Agressividade de Doria contra adversários pode fazê-lo perder eleitores?

Em polêmica com ex-governador Alberto Goldman (PSDB), prefeito disse que o correligionário 'é um improdutivo, um fracassado'; para marqueteiros ouvidos pela BBC Brasil, a fala pode custar pontos para Doria, apontado como pré-candidato a presidente nas eleições de 2018.

11 out 2017 - 18h47
(atualizado às 18h59)
João Doria discursa em uma mesa com empresários
João Doria discursa em uma mesa com empresários
Foto: BBC News Brasil

"Olá. Hoje meu recadinho vai para você Alberto Goldman, que viveu a vida inteira na sombra do Orestes Quércia e do José Serra. Você que é um improdutivo, um fracassado (...). Aliás, você coleciona fracassos na sua vida. E agora vive de pijamas na sua casa". O texto é dito por João Doria (PSDB), prefeito de São Paulo e apontado como pré-candidato a presidente, em um vídeo que divulgou nas próprias redes sociais.

O vídeo, publicado no último sábado, era uma resposta ao correligionário Goldman, ex-governador paulista que na semana passada afirmou que Doria negligencia a gestão da prefeitura. "A única coisa que nasceu até agora (após nove meses de gestão) foi o candidato à Presidência da República. Esqueceu a prefeitura", disse o tucano, que também acusou a gestão municipal de direcionar (ou seja, fraudar) licitações.

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Nesta terça-feira, Goldman, de 79 anos, voltou atrás da fala sobre direcionamento de licitações na prefeitura, mas sem recuar nos ataques ao prefeito. E os secretários de Doria foram instruídos a não falar mais sobre a polêmica.

Mas, para marqueteiros e especialistas ouvidos pela BBC Brasil, o dano de imagem já está feito. E o vídeo poderá, inclusive, virar munição contra o prefeito em uma eventual disputa em 2018 - além do Palácio do Planalto, ele também é cotado para disputar o governo estadual.

Com o vídeo, Doria pode ter quebrado dois princípios gerais das campanhas eleitorais: evitar ataques pessoais a interlocutores e, principalmente, não parecer arrogante.

Em outro contexto, a ex-presidente Dilma Rousseff foi aconselhada na campanha de 2014 a moderar o tom de "nariz em pé" para não afastar os eleitores. Em 2010, a mesma Dilma optou por vestuário e visual com o objetivo de suavizar a própria imagem, de forma a não afastar eleitores identificados com o centro político. Ela saiu vencedora nas duas ocasiões.

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Retrato de Alberto Goldman
Foto: BBC News Brasil

"O povo pobre é conservador, e o Doria parece achar que o conservadorismo se resume a temas de costumes, como a questão LGBT. E não é. Há também uma questão importante de valores familiares, de respeito aos mais velhos. Ele contrariou isso", diz o marqueteiro Paulo de Tarso Santos, que assinou as campanhas de Luiz Inácio Lula da Silva em 1989 e 1994 (quando foi eternizado o jingle "Lula-lá").

"Ele já tinha este estilo de 'pão-pão, queijo-queijo', de 'bateu, levou'. Tipo o Fernando Collor. Ele acredita nesse estilo. Eu pessoalmente acho que (esta forma de fazer campanha) tem um teto. Acho que ele já pode estar batendo nesse teto com essa abordagem", complementa Santos, cujo último trabalho foi com o governador reeleito de Goiás, Marconi Perillo (PSDB).

Subida de tom

Este não é o primeiro episódio em que Doria sobe o tom contra adversários em vídeos nas redes sociais. Em março de 2016, por exemplo, o "recadinho" foi para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na época, o petista tinha sido indicado para o cargo de ministro da Casa Civil do governo Dilma Rousseff. Para o hoje prefeito, tratava-se de uma manobra contra a Lava Jato.

"A minha mensagem vai para você, para você, Luiz Inácio Lula da Silva. Você que é um sem-vergonha e um cara de pau, agora eu descobri que você também é um covarde, um covarde com "C" maiúsculo", diz Doria.

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As semelhanças, entretanto, param por aí. Para os marqueteiros, uma coisa é subir o tom contra adversários políticos (como Lula). Outra é fazer um ataque virulento a alguém com uma história política no mesmo campo político de centro-direita, como Goldman.

"Se tem uma coisa que o Goldman não é, é fracassado. E olha que eu nem simpatizo muito com ele. Mas uma pessoa que deixou um legado, como ele, não pode ser tratado assim. (Doria passa a imagem de que), se trata o Goldman dessa forma, imagina como trataria um cidadão comum, num momento de necessidade", avalia outro profissional da propaganda política, Edson Barbosa. Para ele, o eleitor pode acabar se identificando com o alvo do ataque de Doria.

Barbosa foi responsável por propagandas institucionais do PT no auge do escândalo do mensalão (em 2005) e em outros momentos. Este ano, o publicitário cuidou da campanha do novo presidente do Equador, Lenin Moreno.

Retrato do publicitário Edson Santos
Foto: BBC News Brasil

Marca

O diagnóstico de que se tratou de um equívoco do tucano é majoritário entre marqueteiros. Mas há quem discorde e minimize o ocorrido.

Para Elsinho Mouco, que trabalha para o presidente Michel Temer, Doria está apenas entregando algo já esperado pelo público que o elegeu prefeito de São Paulo.

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"Ele foi Doria por inteiro, foi o que sempre o marcou: um cara emocional, um quebrador de regras. Impetuoso", disse o marqueteiro à BBC Brasil.

Para Mouco, Doria pode transgredir um pouco a "regra de ouro" de não fazer ataques pessoais, pois esta já seria uma marca dele.

"Quebraria a chamada 'regra de ouro' se essa resposta fosse gravada pelo governador (Geraldo) Alckmin, um político racional, que tem um controle absoluto da emoção", afirmou.

O marqueteiro brinca com o visual "caseiro" do vídeo de Doria. "Evidentemente que o Doria acordando, todo inchado, e feinho, o Brasil não conhecia. Mas não vejo prejuízo maior", avalia o publicitário.

Elsinhou Mouco e Michel Temer em gravação de vídeo no palácio do Alvorada
Foto: BBC News Brasil

Com Haddad funcionou, mas...

No fim de 2016, Doria conseguiu um feito inédito: foi o primeiro a vencer na capital paulista ainda no 1º turno, com mais de 53% dos votos. Em campanha, o tucano adotou tom agressivo contra o então prefeito, Fernando Haddad (PT), que acabou em segundo lugar.

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"Talvez essa resposta dele tenha a ver com a resposta coletiva (positiva) que ele teve quando foi incisivo contra o Haddad", diz Hilton Fernandes, cientista político e professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo.

"Mas funcionou porque os eleitores de Doria não são os mesmos eleitores de Haddad. Mas, agora, ele se voltou contra um nome do mesmo partido", completa Hilton, para quem o resultado pode ser diferente desta vez.

"(A agressividade) é uma característica dele. Mas não significa que o eleitor não vá levar isso em conta. O eleitor considera essas falas e pode avaliar como um momento de arrogância, de falta de respeito com um nome histórico do PSDB", diz o cientista político.

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