As oportunidades no mundo do trabalho ligadas à área de ESG (na tradução do inglês: ambiental, social e governança) vão exigir que cada vez mais os profissionais consigam articular conhecimentos que vão além desta agenda. A tendência se alinha ao lifelong learning, conceito baseado em quatro pilares: aprender a aprender; aprender a fazer; aprender a conviver; e aprender a ser.
Fabricio Stocker, coordenador do MBA em ESG da Fundação Getulio Vargas (FGV), reforça que a atuação na área de ESG exige um aprendizado contínuo, além de engajamento e integração. "Quase todos os meses temos mudança de regulamentações, divulgações de melhores práticas, relatórios e pesquisas. Implementar isso na prática é um desafio grande. Quando as pessoas colocam a mão na massa, trabalhando em consultorias ou em projetos aplicados, desenvolvem melhor essas competências. Conviver é reconhecer que esses profissionais vão dialogar com outros tipos de stakeholders (partes interessadas) e setores."
As formações, em especial as de pós-graduação, segundo o professor, oferecem conhecimento técnico, mas também desenvolvem habilidades analíticas e estratégicas que podem ajudar a viabilizar mais possibilidades no mundo do trabalho. "Com um olhar para a sustentabilidade de forma mais instrumental, identificam-se oportunidades e riscos do negócio de uma maneira mais assertiva. Profissionais com esta formação estão sendo mais procurados por grandes consultorias e dentro das empresas", afirma.
Para 2025, o docente destaca como tendências as áreas de:
- finanças sustentáveis, que incluem fontes de financiamento e gestão de ativos;
- tecnologia e inovação, uma vez que a análise de dados pode ajudar a mensurar as práticas de ESG;
- gestão de riscos climáticos e transição energética;
- diversidade e inclusão.
"A economia circular é outra área que tem voltado a ficar mais em evidência, por causa da possibilidade de se trabalhar cada vez mais com design sustentável de produto, embalagens, gerenciamento de resíduos. Como engajar todos os stakeholders dentro desse ciclo de economia circular e logística reversa? É preciso uma equipe especializada para pensar nesse 360?, explica Stocker.
Todavia, quanto mais o profissional conseguir conectar esses saberes, mais possibilidades serão abertas. Na área de diversidade, por exemplo, mais do que o domínio dos conceitos, os ganhos de carreira surgem quando o profissional consegue cruzar o conhecimento sobre o tema com o funcional de sua rotina, como afirma Renata Moraes, sócia-fundadora e CEO da ImpulsoBeta.
"Como uma pessoa que fez carreira na área de comunicação e marketing consegue se especializar em diversidade para entregar esses serviços dentro de uma proposta específica? Hoje cada vez menos o conhecimento puro é valor financeiro, temos a inteligência artificial para responder tudo, não precisamos de um consultor como há cinco anos", explica.
Renata cita como exemplo a Escola de Marketing Antirracista, uma iniciativa criada pela Unilever e apoiada por parceiros, que une especialização aos negócios. No período de um ano, cerca de 350 funcionárias da área de marketing da empresa passaram pelas formações, incluindo aulas práticas, teóricas e mentorias, com foco na agenda racial.
Pauta de Direitos Humanos
A criação de uma Política Nacional de Direitos Humanos e Empresas que tramita no governo federal e vai propor medidas para regulamentar a atuação das empresas quanto à promoção e à defesa dos direitos humanos, entre outras iniciativas, deve exigir formação profissional qualificada e novas possibilidades no mercado.
Paralelamente à política brasileira, há uma nova regulamentação europeia chamada Diretiva de Due Diligence de Sustentabilidade Corporativa (CS3D), que também vai funcionar como política nacional, com foco em práticas de inclusão, responsabilizando as empresas por seu impacto em direitos humanos.
O tema foi amplamente abordado no 13.º Fórum das Nações Unidas (ONU) sobre Direitos Humanos e Empresa, realizado no fim do mês, em Genebra, na Suíça. No encontro em que a CEO da ImpulsoBeta participou foram debatidas violações cometidas no ambiente corporativo.
"Fiquei super animada com as discussões. Teremos marcos regulatórios nacionais e internacionais, tornando cada vez mais rígida a cobrança das empresas em relação aos direitos humanos. Isso pode impulsionar carreiras, serviços de consultoria, novas demandas e oportunidades de negócios para profissionais da área jurídica e ambiental."
Heiko Spitzeck, professor e diretor do núcleo de sustentabilidade da Fundação Dom Cabral, diz que a polarização política no governo dos Estados Unidos, as guerras na Ucrânia e Israel e o cenário geopolítico criaram um "mundo mais incerto", fazendo com que as empresas priorizem seus negócios em detrimento das pautas de ESG. Por isso, segundo ele, as competências gerais mais exigidas serão inovação e empreendedorismo juntamente com o entendimento sobre desafios e oportunidades sociais e ambientais, além de uma articulação com vários setores.
"Quanto mais o profissional conseguir fazer isso, mais apto ele estará para uma carreira ou para fundar uma organização bem-sucedida. Só uma agenda ativista sem negócio não vai funcionar, assim como um negócio sem agenda social e ambiental também não."
Entretanto, ele aposta que haverá oportunidades em setores como gestão de risco. "O outro lado do risco é a oportunidade. Se o profissional conseguir se posicionar em área que ajude a empresa a lidar melhor com mudanças climáticas, com gestão de resíduos, nesse contexto mais atrelado à inovação, como se investe em novos negócios ou fomenta soluções mais sustentáveis, também pode ser interessante."
'Cerco para negócios que não atuam de forma ética está se fechando'
A curto prazo, as estratégias de ESG podem não gerar mais lucro direto para a empresa, mas certamente sua ausência poderá fazê-la perder negócios, na visão de Renata. "As pessoas que estão alinhadas com essas práticas enquanto compromisso moral e imperativo ético, não precisam ser convencidas porque têm uma responsabilidade social. Mas a questão é que o cerco para os negócios que não atuam de maneira ética está se fechando", afirma. Segundo a CEO, hoje já há linhas de crédito que são concedidas a juros menores atreladas a metas ESG.
O desafio agora, principalmente para as empresas que estão em um maior nível de maturidade em relação a estas práticas, é o de apoiar seus profissionais para implementar novos processos em suas rotinas. "É bem diferente reunir as pessoas para falar sobre letramento racial e ensinar a minha pessoa que toca o processo seletivo a apurar um caso de racismo. Como faz isso? A área de compliance estava preparada para lidar com questões de ética, de propina, e agora tem de lidar com racismo e assédio sexual", diz ela.