Cidade cearense que mais votou no PT rejeita Bolsonaro e se divide entre Lula e Ciro

Reportagem esteve em Aiuaba, no Ceará, para entender como os moradores estão se posicionamento nas Eleições de 2022

29 set 2022 - 05h00
Aiuaba (CE): cidade que mais votou no PT se divide entre Lula e Ciro
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"Antes, a gente nem sonhava. Hoje, a gente tem acesso a um banco, ao Bolsa Família [atual Auxilio Brasil], e por causa do Lula, né? Foi ele quem liberou o empréstimo para os pobres. Minha vida mudou. Quando o Lula assinou para criar o Bolsa Família, a gente fez o cadastro e até hoje recebe. Se hoje a gente agradece pelo pouco que tem, a gente agradece a ele. Por isso, a gente vota nele".

É assim que a dona de casa Cissa Paes Arraes, 49 anos, sentada em uma cadeira de plástico na sala de sua residência, justifica o seu voto no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas Eleições de 2022. "Nós queremos que ele ganhe no primeiro turno", diz com empolgação ao Terra. Ela, que mora com o marido e uma filha de 6 anos, em Aiuaba (CE), relembra que, em 2018, também votou no então candidato do PT, Fernando Haddad, para presidente da República.

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Cissa está entre os cerca de 7 mil eleitores do município, localizado no Sertão dos Inhamuns, que votaram em Haddad no pleito de quatro anos atrás, atribuindo a Aiuaba o título de cidade cearense mais petista. Em 2018, o Haddad alcançou 91,46% dos votos por lá no segundo turno. Eleito em 2018, o atual presidente Jair Bolsonaro (PL) foi derrotado em todos os municípios do Estado. Em Aiuaba, recebeu o apoio de apenas 8,54% dos eleitores.

Foto: Marcela Coelho / Redação Terra

"E eu creio que esse ano vai ser do mesmo jeito. A cidade é muito petista, mas acredito que [no 1º turno] quase metade da população também vai votar no Ciro [Gomes, candidato do PDT]", opina o cuidador de idosos e estudante de enfermagem Leandro Ferreira de Oliveira, 30 anos, enquanto aproveitava a sombra de uma árvore no calor de 36ºC que a região registrava.

A 433 km da capital Fortaleza, Aiuaba tem uma população estimada de 17.584 habitantes, de acordo com dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2021. Ao som da programação da rádio da cidade, as ruas tranquilas e bastante arborizadas só ganham mais movimento, segundo os moradores, no "Dia da Feira", que geralmente acontece às terças-feiras de manhã, no centro. Aos finais de semana, as pessoas também costumam se reunir na praça que fica em frente à Igreja Matriz de Nossa Senhora do Patrocínio.

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Apesar da fama de ser um município "muito petista", as casas, praças e comércios não trazem nenhum indicativo de quem é o candidato escolhido para presidente pelos aiuabenses neste ano. A reportagem só encontrou uma residência na cidade que tinha na fachada uma bandeira com os rostos de Lula; Elmano, candidato do PT ao governo do Ceará; e Camilo Santana, candidato ao Senado pelo mesmo partido.

"Quando tem eleições para prefeito e vereador, aí você vê muitas casas com bandeiras, adesivos nas motos, carros. Para presidente aqui é muito difícil achar uma bandeira, alguma coisa. Às vezes, tem uns adesivinhos, mas coisas pequenas", explica Leandro.

No entanto, não é preciso rodar muito pela cidade para encontrar moradores que vão votar no candidato do PT no dia 2 de outubro e que esperam novamente um alto percentual de votos no partido. Além de Cissa, o mototaxista Ediumberto Alves dos Santos, 44 anos, é um deles.

Esperando a próxima corrida em um banquinho na principal praça do centro da cidade, ele revela que vai votar em Lula já no primeiro turno e, em caso de segundo turno, também repetirá o voto, se o candidato estiver disputando.

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"Ele foi bom. Hoje o banheiro que eu tenho lá em casa foi feito pelo Lula. Foi na época do Lula", conta emocionado.

Francisca Alves, 43 anos, funcionária pública, é outra moradora do município que pretende apoiar o petista. "Eu votei no Lula quando ele se elegeu pela primeira vez. [Na gestão dele] a classe baixa, média, foi muito bem assistida. O que já não posso dizer agora na época do Bolsonaro, que é um despreparado", argumenta enquanto caminha em direção ao trabalho com uma sombrinha para se proteger do sol. 

Moradores divididos

Na mais recente pesquisa Ipec (ex-Ibope) de intenção de voto para presidente da República entre os eleitores do estado do Ceará, divulgada no dia 22 de setembro, Lula lidera a disputa com 63%. Em seguida, aparece Bolsonaro, com 18%, e, em terceiro, Ciro Gomes, com 10% das intenções de voto.

Ciro pode até não ter conquistado a preferência da população brasileira, mas na cidade de Aiuaba é ele quem ocupa um dos lados da polarização política. Em 2018, também foi assim. No primeiro turno da disputa, Haddad venceu na cidade com 55,31%, mas Ciro estava na briga e conquistou 37,76% dos votos. Bolsonaro, por outro lado, só teve 5,17%.

"O Ciro é cearense. Aqui o povo também é Ciro, porque a gente conhece ele desde quando foi governador", diz o cuidador de idosos Leandro. "Para a cidade, ele traria melhorias, principalmente na questão da aposentadoria rural", destaca.

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Na eleição passada, Leandro conta que votou em Ciro no primeiro turno e, dessa vez, só não vai votar nele novamente pensando no voto útil. "A gente sabe que ele não vai ter os votos suficientes para ir para o segundo turno, então, eu prefiro ir de Lula. Mas, eu não preferia o Lula, eu preferia o Ciro, porque os projetos dele são mais bem planejados."

Em uma rua bem sossegada já mais afastada do centro, em frente ao portão de casa, a professora Kecivânia Furtado Bezerra, 42 anos, afirma que as Eleições para presidente no município são bastante contraditórias, mas que ela não abre mão de votar no pedetista. "O Ciro a gente conhece já lá de Sobral", afirma.

"Eu acredito muito nas propostas dele. O Ciro mostra a proposta e a solução. O Lula e o Bolsonaro mostram proposta, mas não explicam como vão fazer."

Segundo Kecivânia, se Ciro não chegar ao segundo turno, ela pretende anular o voto. "Tanto Lula quanto Bolsonaro já tiveram a oportunidade deles. Lula já teve oportunidade, eu já votei em Lula. Inclusive votei com muito carinho, voto por amor, por dedicação. Mas hoje não voto mais no Lula. E em Bolsonaro nunca votei."

"A gente acreditou que o Lula naquele tempo faria o melhor para o Brasil e ele teve a oportunidade dele. Eu não vou dizer que ele não fez nada. Ele fez. Mas poderia ter saído de mãos limpas. Ele poderia ter saído dessa sem massacrar tanto o povo. Ele fala tanto em fome, miséria, em ajudar os pobres. E que, na verdade, ele não tem essas propostas para que a gente realmente possa ser ajudado da forma que deveria ser ajudado", considera.

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Por que não Bolsonaro?

Um dos motivos que levam os moradores de Aiuaba a não apoiarem Bolsonaro nas eleições deste ano é a alta da inflação. Em abril, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) atingiu a taxa mais alta para o mês em 26 anos e ultrapassou a marca de 12% em 12 meses, o maior nível desde outubro de 2003.

"Ele deixou muito a população sofrer. O gás de cozinha ficou muito alto para nós e até hoje está alto, por isso eu não voto nele", explica a dona de casa Cissa, que atualmente vive da agricultura e do dinheiro que recebe do Auxílio Brasil.

Foto: Marcela Coelho / Redação Terra

Ediumberto também opina sobre o motivo que leva o presidente a não ser sua opção de voto: "Subiu tudo em casa, comida... A lata de óleo aqui estava a R$ 14. Com as coisas subindo direto, o povo ia passar fome. As coisas sobem e o dinheiro não tem valor. Minha sorte é o mototáxi", afirma ele, que também cita o aumento do combustível, essencial para continuar com o seu trabalho. "Eu coloco gasolina todo santo dia".

Outra preocupação do mototaxista é quanto à manutenção do valor do Auxílio Brasil. "O povo comenta que ele [Bolsonaro] deu R$ 600 para pegar o povo. Aí quando pegar o povo, ele vai diminuir lá para baixo", afirma Ediumberto.

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O Auxílio Brasil de R$ 600 vai até o fim do ano e a versão do Orçamento de 2023, enviada ao Congresso no fim de agosto, prevê o benefício no valor de R$ 405 para o próximo ano. No entanto, em mensagem aos parlamentares, Bolsonaro pediu apoio do Congresso para alterar o teto de gastos e manter o valor de R$ 600.

A professora Kecivânia declara que não acredita no atual presidente. "[O Bolsonaro] acho que não é feliz em muitas palavras que ele diz. E isso machuca. Eu acho que ele não tem amor à nação, não tem respeito à maioria dos brasileiros. Eu acho que ele não sabe nem o sentido de ser brasileiro. Um povo tão sofredor, um povo tão criativo, um povo tão sábio, um povo tão trabalhador que ele não valoriza", conclui.

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Essa é uma das reportagens da série especial de eleições do Terra Votos pelo Brasil. Eleitores de nove cidades brasileiras, que se destacaram nas Eleições de 2018 e nos últimos quatro anos, contam suas percepções sobre o País e expectativas para 2 de outubro. Novas reportagens serão publicadas diariamente ao longo desta semana.

Fonte: Redação Terra
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