomicamente vulneráveis", afirma Luis Felipe Valle, professor de Geografia do Colégio Oficina do Estudante. "Ou seja, a maioria dessas pessoas não têm recursos financeiros para comprar ou alugar casa em outro lugar, para se sustentar e se manter, por exemplo, em um hotel. São pessoas que têm limitações financeiras e não é apenas sair de casa - é uma questão que envolve a escola das crianças, o local do emprego, e deixar para trás um lar, uma história, uma vida",
O caso da Braskem em Maceió é mais um exemplo de crime ambiental no Brasil, assim como o rompimento de barragens nas cidades de Mariana e Brumadinho, em Minas Gerais. Luis Felipe reforça que não se tratam de acidentes, pois as grandes companhias envolvidas nesses casos em geral sabem dos riscos envolvidos e do potencial de tragédias como essas acontecerem.
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"A crise em Maceió não é a primeira, e infelizmente não deve ser a última desse tipo, e ela destaca a importância da gestão responsável dos recursos naturais e da prevenção de desastres ambientais. É urgente que todas as empresas compreendam, além das óbvias questões éticas, que esse tipo de despesa não é gasto, mas um investimento", completa Augusto Neto, autor de geografia do Sistema de Ensino pH.
Como o tema pode ser abordado nos vestibulares?
Professores ouvidos pelo GUIA acreditam que esse assunto pode aparecer em vestibulares sob o guarda-chuva de diversos temas, como impactos ambientais, impactos sociais, atividade mineradora, gestão de recursos naturais e geologia.
Também pode haver comparações com outros fenômenos, como os casos de Brumadinho. "Minha maior aposta é a comparação entre esse tipo de movimentação e os tremores tectônicos, mostrando que nem todo terremoto vem do interior da Terra, mas também pode vir de ações humanas", diz Augusto Neto.
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Ele também destaca que o assunto pode abranger temas em Biologia e Química, enfocando aspectos ecológicos e químicos do sal-gema. Além disso, pode ser usado como pano de fundo em questões de Matemática e Física, ou mesmo na área de linguagens com textos sobre o ocorrido ou um tema de redação.
Em Geografia, pode aparecer uma questão sobre a formação das jazidas de minérios, que acontecem por meio da sedimentação. O sal-gema vem do sal do mar, a água marinha evapora e se formam camadas de sal-gema, que ao longo do tempo podem ser cobertas por outros terrenos. Por esse motivo é utilizado o termo formação sedimentar.
Por fim, os impactos sociais da mineração também podem ser abordados, questionando os candidatos sobre a situação de Maceió e o desalojamento das famílias.
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