Esta reportagem faz parte de uma série de entrevistas feitas pela BBC Brasil com três dos candidatos mais bem colocados nas pesquisas para a Prefeitura de São Paulo. Foram entrevistados João Doria (PSDB), Fernando Haddad (PT) e Luiza Erundina (PSOL). Convidados, Celso Russomanno (PRB) e Marta Suplicy (PMDB) negaram os pedidos de entrevista. Major Olímpio (SDD) teve problemas de agenda.
João Doria começa falando de futebol. Durante um compromisso de campanha no Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, diz que joga uma "pelada" toda semana.
O candidato do PSDB à prefeitura da capital paulista deixa a mesa que divide com representantes da Força Sindical para contar sua história. De pé, em meio ao público, apresenta-se como filho de deputado federal cassado pelo golpe militar de 1964.
Diz que João Agripino Doria era um nordestino "orgulhoso de sua terra". Um baiano que se mudou para o Sudeste e venceu, tornando-se publicitário de sucesso. Lembra também do "período mais agudo de sua vida" quando, no exílio, o salário do pai como professor da Universidade de Sorbonne, em Paris, era menor que as despesas da família.
O tucano conta que, de volta ao Brasil, começou a trabalhar aos 13 anos, em uma agência onde seu pai tinha sido diretor. "Há 45 anos sou trabalhador, com muito orgulho." Uma salva de palmas no auditório.
Com a oratória afiada em anos como apresentador de TV, o empresário, que lidera as pesquisas de intenção de voto, arranca risos e sinais de aprovação dos sindicalistas.
Reforça o mote de campanha ao afirmar que é gestor, e não político. Diz que irá doar o salário de prefeito e não buscará eventual reeleição. Por ter bom patrimônio, afirma, não precisaria se envolver com corrupção. Fala em gerir a capital com eficiência de empresa, revendo aplicação dos recursos para saúde e privatizando o estádio Pacaembu e o autódromo de Interlagos.
"O histórico dele é bom, de onde veio e onde chegou. O lado trabalhador é muito positivo", diz Adenaldo Ferreira, um dos diretores do sindicato, após o discurso.
Apesar dos sinais de concordância, a postura de Doria não agrada a todos. Parte da plateia critica sua tentativa de se caracterizar como alheio à política.
"O cenário político tem muitos erros, mas devemos corrigir, não negar tudo. Não podemos achar que eliminar a política da história da humanidade vai resolver. Todos aqui somos agentes políticos", afirma Maria Nogueira, outra diretora do sindicato.
Três horas de sono
Entre um compromisso e outro, Doria aceitou conversar com a BBC Brasil por telefone enquanto se deslocava de carro pela capital paulista.
O empresário diz que dorme três horas por noite "há muitos anos" devido ao excesso de trabalho - o que também costuma citar no programa eleitoral.
"Não recomendo a ninguém, mas essa é a forma que utilizo para ser produtivo e muito determinado."
Disse ainda frequentar mercados da cidade, como os de Pinheiros e da Lapa, e descreve encontros com chefes de cozinha em busca de produtos orgânicos. "(Os mercados) têm vida e um coração pulsante muito interessante, que reflete o sentimento da cidade de São Paulo."
Propostas
Entre suas propostas, João Doria promete manter e ampliar medidas de gestões anteriores, como o Centro de Educação Unificada (CEU). Por outro lado, destaca que irá revogar imediatamente a redução da velocidade máxima para veículos nas marginais, marca da gestão Fernando Haddad (PT).
"Vamos alterar a velocidade nas marginais na semana seguinte à posse. Vamos fazer o que o código de trânsito já prevê: vias expressas de 90km/h, 70km/h e 60km/h."
A ideia foi a mais aplaudida no ato de campanha no Sindicato dos Metalúrgicos, quando o empresário negou que haja relação entre velocidade e aumento de acidentes - principal justificativa da gestão atual para a medida.
Questionado pela BBC Brasil sobre as 315 mortes a menos que o prefeito Fernando Haddad associa à medida, o candidato desconversa. "Não haverá genocídio. Vamos fazer o que a prefeitura não fez: programas de educação de trânsito usando rádio, televisão, internet e escolas públicas para que as pessoas compreendam e respeitem as regras."
Outro projeto de Doria é ampliar a educação em tempo integral. "Para isso, vamos ampliar os CEUs porque acho uma ideia boa. Esse espaço inclui cultura, esporte e ainda vamos servir cinco refeições por dia."
Sempre que pode, ele reafirma que não é político e que não fará gestão pensando na reeleição. "Sou gestor e empresário, embora respeite os políticos. Não vou começar meu primeiro dia pensando como vou ser reeleito, mas em como serei um bom prefeito."
Diz que pretende fazer um mandato "padrão Poupatempo", programa do governo Geraldo Alckmin (PSDB), seu padrinho político. "Vamos fazer o serviço com eficiência e rapidez, além de trabalhar em dobro."
Só João
Em agendas públicas e entrevistas, a exemplo do ato com sindicalistas, Doria tem procurado se afastar da imagem de candidato de elite.
Na conversa com a BBC Brasil, diz que passou por dificuldades na vida e "ralou muito" para chegar onde está. Seus assessores e funcionários o chamam de João, como também é apresentado nos jingles de campanha.
Questionado sobre a relação de sua história com a de pais de família que vivem com um salário mínimo, Doria diz que respeita a todos.
"Eu vejo sem discriminação. Eu nunca discriminei os pobres nem os ricos. Não há o bem ou mal. Não há o rico ou o pobre no ponto de vista da diversidade. Temos que melhorar a qualidade de vida no ponto de vista da cidade."
Ele diz que não quer "socializar a cidade pela saúde e pela pobreza", mas "pela riqueza e oportunidade".
"Nossa gestão vai ser feita de fora para dentro, priorizando bairros periféricos que circundam a cidade para oferecer o que precisam prioritariamente: oportunidade. Na saúde, educação, habitação, transporte, segurança pública, emprego e empreendedorismo."
Campos do Jordão
Nas últimas semanas, um vídeo de João Doria viralizou nas redes sociais após ele ser entrevistado pelo jornalista César Tralli durante o "SPTV", da Rede Globo.
O jornalista perguntou por que Doria não devolvia um terreno público mesmo após decisão da Justiça nesse sentido. O candidato explicou que se tratava de uma viela sanitária e que pagou por ela. Dias depois, devolveu o terreno.
"Eu respeito o César Tralli. Ele é um bom jornalista e foi meu funcionário, trabalhou comigo. Conheço bem o César Tralli, mas acho que ele poderia ter dedicado mais tempo aos temas da cidade. Mesmo assim, não faço nenhuma condenação a ele", disse.
Antes de encerrar a entrevista, a BBC Brasil indagou Doria sobre uma reportagem publicada em maio de 2005 pela Veja São Paulo, que relata que ele mandava seus funcionários limparem sapatos de hóspedes de sua casa em Campos do Jordão.
"Não, não. Vamos falar de coisas sérias. Estamos em campanha. Vamos falar de coisas sérias. Nunca aconteceu. Vamos falar de coisas sérias. Falar de temas da cidade. Obrigado, viu? Um abraço." E desligou.