Na madrugada de quarta-feira (17), a entrevista do ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro a Pedro Bial rendeu 4.6 pontos de média ao Conversa com Bial. O índice representa 945 mil telespectadores na região metropolitana de São Paulo, principal área de aferição da Kantar Ibope.
Trata-se de resultado relevante ao considerar que o programa começou por volta de 2 horas da manhã, horário em que o número de aparelhos de TV ligados é baixo. A presença do maior ícone da Operação Lava Jato rendeu incontáveis manchetes na imprensa.
Um aspecto foi pouco explorado. A Globo deu espaço valioso para Moro promover suas ideias, opiniões e o embrião da candidatura enquanto continua a negar os pedidos de Lula e Jair Bolsonaro por oportunidade semelhante em sua programação.
Desde a época da prisão na Polícia Federal de Curitiba, o ex-presidente reclama por ser ignorado pela mais influente e assistida emissora de TV do País. Em junho de 2019, ele comentou a respeito ao ser entrevistado pelo canal TVT.
“Você não acha estranho que a Globo nunca tenha pedido uma entrevista (comigo)?”, questionou. “Afinal de contas, eu sou uma pessoa que ainda tem uma certa audiência no Brasil, mais do que todos os programas deles. Eu gostaria de conversar, eu gostaria de ver sentar na minha frente o William Bonner.”
Em abril deste ano, Pedro Bial polemizou ao falar do petista no Manhattan Connection, então exibido na TV Cultura. “Tem algum convidado que não vai ao seu programa? Todo mundo quer ir”, observou o jornalista Lucas Mendes. “O Lula”, respondeu Bial. “Ele até já disse que gostaria de fazer o programa comigo, mas aí tinha que ser ao vivo. Pode até ser ao vivo, mas aí teria que ter um polígrafo acompanhando as falas dele.”
Polígrafo é o aparelho conhecido como ‘detector de mentiras’, usado pela polícia de alguns Países em interrogatórios e por certos programas de TV para verificar a autenticidade do que diz determinado convidado. Diante da repercussão ruidosa de sua ironia, Pedro Bial explicou a desconfiança em relação ao ex-presidente em artigo na Folha de S. Paulo.
“Lula sabe muito bem que já mentiu a meu respeito. A verdade está registrada, há provas e testemunhas”, escreveu. Bial se ressente da versão contada pelo esquerdista de uma conversa reservada que tiveram após uma gravação no Palácio do Planalto em 2005.
Apesar dos apelos, a Globo continua a não procurar Lula. Não mostra interesse em ouvir a maior liderança da esquerda e um dos candidatos melhor colocados nas pesquisas de intenção de votos para a eleição presidencial de 2022. Jornalisticamente, é uma omissão injustificável.
O mesmo ocorre com Bolsonaro. Ele ocupa o mais importante posto do Poder Executivo e já articula a campanha de reeleição, porém, segue desdenhado pelo principal canal da família Marinho. Em várias ocasiões, o presidente se dispôs a ser entrevistado na Globo – a mais recente ‘oferta’ aconteceu em live de 23 de setembro. Jamais teve resposta.
Pode-se argumentar que o canal evita Bolsonaro porque sabe que será atacado por ele. Justamente por isso deveria entrevistá-lo: a fim de contestar suas acusações, os xingamentos, os deboches. Desprezar um personagem importante não o aniquila, pelo contrário, pode fortalecê-lo aos olhos de parcela numerosa do público.
O jornalismo da Globo afirma agir com isenção e imparcialidade. Precisa mostrar isso na prática, senão acabará associado a esse ou aquele candidato à Presidência, como já aconteceu. Ainda que sejam desafetos declarados da emissora, Lula e Bolsonaro merecem o mesmo espaço dado a possíveis adversários na próxima eleição.