Elas ainda estão distantes de refletir a composição demográfica da população geral, mas na próxima legislatura serão - pelo menos numericamente - duas vezes mais fortes que na atual.
Na maior cidade do país, São Paulo, 11 mulheres serão empossadas como vereadoras em janeiro de 2017 - mais que o dobro das cinco atuais.
Elas equivalem a 20% da Casa, bem acima da média nacional, que é de 13,5%.
Entre as capitais, só em Natal e Curitiba a representatividade é proporcionalmente maior: 28% e 21%, respectivamente. As capitais do Rio Grande do Norte e Paraná também tiveram aumentos expressivos na eleição de mulheres neste ano.
Entre as 26 capitais brasileiras, o número de mulheres subiu em dez.
Ao desafio de serem ouvidas em um ambiente ainda dominado pela voz masculina, as vereadoras paulistanas precisam superar outro obstáculo: vencer diferenças ideológicas bastante acentuadas.
"Temos que fazer um esforço para isso. Pretendo procurar as demais para ver se podemos articular projetos juntas, especialmente no que diz respeito à violência contra a mulher. Assim, elas podem pressionar seus correligionários para que a gente consiga passar essas pautas", disse Sâmia Bonfim, eleita pelo PSOL.
'Virada?'
Ela é uma das cinco "marinheiras de primeira viagem" entre as 11 eleitas. A BBC Brasil conversou com quatro delas.
"A vida das mulheres está acima de qualquer sigla partidária", diz Janaina Lima, do Partido Novo. Para ela, unir forças é a melhor estratégia para alcançar "melhores resultados" nesse sentido.
"Acho que é possível fazer essa articulação. Às vezes o propósito vai ser o mesmo, mas talvez os caminhos para chegar até ele sejam diferentes. Mas eu farei a minha parte para superar as diferenças ideológicas e fortalecer os objetivos em comum", afirmou Aline Cardoso, do PSDB.
Adriana Ramalho, também do PSDB, diz que "diálogo é sempre o melhor caminho" e que "na hora de visar à defesa da mulher, vamos dialogar sem colocar ideologia partidária e sem ser tão radical."
As novatas eleitas consideram que a ampliação da bancada feminina pode ser considerada um "momento de virada" na política local.
"Isso é uma consequência de vários esforços que estão vindo da sociedade. Até alguns homens me disseram: eu quero votar numa mulher. Quando você tem homens que enxergam a necessidade de melhorar essa representatividade, aí o movimento começa a tomar uma força maior", diz Aline Cardoso.
Secretaria das Mulheres
A maioria das vereadoras diz ser contra a ideia do prefeito eleito, João Doria, de fechar a Secretaria das Mulheres - criada pela gestão de Fernando Haddad em 2013.
A pasta, segundo a prefeitura, tem o objetivo de "formular, monitorar e executar políticas públicas para as Mulheres, em especial na área de enfrentamento à violência e promoção da autonomia econômica".
"Tudo isso é custo. Para quê? Gerar status? Prefiro gerar política pública", afirmou ele durante a campanha, ao mencionar pastas que seriam fechadas.
"Eu sou contra. Já pedimos uma reunião e falamos com coordenador da campanha e o vice-prefeito e pedimos que a secretaria seja mantida", afirmou Aline Cardoso, do PSDB.
Já a também tucana Adriana Ramalho amenizou o impacto da possível extinção e disse que o importante será "garantir as políticas públicas" - para ela, a secretaria é apenas "simbólica".
Confira, a seguir, quem são as novas vereadoras paulistanas:
Rute Costa
Dentre as cinco vereadoras novatas, Rute Costa, 49, foi a mais votada, com 33.999 votos. Ela é do PSD (Partido Social Democrático) e recebeu amplo apoio da igreja evangélica Assembleia de Deus.
Rute é filha do presidente da Assembleia de Deus, pastor José Wellington Bezerra da Costa. O irmão dela, pastor Paulo Freire, é deputado federal, e a irmã, Marta Costa, teve três mandatos como vereadora de São Paulo e hoje também ocupa uma cadeira na Câmara dos Deputados.
Na campanha, Rute não direcionou seu discurso para as mulheres. Quando eleita, ela afirmou que irá "representar a igreja na Câmara dos Vereadores".
Entre as principais propostas que pretende levar para a Casa estão desconto de passagens em transporte público durante todo o fim de semana "para que as pessoas possam ir à igreja no sábado ou gozar de momentos de lazer com a família" e a criação de projeto de lei para incentivar creches em bairros.
Adriana Ramalho
Adriana Ramalho, 35, do PSDB, foi a segunda "novata" mais votada para a Câmara, com 29.756 votos. Ela também fará parte da bancada evangélica - que é maior do que a bancada feminina, com 15 representantes.
Mas ressalta: "Eu não sigo uma de bandeira da placa de Igreja. Busco agir com coerência e ética".
Adriana seguiu os passos do pai, Ramalho da Construção, que foi líder sindical na Construção Civil e é parlamentar. "Minhas prioridades serão garantir os direitos trabalhistas, os direitos da mulher e dos idosos", afirmou.
"Uma das minhas propostas é aumentar o número de casas de abrigo na cidade para mulheres vítimas de violência. Além disso, atualmente não é permitido que os filhos adolescentes acompanhem as mães lá e isso é uma barreira para elas, precisamos mudar esse equipamento público. E precisamos também de mais Delegacias Da Mulher que funcionem 24h", pontuou.
Aline Cardoso
Aline Cardoso, do PSDB, tem 37 anos e é a terceira vereadora de primeira viagem com mais votos - teve 25.769.
Também com veia política na família - seu pai é o deputado Celino Cardoso (PSDB), que exerce o sexto mandato no Congresso -, Aline é filiada ao partido desde 1998, mas só agora decidiu concorrer a um cargo político.
"Eu tinha me afastado da política por escolha pessoal, fui mãe, atuei no setor privado. Mas de 2013 para cá ficou claro para mim que a gente precisava de novos líderes", disse.
Entre suas prioridades de propostas estão o combate à gravidez na adolescência e a ampliação de oportunidades de empreendedorismo feminino. "O feminismo não é minha única pauta, mas ele está na minha pauta", disse à BBC Brasil.
Além disso, ela promete defender em seu mandato a simplificação da abertura de empresas, a ampliação de faixas e corredores para ônibus, estímulo ao uso de veículos não motorizados, a ampliação dos CEUS (Centros Educacional Amplificado), entre outras.
Janaina Lima
Janaína Lima, 32 anos, ganhou notoriedade com a participação no movimento "Vem Pra Rua", liderando protestos contra a corrupção e pelo impeachment de Dilma Rousseff.
Eleita com 19.425 votos, ela tem como principal promessa um "mandato anti-corrupção" e prometeu "cortar em 50% a verba do gabinete, abrir mão do regime previdenciário especial, do carro e das demais verbas indenizatórias" para "ser um exemplo de político que serve sem se servir."
À BBC, Janaina diz que seu mandato terá três pilares: "exercer o papel fiscalizador que cabe aos vereadores; apresentar projetos nas áreas de primeira infância; e empreendedorismo."
"Como mulher e mãe - e hoje, política, quero que meu mandato seja um instrumento para aumentar a participação e o engajamento das mulheres na sociedade civil e nos espaços de poder."
Nascida na periferia de São Paulo, Janaina se formou em Direito e promete atuar para melhorar as oportunidades nas regiões mais pobres da cidade. Para isso, ela quer promover programas de capacitação profissional e incluir as matérias de "Empreendedorismo" e "Educação Financeira" nas escolas.
Sâmia Bonfim
Sâmia Bonfim, 27, foi uma das maiores "surpresas" dessa eleição. Ela ficou conhecida por ter participado do "Movimento Passe Livre", contra o aumento da tarifa em 2013 e do movimento feminista no ano passado.
Ela foi a primeira vereadora da história do PSOL a ser eleita na Câmara de São Paulo e credita ao movimento feminista o seu sucesso. Suas prioridades serão o combate à violência contra a mulher, garantia do direito ao parto humanizado e ao aborto legal em todos os hospitais públicos da cidade, entre outros.
"Eu recebi muitos ataques pela condição de ser mulher e candidata feminista. Os mais tranquilos eram de gente que duvidava da minha capacidade, por ser jovem, menina. Mas pela internet era mais pesado, recebi ameaças, comentários dizendo que 'feministas merecem a morte', falando 'que bom que na ditadura estupravam mulheres' e por aí vai".
As expectativas dela para o primeiro mandato na Câmara não são diferentes. Sâmia acredita que terá sua "capacidade questionada o tempo todo".
"Acho que vou sofrer muitos ataques de gente que está há muito tempo lá, oligarquias, setores conservadores, evangélicos. Vou enfrentar uma pedreira. Mas acho que o movimento feminista está muito forte e qualquer tipo de ataque que eu receba vai ter repercussão e uma reação nas redes sociais. O bom é que hoje nenhuma mulher está sozinha."