O relatório elaborado pela campanha de Jair Bolsonaro e enviado ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) a fim de provar uma suposta "fraude eleitoral" contabilizou ao menos 9.764 inserções a mais do que as rádios citadas veicularam na realidade — das quais 6.906 (70% do total) para o PT e 2.858 (30%) para o PL.
- Aos Fatos analisou todas as planilhas fornecidas à Justiça Eleitoral, após convertê-las do formato PDF, e comparou os dados com arquivos de áudio também anexados pelos advogados de Bolsonaro;
- O levantamento mostra que 9.764 inserções foram contabilizadas durante o horário eleitoral gratuito — nas faixas de 7h-7h10 e 12h-12h10 em estados onde não haverá segundo turno para governador, e nos períodos de 7h-7h20 e 12h-12h20 nos estados onde haverá;
- Por meio de amostragem, Aos Fatos constatou que todas as rádios mencionadas no relatório transmitiram o horário eleitoral conforme a lei;
- A Lei Eleitoral prevê dois tipos de inserções: a de cinco minutos, transmitida durante dois blocos de horário eleitoral gratuito, e as inserções avulsas de 30 e 60 segundos transmitidas ao longo da programação — que a campanha do PL se dispôs a contabilizar;
- O relatório da campanha de Bolsonaro mistura os dois tipos de inserções e chega a um número total falso.
Na segunda-feira, 24 o ministro das Comunicações, Fábio Faria, e o ex-chefe da Secom (Secretaria Especial de Comunicação) Fábio Wajngarten promoveram uma entrevista coletiva para dizer que a campanha de Bolsonaro havia sido prejudicada porque inserções de rádio não teriam sido veiculadas conforme a lei.
Faria citou os números errados da Bahia, estado em que o Aos Fatos detectou os erros mais gritantes — foram ao menos 2.259 inserções contadas a mais pela empresa Audiency Brasil Tecnologia, sendo 1.647 (73% do total) para o PT e 612 (27%) para o PL.
"O lugar mais forte disso é o estado da Bahia", acusou o ministro das Comunicações, com base em dados falsos. "O estado da Bahia, só na primeira semana [do segundo turno], foram mais de 7.000 [inserções] a mais para o candidato do PT."
Na sexta-feira, 28, questionado pela Folha de S.Paulo sobre aliados de Bolsonaro que defenderam o adiamento do segundo turno com base nas informações falsas apresentadas por ele, Faria disse que se arrependeu "profundamente" de ter convocado a entrevista coletiva. "Se eu soubesse que [a crise] iria escalar, eu não teria entrado no assunto", afirmou.
Após o debate desta sexta, 28, ainda no estúdio da Globo, Jair Bolsonaro voltou ao tema em entrevista à jornalista Renata Lo Prete. "Nós perdemos inserções, o outro lado ganhou as inserções nossas", disse o candidato à reeleição, com base no relatório que possui dados errados. "Apresentamos ao TSE provas (…) e [o tribunal] ignorou isso aí."
Veja exemplos de inserções contabilizadas a mais e identificadas por Aos Fatos.
- O relatório indica que houve uma inserção de 30 segundos às 12h04 de 8 de outubro na rádio Povo (99,5 FM) de Poções (BA). No áudio, Aos Fatos identificou que se tratava do programa de Lula no horário eleitoral gratuito, não uma inserção avulsa. Como o texto da inserção de 30 segundos também aparece no texto da propaganda mais longa, de cinco minutos, o software pode não ter conseguido distinguir os conteúdos;
- O mesmo erro de classificação aparece no trecho do relatório relativo à Rádio Clube (92.7 FM), de Santo Antônio de Jesus (BA). A inserção avulsa teria sido veiculada, segundo o documento, às 7h05 do dia 11 de outubro. Embora o áudio não esteja nos documentos, Aos Fatos localizou a transmissão e confirmou que tratava-se, na verdade, do programa de cinco minutos do presidenciável Lula no horário eleitoral gratuito;
- A rádio Integração FM, de Surubim (PE), informou à 'Folha de S.Paulo' que o relatório indica uma inserção da coligação de Bolsonaro às 7h05 de 10 de outubro de 2022, mas, assim como as demais, a emissora transmitiu o horário eleitoral gratuito nesse horário.
Outro lado. A campanha de Jair Bolsonaro, o PL e a Audiency Brasil Tecnologia foram contatados pelos Aos Fatos, mas não responderam até a publicação desta reportagem.
Colaborou Ana Rita Cunha.
Referências:
2. Folha de S.Paulo (Fontes 1 e 2)
3. Twitter
4. Google Drive (Fontes 1 e 2)
5. TSE