O TRT de Minas Gerais decidiu a favor de um hospital de Belo Horizonte que havia demitido um funcionário por usar, em seu expediente, uma camisa com a imagem do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra e a frase 'Ustra Vive'.
O Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Minas Gerais decidiu a favor de um hospital em Belo Horizonte que demitiu um funcionário por usar, durante o expediente, uma camiseta estampada com a imagem do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra e a frase "Ustra Vive". As informações são do jornal O Globo.
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Durante a ditadura militar no Brasil, Carlos Alberto Brilhante Ustra comandou o Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) em São Paulo, uma unidade que ficou conhecida por torturar dezenas de presos políticos.
A demissão do funcionário ocorreu em dezembro de 2022, após o hospital receber reclamações em sua ouvidoria de que o funcionário estava usando uma camisa com a imagem do coronel e a frase "Ustra Vive" na presença dos pacientes. O funcionário ocupava o cargo de assistente de suprimentos no Hospital Luxemburgo desde 2008.
De acordo com o hospital, a atitude do funcionário foi considerada um ato de insubordinação e violou o código de ética da empresa, o qual proíbe o uso de camisas que promovam questões religiosas e/ou partidárias em suas dependências.
O hospital também alegou, no processo levado ao TRT, que o funcionário realizou apologia a um ex-coronel vinculado à ditadura militar e a atos de tortura no local de trabalho, o que constituiu uma falta grave suficiente para quebrar a confiança necessária para a continuidade do vínculo empregatício.
Depois de ser dispensado, o empregado recorreu à Justiça, e a 27ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte reverteu a demissão por justa causa, transformando-a em dispensa sem justa motivação e condenando o hospital a pagar indenizações trabalhistas.
Em sua defesa, o trabalhador argumentou que tinha mais de 12 anos de serviço na empresa e que a dispensa não respeitou a sequência de punições, já que não houve advertência prévia. Ele afirmou que a camisa em questão era antiga e que a vestiu sem pensar, sem a intenção de fazer propaganda ou política.
Além disso, mencionou que era comum os funcionários irem ao trabalho usando camisas de futebol, de figuras históricas como Che Guevara, ou até mesmo de políticos, sem qualquer advertência anterior por parte do empregador. Com base nesses argumentos, sustentou que não havia observado o código de conduta e, portanto, não poderia ter sido demitido por justa causa.
Segunda instância confirmou demissão
A Primeira Turma do TRT-MG, de forma unânime, ratificou a demissão por justa causa. Segundo a decisão, da desembargadora Adriana Goulart de Sena Orsini, o funcionário praticou apologia à tortura e à figura de um torturador, o que configurou uma falta grave suficiente para encerrar o vínculo empregatício.
A decisão se baseia nos artigos 482, alínea “h”, e 8º da CLT, destacando que a conduta do funcionário constituiu um ato de insubordinação, afetando a ordem democrática. Além disso, ressalta que essa conduta ultrapassou os limites da empresa, impactando potencialmente toda a sociedade e a ordem institucional do Estado Democrático de Direito.
De acordo com o entendimento do TRT, a conduta do trabalhador constituiu uma violação ao interesse público. A desembargadora citou o artigo 8º da CLT, que determina que "as autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito (...), de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público”.
A relatora ressaltou que o desejo do trabalhador de usar trajes que fazem apologia à tortura e a um torturador não pode se sobrepor ao interesse público ou da coletividade, que "se manifesta no respeito ao Estado Democrático de Direito, às instituições da República e aos princípios constitucionais que priorizam os direitos humanos, a dignidade da pessoa humana e o bem comum em detrimento de interesses individuais".
A desembargadora também destacou que o coronel Ustra foi judicialmente reconhecido como responsável pela prática de tortura durante o regime militar, no qual foi enfatizado que a tortura viola a dignidade humana.
“O caso da tortura da família Teles, em 2008, julgado no processo mencionado, deu origem à primeira condenação que confirmou como torturador o chefe do DOI-CODI, coronel Ustra”, completou a desembargadora.