"Me sinto diminuída", diz a dona de casa Eliane Cardoso da Silva, de 40 anos. Ela saiu cedo de casa, no topo da favela da Rocinha, na zona sul do Rio de Janeiro, para votar em um hotel cinco estrelas à beira da praia do bairro de São Conrado.
Sem rendimento, Eliane, que vive da aposentadoria de invalidez do marido, diagnosticado com câncer linfático há três anos, e do dinheiro do Bolsa Família, conta que "nunca pode sonhar" em se hospedar no local, que já recebeu uma longa lista de celebridades que vai desde o cantor americano Justin Bieber até a seleção brasileira de futebol, durante a Copa do Mundo.
Eliane se diz constrangida em ter que votar em um hotel em que nunca vai poder se hospedar. Ela acrescenta que gostaria de ter sua sessão eleitoral na própria favela onde vive.
Com cerca de 200 mil habitantes, a favela da Rocinha, uma das maiores da América Latina, é vizinha do bairro de São Conrado.
Em uma cidade fortemente polarizada entre asfalto e favela, as eleições são um dos poucos momentos de "democratização" do espaço público, afirmam analistas, em que é possível ver durante todo o dia pobres e ricos misturando-se em seções eleitorais por toda a cidade.
Empenho
A dona de casa cobra maior empenho dos governantes para melhorias na favela. "Falta tudo: escola, creche e saneamento". Ela diz esperar que as autoridades "tirem a UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) do morro" e deem "mais oportunidades para os jovens".
"Desde que a UPP entrou, está tendo muito assalto, muita morte. Não era essa bagunça que está hoje", afirma. "Os jovens estão aí sem fazer nada. Não sabe mais o que fazer, daí entra para a vida do crime, de dinheiro fácil".
Entre as prioridades para a favela, Eliane defende ainda a implantação de um restaurante popular.
"Muitos gente não têm o que comer. Com apenas R$ 1 eles poderiam matar a fome", afirma ela, em alusão ao estabelecimento que serve refeições completas por esse valor.
Com cinco filhos e cinco netos, ela diz que sua rotina se limita a "cuidar do marido". "Tenho um filho que mora comigo e dois netos. De duas a três vezes na semana, levo meu marido ao hospital. É tudo muito difícil para quem é pobre".