Numa agenda de campanha, dia destes, na escaldante região do SAARA, centro de comércio informal do Rio, o candidato ao governo Marcelo Crivella (PRB), pedia a plenos pulmões: “ao se dirigirem às urnas domingo, façam-no como se fossem um soldado na parada de sete de setembro”. O discurso nacionalista, que domina as falas de Crivella, reflete o perfil não só do candidato ao mais importante cargo do estado, mas da aliança em si.
É que o vice dele na disputa é José Alberto da Costa Abreu (PRB), general reformado do Exército, a quem o cabeça de chapa faz questão de exaltar. Em entrevista ao Terra, o general Abreu falou sobre Segurança Pública, da estreia como candidato e sobre a polêmica envolvendo religião e política. Fiel da Igreja Batista, ex-católico, ele jura que sua chapa não tem pretensões de deixar a fé doutrinária influenciar na ação política caso sejam eleitos. Diz que não tem pretensões de ser secretário de Segurança, cargo que, segundo o general, também não será destinado a Anthony Garotinho (PR), como ventilado nos bastidores de alguns comitês. Confira a entrevista.
Terra - Como está sendo disputar um cargo público pela primeira vez?
General Abreu – Eu estou muito animado. Pra mim, foi tudo novidade. Por 42 anos, servi ao Exército Brasileiro, fui para a reserva agora. Estou gostando da experiência e muito animado com o resultado final. Sabemos que a disputa aqui no Rio vai ser voto a voto.
Terra – O sr. já sonhava em ocupar um cargo público?
General Abreu - Eu sou genro do Ely Abud, que foi vereador por muito tempo em São Gonçalo (Região Metropolitana do Rio). Por 30 anos, ele esteve ligado à política, além de vereador, candidatou-se a deputado e eu já acompanhava a política por isso. Ele faleceu há poucos meses, no dia do jogo entre Brasil X Colômbia (pela Copa do Mundo). No mesmo dia também em que fui oficializado na chapa como vice. Como general do Exército, a gente não está nunca afastado totalmente da vida pública. Sempre tive contato com a política. Não é uma novidade total para mim. Não me candidatei até então porque, como militar da ativa, não poderia.
Terra - Em que o sr. acha que soma à candidatura do Marcelo Crivella?
General Abreu - Eu tenho conhecimento muito grande nas Forças Armadas. Eu comandei a Primeira Divisão do Exército e a guarnição da Vila Militar por dois anos (no Rio). Elas agregam cerca de 20 mil homens. Foi meu último comando. Minha vida profissional foi muito ligada ao Rio de Janeiro. Fui criado em São Gonçalo (onde nasceu) e depois em Niterói. Com certeza, meu conhecimento nessa área vai facilitar muito para o enfrentamento da violência. Não serei o secretário de Segurança, nem será o (Anthony) Garotinho (ex-governador que apoia Crivella no segundo turno) como alguns andam falando. Mas vamos trabalhar na coordenação. Estou somando muito pela integração com os jovens policiais, bombeiros e as Forças Armadas do nosso estado em geral.
Terra - Como foi a experiência de comandar a segurança do papa Francisco durante a Jornada Mundial da Juventude, no Rio?
General Abreu - Inicialmente o cargo me foi passado por estar comandando a Primeira Divisão de Exército, que é o comando operacional. Coordenei toda a parte de segurança de defesa, o chamado contra-terrorismo, a proteção marítima, a segurança do espaço aéreo - porque são todas ações de defesa. E acompanhei tudo em relação à segurança pública, à proteção das autoridades. Em alguns eventos também atuamos, como naquele encontro (do papa Francisco) em Copacabana, em que estiveram 3 milhões de pessoas.
Terra – Qual a sua opinião sobre as Unidades de Policia Pacificadora (UPPs) implantadas pelo governo do Estado?
General Abreu - As UPPS são uma política correta. Elas precisam ser atualizadas e transformadas em instalações mais seguras. Algumas unidades contam só com os contêineres instalados. Elas têm que ser fixas, permanentes e seguras. O pessoal militar tem que ser melhor treinado, mas, em linhas gerais, é uma iniciativa positiva.
Terra – O sr. concorda com o uso do Exército para a segurança de comunidades antes da entrada da PM, como aconteceu em alguns locais?
General Abreu - Emergencialmente sim, mas não este é o papel constitucional do Exército. Mas numa emergência, é claro que concordo. Mesmo porque são soldados que tiveram experiência no Haiti, por exemplo. Mas depois (da ocupação inicial do Exército) a Polícia Militar tem que assumir seu papel na segurança.
Terra - Fala-se que nas comunidades os homens do Exército ficam mais vulneráveis até do que os policiais. Como o sr. avalia isso?
General Abreu – Não concordo. As pessoas respeitam muito os homens das Forças Armadas, pela seriedade do trabalho do Exército. A população confia e respeita. O fato de ter um ou outro enfrentamento é mais em função das lideranças do tráfico porque perdem dinheiro e território. As nossas tropas são preparadas muito bem para enfrentar isso. Mas é claro que é uma missão muito difícil.
Terra – O candidato Crivella insiste num discurso de amor à pátria e ufanismo. Não está ultrapassado? Ainda tem espaço no Brasil para isso?
General Abreu - O brasileiro ainda ouve esse tipo de discurso sim. As pessoas muitas vezes precisam disso. O Brasil de hoje precisa de mudança. Um país com potencial como o nosso tem que se desenvolver, o nosso estado também. Nós temos potencial. As pessoas gostam deste discurso. E o Crivella é uma pessoa honesta, comprometida com o social.
Terra – Vocês já eram amigos antes de fechar a chapa?
General Abreu - Não de muito tempo. Mas aceitei, prazerosamente, por ser o Crivella, que eu já sabia quem era. Claro que não aceitaria (o convite) de todos os candidatos. Entre nós há muito respeito e comprometimento.
Terra - O Crivella exalta sua presença na chapa sempre que pode. Essa defesa ajuda a diminuir a resistência aos militares, num país que tem suas razões históricas pra isso, já que vivemos uma ditadura por 21 anos?
General Abreu - Na realidade, o brasileiro é muito esclarecido, ele não mistura as coisas. Ele sabe que as Forças Armadas são voltadas para eles. Eu nem gosto, por exemplo, de falar sobre a Comissão da Verdade, quando as pessoas me perguntam, porque não é o que está em discussão. O Crivella serviu como oficial. Ele conhece muito o Exército e respeita. Eu creio que as pessoas sabem que o que queremos é só o melhor para a população. Hoje as Forças Armadas são bem aceitas pelos brasileiros.
Terra - No seu Facebook, o sr. atacou a proximidade entre o candidato do PMDB, Pezão, e o bispo da Assembleia de Deus, Silas Malafaia. Como o sr. vê a polêmica mistura entre política e religião?
General Abreu - Infelizmente eles (adversários) tentam ligar a política e a religião. Esse tempo todo em que o Crivella foi senador, ele não fez nenhuma ação que tenha beneficiado a Universal (Igreja Universal do Reino de Deus, ala da religião evangélica a que pertence Crivella). É uma campanha negativa deles (da campanha adversária). Ele (Pezão) é que agora está procurando apoio do Malafaia. E é claro que este deve ter recebido alguma promessa por parte do governo.
Terra - Mas que tipo de promessa?
General Abreu - Algum favor, por exemplo, eu não tenho certeza, mas a suspeita nossa é que o governo pode estar apoiando as igrejas do Malafaia e do Valdomiro (apóstolo Valdomiro Santiago, criador da Igreja Mundial do Poder de Deus que também declarou apoio a Pezão). Por isso eles nos atacam e atacam a Universal. O Crivella é sobrinho do Edir Macedo. Mas nós não escolhemos nosso parentesco. O fato de um tio nosso ter uma profissão não quer dizer que tem que seguir. Crivella não mistura religião com política.
Terra - O sr. segue qual religião?
General Abreu - Eu já fui católico, mas me converti à doutrina evangélica há alguns anos. Não sou da Universal, sou da Igreja Batista atualmente. Gosto de frequentar os cultos, de ouvir a pregação do pastor. Não tenho nada contra a Universal.
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