Líderes evangélicos que apoiam o presidente Jair Bolsonaro (PL) receberam com ceticismo a carta-compromisso lançada por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para esse segmento. Entre os "cabeças" do pentecostalismo bolsonarista, a percepção é que o documento "não colou" e não tem capacidade para converter votos do público religioso. "Ele escreve com a mão e apaga com o cotovelo", afirmou ao Estadão o deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), membro da Assembleia de Deus.
Divulgada nesta quarta-feira, 19, a carta foi gestada para reforçar o compromisso de Lula com a liberdade religiosa. O petista nega que fechará igrejas e acena com participação de evangélicos em eventual governo. "Envio-lhes esta mensagem em respeito à Verdade e ao apreço que tenho a esse Povo crente no Verdadeiro Deus da Misericórdia e a seus dedicados pastores e pastoras. Se Deus e o povo brasileiro permitirem que eu seja eleito, além de manter esses direitos, vou estimular sempre mais a parceria com as Igrejas no cuidado com a vida das pessoas e famílias brasileiras", diz o documento.
Embora as igrejas evangélicas abriguem fiéis de variadas opiniões políticas, como mostrou esta matéria do Estadão, todos os líderes mais populares dessas igrejas têm alinhamento político com o presidente Jair Bolsonaro. Nas redes, pastores que somam milhões de seguidores divulgam ações do governo, pedem voto no presidente e convocam até mesmo jejuns em apoio à sua reeleição.
Cavalcante criticou o que chamou de "hipocrisia" do candidato do PT à Presidência. O deputado apontou pautas morais que, segundo ele, fragilizam a imagem de Lula diante do público evangélico.
"Acho que a carta revela ao povo brasileiro a hipocrisia deslavada do Lula; agora mudou de opinião? As redes sociais não permitem ninguém esquecer as declarações recentes dele a favor do aborto e contra a família", afirmou.
O pastor Silas Malafaia afirmou que Lula "mente descaradamente". Em vídeo publicado nas redes sociais, o religioso destacou declarações do petista sobre as chamadas pautas de costumes. Em abril deste ano, o ex-presidente disse que as pautas de "família" e de "valores", como propagadas por Bolsonaro, são "atrasadas" em termos de governo. "Para ele e para o partido dele, moderno é homem com homem e mulher com mulher", afirma Malafaia.
O deputado federal Marco Feliciano (PL-SP) publicou vídeo apontando o que chamou de "cinismo" por parte de Lula. Ele usou trechos semelhantes aos divulgados por Malafaia para criticar a declaração do petista a favor da ampliação do direito ao aborto. "As ovelhas de Deus foram tratadas como gado pronto para o abate no açougue de satanás, chamado partido das trevas, liderado pelo endemoninhado 'mor' chamado Barrabás, codinome Lula", diz Feliciano.
A carta-compromisso foi lançada em evento com evangélicos em São Paulo na terça-feira, 19. Estavam presentes pastores de perfil progressista e políticos que são evangélicos, como Marina Silva (Rede-AP) e a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA). "A carta vem suplantar as fake news, e por isso é muito necessária. Todo mundo sabe que o Lula não vai fechar igrejas", disse Eliziane Gama, na saída do evento.
Após a leitura da carta, Lula elogiou o trabalho social das igrejas evangélicas no País e voltou a desmentir que ele, se eleito, obrigaria crianças a utilizar banheiros comuns para homens e mulheres. "Gente, eu tenho família, tenho filha, netas, bisnetas, só pode ter saído da cabeça de satanás a história de banheiro unissex", disse o petista.