Senadores ruralistas aproveitaram a semana esvaziada do Congresso para tentar avançar o projeto do marco temporal das terras indígenas. O grupo também manobrou para tirar o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Sem partido-AP), da Comissão de Constituição e Justiça, onde o projeto tramita e precisa ser aprovado para ir à votação em plenário. A retomada das discussões ocorreu nesta quarta, 20, mesmo dia em que o Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a julgar o assunto. Na Corte, há expectativa de resultado favorável aos indígenas.
Nesta semana, diversos congressistas e os presidentes do Senado e da Câmara acompanham Lula (PT) em agendas na Organização das Nações Unidas (ONU), sem que haja votação de propostas complexas ou polêmicas no Congresso.
Apesar da movimentação dos ruralistas, a senadora Eliziane Gama (PSD-MA), aliada do governo, pediu vistas (quando o congressista solicita mais tempo para análise do projeto). O governo queria que houvesse uma audiência pública sobre o tema, antes da votação, mas foi derrotado por 15 votos a 5. Assim, a votação deve acontecer na próxima quarta, 27.
Durante as discussões, o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) disse que o Senado deveria manter as prerrogativas do parlamento, “senão seria melhor fecharmos o parlamento para esperar as decisões [do Supremo]", afirmou.
Entre os ruralistas há incômodo com o julgamento no STF. Isso porque a tese do marco deve ser derrubada e há críticas de que o Supremo estaria tomando prerrogativas de legislar do Congresso. A tese jurídica do marco temporal estabelece que os indígenas só teriam direito à demarcação das terras que já estivessem tradicionalmente ocupadas por eles na data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro. Os indígenas entendem que a questão é inconstitucional.
Entenda a movimentação no Senado
A articulação da oposição para tentar acelerar a tramitação do marco temporal foi criticada por Randolfe Rodrigues, que diz ser “um movimento de confronto com o Supremo Tribunal Federal”. O texto foi levado à CCJ pelo relator Marcos Rogério (PL-RO), que trabalha sobre o tema há pouco mais de duas semanas. Ele é vice-presidente da comissão.
Ainda que o líder do governo reclame do avanço da matéria, falta articulação da gestão Lula. O governo não tem uma defesa clara e firme contra o marco temporal, há entendimentos divergentes entre ministros e parlamentares. O resultado disso pôde ser visto em maio, quando a Câmara aprovou a pauta ruralista sem qualquer dificuldade política por 283 votos a 155.
“Houve um atropelo de acordos, de procedimento e do próprio STF. Houve um procedimento que não é usual. Seria um pouco exagerado usar a palavra golpe, mas o procedimento não foi adequado”, disse Rodrigues na tarde desta quarta, 20.
Rodrigues foi retirado ontem da CCJ pelo líder do bloco partidário que pertence, Efraim Filho (União Brasil-PB). No seu lugar foi colocado Zequinha Marinho (Podemos-PA), favorável ao projeto.
“A substituição ocorreu ontem (terça, 19) na véspera da reunião de hoje. Meia hora depois é pautado o marco temporal? É lógico que teve em curso um procedimento de atropelo de acordos”, disse Rodrigues.
Apesar de ser líder do governo, a distribuição de funções e cadeiras nas comissões se dá a partir de negociações de blocos entre os partidos. Assim, o líder de cada bloco tem o poder de trocar os indicados da quota a que tem direito.