“E aí, como é que está essa luta?” Foi essa a primeira frase dita por Luciana Genro, candidata do PSOL à Presidência da República, ao chegar na tarde desta quinta-feira à ocupação Chico Mendes, do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), no Morumbi, em São Paulo. A pergunta foi direcionada a Simone Sousa, uma das coordenadoras estaduais do MTST e responsável pela ocupação. “Estamos na luta. Com esperança de vencer”, respondeu ela.
Cerca de 1.200 famílias de baixa renda do Jardim Colombo, da Vila Praia e de Paraisópolis ocupam desde sexta-feira o terreno, uma área pública de 30 mil metros quadrados entre o cemitério Gethsemani e dois condomínios. De acordo com o MTST, o terreno é uma Zona Especial de Interesse Social (Zeis) e, portanto, deve ser destinado à construção de moradias populares.
“É um mar de barracas”, espanta-se Luciana. Para a candidata, as ocupações são resultado do aumento do deficit habitacional. “A decisão de ocupar um terreno não é uma escolha, é uma imposição de uma realidade muito cruel, onde os governos são omissos e não desenvolvem programas que possibilitem que as pessoas de baixa renda tenham acesso à moradia”, disse.
Aluguel
As famílias que ocupam o terreno afirmam que não têm mais condições de pagar aluguel. A doméstica Maria Gorette dos Santos, 55 anos, conta que paga R$ 500 por mês para viver em um “barraco” do Jardim Colombo. A renda da família, formada por ela, o marido e dois netos pequenos, é de R$ 1.100 mensais. “Está dormindo aí?”, pergunta Luciana Genro. “Tem que dormir, fazer o que. A gente trabalha de dia e vem dormir à noite”, responde Gorette. E então a candidata se despede: “Tem que lutar, né. Parabéns, a senhora é uma guerreira”.
Uma das propostas de Luciana é a criação de instrumentos que possam controlar os reajustes de aluguel de forma mais eficaz. “Precisamos de uma lei do inquilinato, que coíba o aumento abusivo dos aluguéis. Cada vez mais famílias são expulsas de suas casas porque não conseguem continuar pagando aluguel”, declarou a candidata. “Essas famílias são empurradas para as periferias, o que faz com que elas tenham uma qualidade de vida ainda pior, porque o transporte público e os serviços públicos de saúde e educação também são precários.”
A autônoma Maria Luiza Macedo da Silva, 58 anos, que também faz parte da ocupação, disse que paga R$ 450 no aluguel de “um cômodo”, onde moram ela, um filho deficiente e dois netos. Ela diz que, com a renda que tem, que “varia muito”, mal dá para pagar o aluguel e as contas de água e de luz – e comer. “A gente está aqui, não é porque a gente quer, é porque a gente precisa. Se a desigualdade não fosse tanta a gente não precisaria estar aqui”, disse.
Assim como Maria Gorette, Maria Luiza recebeu de Luciana Genro os “parabéns pela luta”. Nenhuma das duas, no entanto, soube dizer quem era a candidata que estava ali. Pesquisa Datafolha divulgada ontem mostra Luciana com 1% das intenções de voto.
Minha Casa, Minha Vida
Há cerca de dois meses, Luciana Genro se reuniu com lideranças do MTST e incorporou propostas do movimento ao seu programa de governo. A candidata propõe, por exemplo, a reformulação do programa Minha Casa, Minha Vida.
“O programa terceirizou para as empreiteiras a política habitacional do País, porque são elas que definem onde, como e quando construir. O Minha Casa, Minha Vida Entidades é muito melhor, porque são as entidades do movimento que constroem e coordenam a construção da habitação popular. Precisamos que o movimento popular de luta pela moradia tenha um maior protagonismo nas decisões e na implantação da política habitacional do País”, afirmou.
A candidata disse que teve a “honra” de ser a única candidata citada pelo MTST em sua declaração sobre as eleições. “Evidentemente que o movimento não me apoia, porque, como movimento social, não pode se vincular a uma candidatura. Mas foi o meu nome que o movimento apontou como um dos candidatos que melhor representa as propostas que o vem defendendo.”
Hostilidades
Os moradores da ocupação Chico Mendes fizeram na noite desta quinta-feira um protesto em frente ao prédio vizinho. Os sem-teto afirmam que estão sendo hostilizados pelos moradores dos condomínios.
“Eles jogam pedras, garrafas, xingam a gente de vagabundos”, disse a coordenadora Simone. “Graças a Deus ninguém se machucou. A gente orienta o pessoal a não dar ouvidos, mas, se alguém se machucar, não sei como vou conseguir segurar esse povo. Essa é uma preocupação que a gente tem”, continuou.
A Prefeitura de São Paulo ainda não tem um plano para a nova invasão, mas afirma que vai tentar negociar a desocupação de forma "amigável". De acordo com a Secretaria Municipal da Habitação, os invasores não têm prioridade nos programas habitacionais.
Para Luciana Genro, contudo, a ocupação tem chances de ser "vitoriosa". "O Estatuto das Cidades determina que terrenos que estejam há mais de cinco anos sem cumprir sua função social devem ser desapropriados", disse.
O terreno estava desocupado havia anos, mas, em 1989, um deslizamento de terra matou 14 pessoas da favela Nova República, ali instalada. A coordenação do MTST afirma que sabe do histórico e que barracas instaladas em áreas de risco serão removidas. “A Defesa Civil esteve aqui e explicou o que aconteceu lá atrás. A orientação é para não colocar barraca no morro”, disse Simone.