Cursar uma nova graduação, investir em formações curtas, pesquisar e empreender em áreas diferentes de atuação têm sido movimentos cada vez mais comuns nas jornadas de profissionais insatisfeitos com seus empregos. Uma pesquisa do LinkedIn mostrou que, neste ano, 75% dos brasileiros consideravam mudar de emprego, superando o índice de 2023, de 60%. Os profissionais entrevistados buscam novas oportunidades que ofereçam salários mais competitivos (44%), equilíbrio entre vida profissional e pessoal (29%) e confiança em suas habilidades (21%).
Para garantir e ampliar as possibilidades de movimentação no mundo do trabalho ou no universo do empreendedorismo, os profissionais se deparam com a importância do lifelong learning, a educação continuada, para aprimorar ou adquirir novas competências.
"O avanço tecnológico começou acelerar demais as mudanças, fazendo com que o conhecimento das pessoas tenha uma durabilidade menor. Antigamente, você fazia uma graduação de até seis anos e adquiria um conhecimento estável, aquilo ia te servir por muitos anos. A formação continuada era um detalhe, mas hoje a coisa se inverte", afirma Vidal Martins, vice-reitor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR).
O lifelong learning não se configura somente com cursos de curta duração, ou mais longos, ministrados nos espaços formais de educação, mas sim em atualizações por meio de experiências de aprendizagem. Essas podem ser intermediadas pela figura de mentores, que podem ajudar com trocas, inspirações e orientações sobre direcionamento de carreira.
Depois de completar 45 anos de idade e uma carreira de 25 anos dedicada à área de branding, a advogada Andrea Janér, de 51 anos, decidiu se desafiar ao esbarrar na necessidade de se atualizar e expandir seu networking. Foi procurar caminhos participando de festivais de inovação como o SXSW (South by Southwest, Web Summit e VivaTech).
"Acabei criando minha própria vaga e fui empreender, acho que é algo que vai acontecer com as pessoas que chegam nesta idade pensando em novas carreiras, principalmente quando há o recorte de gênero. A mulher com 50 anos tem uma capacidade grande de se reinventar, mas os ambientes ainda são muito etaristas", afirma a fundadora e CEO da Oxygen, uma plataforma que promove curadoria de conteúdo sobre inovação e tendência.
Uma das áreas de atuação do seu negócio é justamente promover viagens para eventos e encontros de inovação dentro e fora do Brasil. "Levamos as pessoas para ajudá-las a extraírem o que é mais legal e aplicável para as suas vidas. Acredito que são uma forma muito especial de aprender rápido sobre para onde o mundo está indo", diz Andrea. Para a CEO, o repertório é a palavra-chave para viabilizar as movimentações de carreira, porque muitos profissionais ficam "ensimesmados" e só ampliam as perspectivas quando são provocados pelo mercado.
Letramento digital e tecnológico
Nem mesmo os profissionais consolidados e satisfeitos com suas carreiras passam ilesos pela necessidade de se atualizar. O avanço de novas ferramentas digitais e da inteligência artificial generativa afetou rotinas, alterou as demandas e exigiu atualização. Dados do levantamento do LinkedIn apontaram que 33% dos profissionais não sabem como alinhar suas habilidades aos empregos que almejam. Por outro lado, a pesquisa mostrou que as competências exigidas pelo mercado mudaram 25% desde 2015 e a expectativa é de que esse valor atinja 65% até 2030, por causa da IA.
Mesmo porque a inteligência artificial pode ser uma aliada de muitas profissões, ao ampliar produtividade e automatizar funções. "Por isso, para continuar no mercado e não ser prejudicado por esses avanços, o profissional precisa ter senso crítico e capacidade de comandar essas tecnologias, agregando valor", afirma Martins. O vice-reitor reforça que os profissionais que preferem comodismo e têm resistência em aprender certamente terão dificuldades.
Encaixando propósitos
A busca pelo equilíbrio entre vida profissional e pessoal, priorizando bem-estar, qualidade de vida e propósito também é um dos fatores de movimentação no mercado. "As pessoas estão mais atentas ao que a empresa faz da porta para dentro, exigem uma cobrança maior das condições de trabalho, principalmente os mais jovens, a geração Z. Estamos vendo a queda de braço da flexibilidade, que é voltar para o escritório versus se manter remoto ou híbrido. Acho que os maiores talentos querem flexibilidade e ela é um valor, principalmente em um trabalho relacionado à economia do conhecimento", afirma Andrea.
Embora a rotatividade seja mais marcante entre os profissionais mais jovens, há motivos que perpassam as questões geracionais. "Existe um elemento que não faz diferença se eu sou jovem ou uma pessoa mais experiente que é a realização pessoal, o propósito que eu encontro numa determinada atividade. Quando o meu propósito pessoal se encaixa com o de uma organização, eu consigo me realizar e há uma tendência de se manter independentemente da idade", afirma Martins.
Essa foi uma das buscas de Liana Kerikian, de 44 anos, que passou duas décadas trabalhando com marketing e comunicação no setor de beleza. Mas em 2022 se desligou da área e decidiu se reinventar.
"Dentro de uma empresa você fica mergulhada no segmento que atua e precisei olhar para outros segmentos, especialmente porque o marketing passou a estar na frente das decisões de negócios da companhia como nunca antes. Hoje os limites de aprendizado estão mais fluidos, uma hora os pontos se conectam e você faz as correlações. Isso te dá uma visão ampla sobre a vida", conta Liana, que desde o ano passado ocupa o cargo de diretora de marketing da Decathon. No segmento de esporte, ela encontrou o propósito e o impacto que buscava.
Para a diretora, a grande lição para ter oportunidades é entender que a aprendizagem deve ser contínua. "Ninguém sabe mais de nada, o que eu sei hoje vai mudar. Por isso, para se manter relevante como profissional e pessoa, não dá para parar de aprender, além de ter humildade e curiosidade para entender o que está acontecendo no mundo."