O que explica a baixa adesão aos atos pró-Lula e a favor de Bolsonaro

Participação reduzida no 1º de Maio reflete ausência de agenda positiva, beligerância na política e falhas na organização dos atos, apontam especialistas ouvidos pelo 'Estadão'

2 mai 2022 - 22h02
(atualizado em 3/5/2022 às 07h39)
Lula durante ato realizado em São Paulo
Lula durante ato realizado em São Paulo
Foto: Ronaldo Silva / Futura Press

O esvaziamento dos atos do 1.º de Maio, com a presença do presidente Jair Bolsonaro (PL) e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), resultou da falta de uma mensagem positiva para o eleitor, do desgaste da beligerância na política e do desarranjo na organização, dizem especialistas ouvidos pelo Estadão. As redes sociais refletiram também a baixa adesão nas ruas, e os engajamentos no ambiente digital ficaram aquém dos registrados em outros atos tanto à direita quanto à esquerda.

Os discursos dos eventos se voltam mais para o passado do que para o futuro, disse o cientista político Marco Antonio Teixeira. Bolsonaro, por exemplo, endossou manifestações em Brasília e São Paulo contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e em favor do deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado pela Corte e perdoado pelo presidente. Lula fez discurso focado em sua base mais fiel, a sindicalista.

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"A única possibilidade que vejo em levar ou manter o povo na rua é oferecer esperança, possibilidades, sobretudo naquilo que é mais caro hoje para sociedade hoje. De um lado, pensar no futuro, conter a precarização das condições de vida, passando pelo emprego e controle de preços. Do outro, ter um mínimo de civilidade. Talvez o que o povo queira é um pouco mais de respeito, além de perspectiva de futuro", disse Teixeira, que é professor do Departamento de Gestão Pública da FGV-SP.

Para ele, as retóricas dos líderes das pesquisas de intenção de voto na disputa pelo Planalto neste ano sinalizam hoje para uma candidatura com seguidores fanáticos e outra marcada por gafes quase cotidianas, em referência a Bolsonaro e Lula, respectivamente. "E foi um domingo ensolarado, bonito e absolutamente convidativo a qualquer tipo de manifestação cívica", disse. De acordo com Teixeira, ao menos desde 2013 as redes sociais conseguiram mobilizar as ruas, mas agora as plataformas repercutem menos nas ruas e mais de forma endógena, ao promover debate mais centrado nos internautas.

MOBILIZAÇÃO

Com as ruas vazias, as redes também estiveram mais calmas. No YouTube, por exemplo, o vídeo mais assistido do 7 de Setembro, quando Bolsonaro xingou ministro do STF, foi uma cobertura geral que teve 3,5 milhões visualizações. A publicação de 1º de Maio mais vista, também de desdobramentos do dia, acumulou 1,4 milhão (40% do líder de visualizações do ato anterior).

Nas redes sociais, de forma mais ampla, o 1º de Maio gerou menos de 30% de menções do que o 7 de Setembro. Anteontem, 322 mil citações aos eventos foram feitas ante os 1,18 milhão do Dia da Independência, segundo dados levantados pelo Bites a pedido do Estadão. "É uma manifestação muito menos relevante, que mostra muito menos poder nas ruas", disse André Eler, diretor-adjunto do Bites.

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Leonardo Nascimento, coordenador do Laboratório de Humanidades Digitais, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), que monitora articulações da extrema-direita no Telegram, apontou que os atos revelam como há interdependência entre o mundo real e o digital. De acordo com ele, houve uma maior movimentação nas plataformas digitais nos dias antecedentes aos atos.

No caso do Telegram, a maior troca de mensagens e de campanhas de financiamento em favor dos atos pró-Bolsonaro se deram nos dias antecedentes ao evento. Houve pedido de apoio para a mobilização de militantes em diferentes regiões do País com ônibus fretados, mas, ainda assim, a mobilização foi inexpressiva. "Há uma ação de muitas campanhas digitais porque eles querem estar com campanhas na rua, e talvez não estejam conseguindo", disse Nascimento. "E, por não estarem conseguindo, estão investindo em algo mais barato que são as plataformas digitais."

ORGANIZAÇÃO

Petistas próximos a Lula minimizaram o fato de o ato não agregar público significativo. Primeiro, porque dizem que não era um evento sobre o ex-presidente, mas a comemoração típica de 1.º de Maio. Com isso, afirmam que não é possível mensurar o tamanho do apoio ao ex-presidente, uma vez que o evento foi organizado pelas centrais sindicais. Também disseram que as pessoas perderam o hábito de ir a atos políticos durante a pandemia. Nos últimos dois anos, o evento das centrais foi online.

Segundo fonte próxima a Lula, o ex-presidente já imaginava que não seria um evento cheio, o que o levou a atrasar sua chegada. Sindicalistas presentes culparam ainda o local escolhido, a Praça Charles Miller, na frente do Estádio do Pacaembu. O local não tem estação de metrô nem trem próximas, disseram.

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Aliados do presidente Jair Bolsonaro, mesmo diante da baixa adesão nos eventos em Brasília e São Paulo, procuraram manter o discurso otimista. Para o deputado federal Pastor Marco Feliciano (PL-SP), as ruas mostram que o presidente está, "de fato, na frente na corrida presidencial".

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