Datena, Marçal e a cadeirada

Professor comenta episódio em que influenciador foi agredido durante debate entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo

16 set 2024 - 11h52

O eleitor/cidadão foi, mais uma vez, brindado com um debate não apenas de baixo nível propositivo, com ofensas, fake news e, neste caso, agressão física, com uma cadeirada desferida por José Luiz Datena (PSDB) contra Pablo Marçal (PRTB). Uma parte da audiência lamentou a cena e outros torcem para o quanto pior, melhor!.

Pablo Marçal deixou debate da TV Cultura com suspeita de fraturas na região torácica
Pablo Marçal deixou debate da TV Cultura com suspeita de fraturas na região torácica
Foto: Reprodução/TV Cultura / Perfil Brasil

Há, inicialmente, que se repudiar todo o tipo de violência, toda a agressão, seja verbal, simbólica e, principalmente, física. A política existe, em larga medida, para que os conflitos gerados no bojo de nossa sociedade sejam resolvidos por meio do diálogo, dentro das instituições e à luz das leis, da legalidade, no Estado Democrático de Direito. A violência e a coerção física legítima são monopólios do Estado e usada em situações muito específicas. Na democracia, devem prevalecer, como gostava de asseverar Florestan Fernandes, a força das ideias e não as ideias da força.

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O episódio da cadeirada - entendido sob a perspectiva da racionalidade - nos levaria à uma conclusão lógica: além do processo criminal por agressão, Datena deveria ser expulso do partido e se retirar da disputa eleitoral. Não seria surpresa, contudo, se, nas novas rodadas de pesquisa de intenção de voto, Datena cresça e Marçal possa recuperar a força que perdeu nas últimas semanas. Novamente, Marçal - um provocador profissional - conseguiu o que queria: cortes para suas redes sociais e, quem sabe, uma diminuição de sua rejeição que já ultrapassou a de Boulos.

Outro elemento - quando lidamos com a racionalidade - é encontrar, cientificamente, repetições e regularidades, nos fenômenos. Vejamos três situações bem conhecidas: Bolsonaro foi esfaqueado; Trump foi alvejado por um disparo de fuzil; e, agora, Marçal foi agredido com uma cadeirada. Nestes casos, observa-se que o agressor de Bolsonaro foi considerado inimputável e encontra-se internado; o atirador que acertou a orelha de Trump foi morto pelas forças de segurança e a investigação prossegue e Datena, por sua vez, afirmou que perdeu a cabeça e que não deveria ter desferido a agressão, mas que, infelizmente, o fato ocorreu e que aguardará as consequências. Com relação ao perfil dos agredidos há semelhanças nos métodos que usam para fazer política e nos seus discursos?

Bolsonaro, Trump e Marçal, os três, de diferentes formas, em maior ou menor grau, entendem como funcionam as redes sociais e o engajamento alicerçados sobre os sentimentos: ódio, medo, angústia; são excepcionais produtores de memes, lacração e, não raro, abundam em suas falas fake news, pós-verdade, negacionismo e teorias da conspiração. Tais comportamentos são meticulosamente criados pelos "engenheiros do caos" e impulsionados pelos algoritmos das redes sociais e eletrizam uma sociedade polarizada, calcificada e dividida em grandes bolhas.

Mensagens extremistas são recebidas em bolhas, nas quais se encontram aqueles que compartilham os mesmos valores e ideologias políticas e, ainda, são validadas pelo fenômeno do viés de confirmação. Nestes casos, enormes grupos de opinião se formam e não estabelecem nenhum diálogo fora da bolha, ou seja, o debate público e a democracia são enfraquecidos. Mas, para além das bolhas, os discursos destes atores políticos encontram, ao que tudo indica, aqueles chamados "lobos solitários", indivíduos sem pertencimento a grupos específicos, que, por algum motivo, racional ou não, sentem-se tocados pela mensagem transmitida e partem para a violência física, buscando eliminar o que consideram um "inimigo".

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Por fim, novamente, repudie-se todo tipo de violência. Marçal, que foi hospitalizado, que logo esteja plenamente recuperado. E que Datena seja responsabilizado pelos seus atos. Esse é um dos mais tristes capítulos de nossa história política. Será que aprenderemos algo?

* Rodrigo Augusto Prando possui Graduação em Ciências Sociais (1999), Mestrado em Sociologia (2003) e Doutorado em Sociologia (2009) pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Atualmente, é Professor Assistente Doutor da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do site Perfil Brasil

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