Libélula: uma nova embaixadora para um novo ecoturismo na Amazônia

Inseto de grande beleza e importância para os ecossistemas aquáticos, as libélulas podem ajudar a desenvolver o ecoturismo. Mas, para isso, é preciso que políticas públicas deem apoio às iniciativas de comunidades locais.

8 nov 2024 - 11h42
(atualizado às 16h54)

Um inseto vistoso e colorido — comparado ao helicóptero por sua incrível capacidade de voo e manobrabilidade e à cigarra pelo som de suas asas ao voar — pode se tornar o novo "embaixador turístico" da Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns, na Amazônia brasileira. E, de quebra, ainda fortalecer um Ecoturismo de Base Comunitária (EBC) ainda raro no Brasil: o EBC com foco em insetos.

A responsável por essa oportunidade única de inovação no ecoturismo é a libélula (ou jacina, como é conhecida na região), um inseto aquático da ordem Odonata, que desperta muita atenção do público.

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Um inseto carismático e de grande importância

Durante sua fase larval, as libélulas vivem dentro da água e, quando adultas, vivem próximos aos ambientes aquáticos. Para que possam ocorrer, precisam de condições ambientais bastante específicas, como águas limpas, com poucas alterações antrópicas (realizadas pelo homem) e pouca poluição. Por isso, são utilizadas como biodindicadores de condições ambientais: elas respondem rapidamente às mudanças ambientais, fornecendo informações valiosas sobre a saúde dos ecossistemas de água doce.

Na fase larval, podem se alimentar até mesmo de pequenos alevinos e girinos, contribuindo assim para o fluxo de energia na natureza e para que os sistemas aquáticos tenham águas limpas e de qualidade. Na fase adulta, são predadores que se alimentam de outros insetos, e alguns estudos reportam seu papel na redução de vetores de doenças, como o mosquito da dengue.

Além do papel relevante que desempenham no ecossistema, as jacinas — termo que em língua indígena Tupi traduz "borboleta marrom com asas azul-claras" — despertam, por sua beleza e características únicas, o interesse em públicos de todas as idades. Por isso, elas oferecem uma oportunidade para o desenvolvimento de atividades de Ecoturismo de Base Comunitária (EBC) de forma participativa e colaborativa, promovendo uma maior apreciação da natureza e conscientização sobre a importância de sua conservação.

Essas atividades ainda abrem espaço para que grupos menos conhecidos ou apreciados pelas pessoas por seu "menor carisma", como os invertebrados, possam ser valorados por sua importância no ecossistema e pelos serviços ecossistêmicos que prestam. É o carisma da libélula aumentando a conscientização ecológica e a conservação da biodiversidade aquática. E essa conexão é particularmente importante em tempos de perda acelerada de biodiversidade e de mudanças climáticas.

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Reconhecimento da comunidade

A atração dos humanos pelas libélulas é grande: elas estão nas artes, pinturas, joias… Em algumas culturas, como o Japão, são relacionadas à boa sorte e transformação. Em virtude dessa grande atratividade que as libélulas exercem, realizamos uma pesquisa para avaliar o seu potencial para promover o Ecoturismo de Base Comunitária na Reserva Tapajós-Arapiuns.

A pesquisa visa aumentar a compreensão da população sobre o papel dos insetos nos ecossistemas, promovendo maior empatia e ações de conservação, além de explorar novas oportunidades para o desenvolvimento do EBC em unidades de conservação, o que aumenta a visibilidade das reservas.

O estudo, publicado na revista Global Ecology and Conservation, destaca a importância do conhecimento ecológico tradicional e da participação comunitária no desenvolvimento de iniciativas de conservação em áreas protegidas. A intenção é que ele sirva como uma ferramenta de diagnóstico essencial para impulsionar o ecoturismo de base comunitária com foco em Odonata em unidades de conservação.

Durante dois meses, entrevistamos 415 líderes e moradores indígenas e não indígenas da região, pertencentes a 73 comunidades e aldeias. Percorremos mais de 260 km, e fizemos o percurso utilizando, como principal meio de transporte entre as comunidades, a bajara, um pequeno barco a remo ou motor usado pelas populações locais para pescar e deslocar-se.

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A maioria dos participantes da pesquisa reconhecem o valor estético, ambiental, cultural e econômico das libélulas e destacam seu potencial para atrair turistas e desenvolver o EBC. Além disso, afirmam que as libélulas funcionam como indicadores da chegada do verão (já que sua abundância aumenta durante a estação seca) e ressaltam seus usos medicinais no tratamento de verrugas e até mesmo em problemas de fala em crianças.

A pesquisa também identificou um forte interesse das comunidades em desenvolver atividades turísticas focadas nas libélulas, o que poderia diversificar o ecoturismo, promover práticas de conservação sustentáveis e gerar novas oportunidades de renda para as populações locais.

Esse estudo faz parte do INCT SinBiAm - Sínteses da biodiversidade Amazônica e do PPBIO-AmOr Amazônia Oriental, que buscam alinhar o conhecimento da biodiversidade com a conservação e o desenvolvimento sustentável das comunidades tradicionais.

Incentivos aos guardiões da floresta

Em outros países, o turismo para avistamento e observação de libélulas já é explorado, similar ao que acontece com a observação de aves aqui no Brasil, atraindo centenas de pessoas que viajam para diversas regiões para apreciar a natureza. Isso contribui economicamente para que as comunidades que mantém as florestas em pé e os rios fluindo possam receber benefícios pelo papel essencial que executam, com uma complementação de renda e uma vida mais digna.

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A inclusão dessas atividades de EBC com apoio de instituições como o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) — a partir do Programa Monitora aquático, que já utiliza libélulas em programas de monitoramento ambiental — pode fortalecer a conservação da biodiversidade e a valorização cultural na região. Pode ainda promover a participação e o empoderamento das populações indígenas e não indígenas que vivem na reserva.

No entanto, para que o ecoturismo com libélulas seja benéfico e sustentável, será necessário implementar políticas públicas, programas de financiamento e suporte técnico que incentivem e possibilitem o desenvolvimento dessas iniciativas pelas comunidades locais.

Levando-se em consideração que a Amazônia, em virtude de sua importância para a humanidade, tem recebido a atenção do mundo, este é um momento oportuno para tentar implementar ações como essas.

The Conversation
The Conversation
Foto: The Conversation

Mayerly Alexandra Guerrero Moreno recebe financiamento da CAPES, Fundação para a Ciência e a Tecnologia e Agência Executiva de Investigação.

José Max B. Oliveira-Junior recebe financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) (bolsa de produtividade - processo: 307808/2022-0).

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Leandro Juen é pesquisador com bolsa produtividade do CNPq. O CNPq financia ainda os projetos do INCT Síntese da Biodiversidade Amazônia (SInBiAm) e do PPBIO Amazônia Oriental (PPBIO AmOr).

Este artigo foi publicado no The Conversation Brasil e reproduzido aqui sob a licença Creative Commons
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