Opinião: Os caminhos da política que levaram Moro ao Inferno e Dino ao Paraíso

Moro parece estar apenas começando a caminhada pelo Inferno. Mas ao contrário de Dante Alighieri, na Divina Comédia, o ex-juiz está sozinho

15 dez 2023 - 14h20
Flávio Dino e Sergio Moro conversam durante sabatina no Senado
Flávio Dino e Sergio Moro conversam durante sabatina no Senado
Foto: Poder360

Entre os políticos de carreira é sabido que as vitórias são o resultado de uma conjunção de fatores: uma mistura de conjuntura com a habilidade de saber ver e aproveitar a oportunidade, e conhecimento para saber montar no cavalo selado e disparar em galopada. É assim para aprovação de um projeto de lei, de uma reforma tributária, de um impeachment, uma eleição, etc.

Nesse mix de “variáveis” e méritos, o ex-juiz federal Flávio Dino foi escolhido senador pelo Maranhão, onde já tinha sido eleito deputado e governador, e puxado por Lula (PT) para ser ministro da Justiça e Segurança Pública. Nesta semana foi ao Senado para ser sabatinado e aprovado à vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal.

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Entre seus “inquiridores” estava o também ex-juiz federal Sergio Moro (União Brasil-PR). A vida política de Dino e Moro parece mais o Inferno e o Paraíso retratados por Dante Alighieri na Divina Comédia. Chegaremos lá.

Moro, que era juiz e prendeu Lula em 2018, naquele mesmo ano deixou a magistratura para ser ministro do candidato que se beneficiou da prisão do petista, Jair Bolsonaro (PL). Por essas vias, Moro ouviu de Bolsonaro que havia um “compromisso” para indicá-lo ao STF.  Como a terra plana não dá voltas, mas capota, não aconteceu nada disso.

O ex-juiz passou por fritura e desdém até ser chutado do governo de extrema-direita. E ainda assim voltou para se prestar ao papel de assistente de palco de Bolsonaro na campanha contra Lula.

O político Moro segue com uma atuação débil no Senado, e nessa semana entrou numa espécie de inferno astral. Após a sabatina com Dino, o ex-juiz virou alvo da extrema-direita, que implicou com as conversas flagradas pelo Estadão e pela Folha de S. Paulo. Soubemos que nas mensagens do “zap zap”, Moro tinha receio de expor seu voto (se sim ou não pela aprovação de Dino) e que Deltan Dallagnol, o colega de Lava Jato, estava “desesperado” com a situação.

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Conversas vazadas sempre foram um problema para Moro, vide a série de denúncias da Vaza Jato, no The Intercept Brasil, que desmascarou o jogo combinado que ele fazia com o então procurador Dallagnol.

A semana ainda estava longe do fim e seguiu ladeira abaixo. Na noite de quinta, 14, o Ministério Público se manifestou pela cassação de seu mandato. No parecer da Procuradoria Regional Eleitoral do Paraná, os procuradores entendem que houve “abuso de poder econômico” devido ao gasto de, pelo menos, R$ 2 milhões durante a pré-campanha a presidente feita com recursos do Podemos e do União Brasil. Como não saiu para presidente e sim para senador, eles entendem que a disputa se deu em condições desiguais às de seus adversários.

O processo eleitoral que pode cassar seu mandato e declará-lo inelegível foi movido pelas campanhas do PT e do PL, que o acusam de “caixa dois”.

O senador prestou depoimento sobre o caso na semana passada e negou irregularidades. Disse “que essas duas ações são movidas com base em perseguição política que é feita pelo PT, por conta do trabalho que fiz no passado, e do outro lado com oportunistas do PL que perderam a eleição". Política é assim mesmo, esse combinado de momento, oportunidade, habilidade, competência.

Moro é refém do personagem que criou na Lava Jato e do político pouco habilidoso que se mostrou sem a toga. Vive hoje com a cabeça sob a guilhotina (politicamente, claro), e pode ficar marcado como o amigo Deltan, sob manchetes assim: “cassado e com plenário vazio”.

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Abandonado pela direita e extrema-direita e com pouca simpatia dos ex pares do Judiciário, Moro colhe os frutos do que plantou.

Quando deixou a Lava Jato, em 2018, foi como se Moro tivesse chegado ao Inferno de Dante, ainda que não soubesse. A obra conta que Dante, perdido em uma "selva", chega à morada do “tinhoso”, onde na entrada está escrito: “Deixai, ó vós que entrais, toda esperança”.

Na Divina Comédia, na caminhada pelo Inferno e Purgatório, Dante é guiado por um poeta, Virgílio. No Paraíso será guiado pelo amor de Beatriz. Na política, cada um precisa fazer seu caminho. Esta semana vimos o juiz que separou toga e política chegar ao Supremo. E um juiz que misturou toga e política ser atacado pelo próprio grupo político.

No caso eleitoral em questão há uma discussão técnico jurídica sobre a pré-campanha, pois existe um limbo sobre o que pode ou não gastar e como registrar. Em partes, o processo de Moro aborda isso.

Na alegoria da política, Moro parece estar apenas começando a caminhada pelo Inferno, onde encontrará vários conhecidos sendo castigados. Mas ao contrário de Dante, o ex-juiz entrou nessa sem guia, sozinho. Enquanto isso, Flávio Dino orbita nas esferas do Paraíso até tomar posse no STF.

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Bom fim de semana!

Este texto foi publicado originalmente na newsletter semanal Peneira Política, assinada por Guilherme Mazieiro. Assine aqui, gratuitamente, e receba os próximos conteúdos.

Fonte: Guilherme Mazieiro Guilherme Mazieiro é repórter e cobre política em Brasília (DF). Já trabalhou nas redações de O Estado de S. Paulo, EPTV/Globo Campinas, UOL e The Intercept Brasil. Formado em jornalismo na Puc-Campinas, com especialização em Gestão Pública e Governo na Unicamp. As opiniões do colunista não representam a visão do Terra. 
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