O presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) recorreu a mentiras em declarações dadas ao longo deste domingo (23) ao tentar dissociar sua imagem à do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), seu aliado, que atirou em policiais federais que cumpriam mandado de prisão ordenado pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Ele se entregou somente à noite após negociação que envolveu o ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres.
Bolsonaro afirmou que não há fotos dos dois juntos, embora existam registros de ao menos quatro encontros. Já o fato dele ter ingressado com uma notícia-crime contra o presidente tampouco prova que o ex-deputado seria um rival. Além de evidências da proximidade entre os dois, o procedimento aberto por Jefferson ecoava uma pauta bolsonarista: obrigar o Senado a votar pedidos de impeachment de ministros do Supremo.
Confira a seguir, em detalhes, o que checamos.
Não tem uma uma foto dele [Roberto Jefferson] comigo, nada - Live (23.out.2022)
Aos Fatos encontrou ao menos quatro registros de Jair Bolsonaro (PL) com o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), tanto nas redes sociais do petebista quanto no perfil oficial de seu partido no Facebook.
Em abril de 2021, Bolsonaro posou ao lado de Jefferson em visita do prefeito do município de Bagé (RS), Divaldo Lara (PTB), ao Palácio do Planalto. Alguns dias depois, em 29 de abril, o presidente apareceu ao lado do ex-deputado e do pastor Paulo Xavier. Os dois voltaram a aparecer juntos em maio do mesmo ano com a vice-presidente do PTB, Graciela Nienov.
Há também registros de um encontro entre o presidente e Jefferson em 2 de setembro de 2020, quando foram publicadas quatro fotos dos dois na página do PTB no Facebook.
Em propaganda divulgada nas redes sociais em abril de 2021, Bolsonaro usou uma declaração de Jefferson para defender sua integridade: "Ele [Bolsonaro] é representante do povo. Ele é o chefe do Estado, ele é o chefe do governo e ele tem honrado o que ele disse na campanha: eu não vou roubar e não vou deixar roubar", diz Jefferson, em gravação na qual aparece apenas sua voz.
A agenda oficial de Bolsonaro registra outros dois encontros com Jefferson: no dia 7 de julho de 2020, durante uma reunião com o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Luiz Eduardo Ramos, e em 3 de agosto de 2021, com o pastor Paulo Xavier.
Aqueles que teimam em dizer que o Roberto Jefferson é meu aliado, lembre-se que, em setembro agora, ele entrou com uma notícia-crime contra a minha pessoa. Não existe qualquer ligação minha com Roberto Jefferson - Sabatina na Record TV (23.out.2022).
É fato que, em setembro, Roberto Jefferson enviou uma notícia-crime à Justiça Militar em que acusa o presidente e o ministro da Defesa, Paulo Sérgio de Oliveira, de prevaricação por não obrigar o Senado a votar os pedidos de impeachment de Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso.
Porém, além do pedido protocolado pelo ex-deputado atender a uma pauta do bolsonarismo, a destituição de ministros do STF, há farta documentação na imprensa e nas redes sociais que comprovam que Jefferson é aliado de Bolsonaro. Assim, a declaração dada pelo presidente na sabatina da RecordTV foi considerada FALSA.
Em dezembro de 2020, o presidente recebeu o ex-deputado no Palácio do Planalto e foi convidado a se filiar ao PTB para disputar a reeleição, segundo informou na época o partido no Facebook. Em 19 de maio de 2021, a vice do PTB, Graciela Nienov, disse que o partido estava "junto com Bolsonaro para o que der e vier". Em outubro daquele ano, o PTB novamente convidou Bolsonaro para a legenda. Em janeiro de 2022, o presidente afirmou em vídeo ter "uma longa história" com Jefferson e mandou um abraço ao ex-deputado.
Bolsonaro acabou se filiando ao PL e o PTB tentou lançar Jefferson como presidenciável, mas o plano foi barrado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral). No evento de lançamento, o deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), candidato ao Senado pela sigla, afirmou que a candidatura presidencial de Jefferson era para que se pudesse falar "o que Bolsonaro não pode".
Após o veto da Justiça Eleitoral, o PTB lançou Kelmon Souza, que fez dobradinha com o presidente em debates no primeiro turno e, no segundo, pede voto em Bolsonaro.
Intervenção. Na notícia-crime enviada à Justiça Militar, que tramita em sigilo, Jefferson pedia também "a imediata aplicação do disposto no art. 142 da Constituição da República Federativa do Brasil, na manutenção da ordem legal, exercendo as Forças Armadas em seus respectivos dirigentes o dever de polícia dos poderes". O artigo citado não tem esse papel.
No dia 13 de agosto de 2021, Moraes ordenou a prisão do ex-deputado no âmbito do inquérito das milícias digitais, além de bloquear seus perfis nas redes sociais. Um dia depois, o presidente Bolsonaro tuitou que pediria ao Senado a instauração de processo contra Moraes e Luís Roberto Barroso. Bolsonaro enviou um pedido de impeachment contra Moraes, que foi negado por Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Repudio [...] a existência de inquéritos sem nenhum respaldo na Constituição e sem a atuação do MP - tuíte (23.out.2022).
Após os tiros disparados e as granadas lançadas por Roberto Jefferson contra os policiais federais, o presidente Jair Bolsonaro publicou um tuíte em que afirma repudiar a "ação armada" e as ofensas do aliado contra a ministra Cármen Lúcia, do STF. É FALSO, entretanto, que o inquérito que motivou a prisão do petebista não tem respaldo constitucional nem contou com a participação do MPF (Ministério Público Federal), como disse o presidente.
O ex-deputado foi preso no âmbito do inquérito 4874, apelidado inquérito das milícias digitais, no qual o MPF (Ministério Público Federal) aparece como um dos autores. Em agosto de 2021, o ministro Alexandre de Moraes determinou a prisão de Jefferson, além do bloqueio dos seus perfis nas redes sociais, apreensão de armas e de acesso a mídias de armazenamento.
Na investigação, a PF (Polícia Federal) apurava o funcionamento de uma organização criminosa que teria o objetivo de atentar contra o estado democrático de direito. Antes de emitir a ordem de prisão, Moraes pediu um parecer da PGR (Procuradoria-Geral da República), que não havia chegado até o dia 12 de agosto, véspera do cumprimento do mandado.
No dia 30 de agosto de 2021, a PGR denunciou Jefferson por incitar crimes contra a segurança nacional. Segundo a denúncia, assinada pela subprocuradora Lindôra Araújo, o ex-deputado incentivou o povo a invadir a sede do Senado "e a praticar vias de fato em desfavor dos senadores, especificamente dos que integram a CPI da Pandemia, com o intuito de tentar impedir o livre exercício do Poder Legislativo". A denúncia foi acatada por maioria no Supremo em fevereiro deste ano.
Em outubro de 2021, o STF também seguiu entendimento do MPF ao negar recurso da defesa de Jefferson e manter sua prisão preventiva.
No sábado (22), Moraes determinou a prisão do político por ter desrespeitado repetidas vezes as medidas restritivas estabelecidas anteriormente. A decisão cita que o ex-deputado recebeu visitas, concedeu entrevistas e continuou publicando ofensas aos ministros do STF nas redes sociais. Na sexta (21), Jefferson atacou a ministra Cármen Lúcia, a quem se referiu como "Cármen Lúcifer", "prostituta arrombada" e "bruxa de Blair".
Referências:
1. Instagram (@blogdojefferson8 1, 2 e 3)
2. Facebook (PTB Nacional 1 e 2)
6. Poder360
8. O Globo
9. TSE
11. Yahoo! Notícias
12. Aos Fatos
14. STF
15. Estadão
16. CNN Brasil
18. MPF