Para analistas, combate a fake news vai além da eleição

Fluxo de desinformação nas redes sociais deve continuar alto, afirmam especialistas ouvidos pelo 'Estado'

4 nov 2018 - 05h11
(atualizado às 11h46)

As eleições deste ano foram marcadas por desinformação, em grande parte impulsionada nas redes sociais. Esta é a avaliação de analistas ouvidos pelo Estado. O Projeto Comprova, consórcio de 24 veículos brasileiros do qual o Estado fez parte, verificou 147 boatos recebidos durante pouco mais de dois meses de eleição. Destes, a esmagadora maioria (91,8%) se mostrou falsa.

O volume de desinformação surpreendeu Claire Wardle, diretora do First Draft, organização internacional que deu origem ao Comprova. Ela já havia trabalhado com o fenômeno nas eleições presidenciais da França, e agora tem projetos de atuar nos pleitos na Nigéria, Indonésia, Índia, Argentina e Uruguai. "Minha impressão é que, definitivamente, havia mais desinformação no cenário brasileiro. Na França, recebemos 660 mensagens do público em nosso site, e no Brasil foram 67 mil mensagens no WhatsApp", afirmou.

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Whatsapp foi uma das principais plataformas de difusão dessas informações falsas
Whatsapp foi uma das principais plataformas de difusão dessas informações falsas
Foto: Thomas White / Reuters

O trabalho dos "checadores" na imprensa começou há alguns anos, em alguns veículos pontuais. Mas, segundo o editor do projeto, Sérgio Lüdtke, se estabeleceu como um fenômeno essencial no jornalismo. Isso porque, explica, a amplitude e o fluxo que a desinformação atingiu com as redes sociais foram enormes neste ano e não devem diminuir.

"Arrisco dizer que teve mais (mentiras) que nas eleições passadas, porque tem mais canais de comunicação, que espalham muito mais facilmente e rapidamente", disse Lüdtke. Para ele, o maior feito do projeto foi fazer com que as pessoas soubessem que há, de fato, notícias falsas que circulam nas redes sociais.

De acordo com Lüdtke, a escolha de boatos que iriam ser checados tinha que seguir quatro critérios: ser sobre a eleição presidencial; nada que saísse da boca de uma fonte ou um político; não tivesse origem em um veículo de mídia; e que já tivesse tido um alto teor de viralização, para que o boato não fosse promovido com a checagem.

A maior parte dos rumores checados pelo Comprova era a respeito da chapa petista — o candidato à Presidência Fernando Haddad e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foram personagens de 41,9% das verificações publicadas ao longo do primeiro e segundo turnos. O presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), também protagonizou muitos rumores na internet — 36% das checagens do Comprova foram sobre ele.

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"As mídias sociais catalisaram o processo de desinformação, mas não se sabe qual o impacto. Ninguém pode afirmar que o novo presidente foi eleito por desinformação", afirma Ariel Kogan, diretor do IT&E (Instituto Tecnologia e Equidade), uma organização que desenvolve projetos na área de tecnologia.

E a desinformação não termina com as eleições. O principal desafio para jornalistas agora, diz Wardle, é identificar os rumores que circulam no WhatsApp e distribuir conteúdo de qualidade dentro da mesma plataforma. Para isso, a participação do público é fundamental - no Estadão Verifica, por exemplo, leitores podem enviar dicas de checagem pelo número (11) 99263-7900.

Para Kogan, além de iniciativas como o Comprova, é necessário educação quanto ao uso das novas mídias. "As pessoas não podem criar, consumir e disseminar desinformação", afirma. /COLABOROU VÍTOR MARQUES

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