A história da adolescente sul-africana que foi roubada quando bebê e quer ficar com sua sequestradora

15 ago 2016 - 17h20
(atualizado às 17h28)

Imagine crescer em uma família em que você é a menina dos olhos do seu pai e o centro do mundo para sua mãe. Você é feliz e está ansiosa para comemorar seu aniversário de 18 anos.

Zephany Nurse foi levada três dias após nascer, há 19 anos
Zephany Nurse foi levada três dias após nascer, há 19 anos
Foto: BBC / BBC News Brasil

Agora imagine descobrir que a mulher que você amou toda a sua vida te sequestrou e que o homem que você chama de pai não é seu pai biológico.

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Essa é a vida de Zephany Nurse.

Zephany é o nome que seus pais biológicos, Celeste e Morne Nurse, deram a ela quando ela nasceu, em um hospital da Cidade do Cabo, na África do Sul, em 27 de abril de 1997.

Já o nome que ela usou a vida toda não pode ser publicado para preservar sua identidade. Ela é considerada a "Madeleine McCann" - a menina inglesa que desapareceu em Portugal - da África do Sul.

Uma mulher de 51 anos, cujo nome também não foi revelado, recebeu uma sentença de dez anos de prisão nesta segunda-feira após ser considerada culpada em março por roubar Zephany do hospital enquanto Celeste ainda se recuperava do parto.

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O julgamento atraiu a atenção de muitos sul-africanos, que mandaram mensagem de apoio à jovem nas redes sociais.

Mas como Zephany lidou com esse julgamento?

As pessoas próximas ao caso dizem que isso destruiu a imagem que ela tinha de si mesma.

Ela disse que queria ficar com a mulher que a sequestrou, e não com os pais biológicos.

Zephany foi descoberta depois que uma das outras filhas da família Nurse começou a frequentar a mesma escola que ela e percebeu a semelhança.

Celeste e Morne Nurse suspeitaram do caso, acionaram a polícia e testes de DNA mostraram que ela era a filha biológica deles. A menina morava a poucos quilômetros da casa dos pais biológicos.

A mulher que a criou foi presa, e começou aí um dos casos mais intrigantes e emocionantes da África do Sul.

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'Fui enganada'

E o que levou a acusada a um ato tão desesperado?

Durante o julgamento, foi dito que ela havia sofrido diversos abortos naturais. Ela disse que isso fez com que ela ficasse desesperada para ter uma filha.

Mas ela nega que tenha roubado a criança e afirma que não esteve no hospital no dia em que a criança nasceu.

Ela diz que recebeu a recém-nascida em uma estação de trem movimentada de uma mulher chamada Sylvia, que não foi encontrada. Essa mulher seria a responsável por tratamentos de fertilidade que ela estaria fazendo após os abortos espontâneos.

"Ninguém acredita em mim neste momento, e eu mesma sou vítima. Fui enganada e envolvida em algo que eu não sabia", disse ela à BBC em uma entrevista antes de ser condenada.

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Ela também diz que assinou papéis de adoção, mas eles se perderam.

Durante o julgamento, porém, a Promotoria mostrou provas de que a mulher havia ido várias vezes à maternidade e tentado roubar crianças.

Apesar de seu marido só ter descoberto isso quando a identidade da criança foi revelada, ele ainda a apoia.

"Sempre iremos agradecê-la por ter sido uma ótima mãe" disse ele, segundo o site IOL.

Ele também falou sobre feriados que eles tiveram e família.

"Por 17 anos, tivemos uma tradição de café na cama em todos os Dias das Mães que minha mulher passou com Zephany. Eu fazia ovos, Zephany buscava as torradas, flores e presentes. Ela também fazia a decoração", disse.

Zephany está morando com o homem que ajudou a criá-la. Ele diz que ela está triste por ter "perdido sua mãe".

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Psicologia x lei

O psicólogo Oliver Fachs, baseado na Cidade do Cabo, diz que é normal alguém na situação de Zephany se sentir "inquieto".

Ele diz que é normal, então, que ela queria ficar perto das pessoas que a criaram.

"Sua estrutura de significados, senso de identidade, como ela se coloca no mundo - tudo foi alterado", disse ele. "Como psicólogo, acho que o importante é saber como lidar com esta nova realidade."

Fuchs diz que a psicologia e a lei estão em lados opostos neste caso.

Enquanto sem dúvida ocorreu um crime, Zephany não tinha consciência disso até pouco tempo atrás e passou a maior parte da vida construindo laços com as pessoas que a criaram.

Ela não falou diretamente com a imprensa, mas, em comunicado emitido pelo Centro de Justiça Infantil em março, ela reclamou da forma como a mídia retrata a mulher que ela ainda vê como sua mãe.

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"Vocês nunca pensam que essa é a minha mãe? Se for verdade ou não, não é para vocês brincarem com isso", disse a menina na época.

Ela também falou sobre o homem que a criou como pai.

"Como vocês se sentiriam como um pai, muito abalado mas ainda com bondade para dar apoio a sua família?"

Durante o julgamento, ela foi impedida de ver a mulher acusada e foi levada para a casa dos pais biológicos. Mas ela teve dificuldades para se conectar com eles e pediu para ficar com o pai de criação.

O amor da família Nurse, porém, é paciente e já foi testado pelo tempo.

Por exemplo, Celeste disse no julgamento que a família fazia algo para marcar o aniversário de Zephany todos os anos, com um bolo - eles sempre divulgavam a comemoração à mídia, na tentativa de encontrar a criança.

Por isso, a família biológica disse estar pronta para dar a ela o tempo que precisar e trabalhar para conquistar seu carinho e confiança.

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Mas eles sentem que tiveram roubada sua vida com ela, e a experiência foi dura demais para o casal.

Enquanto testemunhava durante a audiência de leitura da sentença, Morne disse à corte que o casamento com Celeste havia sido prejudicado e que ele tiveram dificuldades em reatar a relação. Eles se divorciaram em fevereiro de 2015.

Ele desabou ao falar sobre os muitos anos que passou procurando a filha.

"Não sei como ela ficou com a Zephany por tanto tempo. Sempre procuramos por ela. A forma como eles continuaram escondendo minha filha é inacreditável", afirmou. "Não tenho nenhuma relação com minha filha e isso me machuca".

Ao dar seu veredito, o juiz John Hlophe descreveu a história da acusada como um "conto de fadas" e disse que "o júri rejeitou a história com o deprezo merecido". Ele afirmou que ela teve diversas oportunidades para devolver a criança para a família biológica.

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Mas a mulher insiste que só e culpada de amar uma criança que ninguém queria.

Agora que a sentença foi dada, há o debate de como fazer uma Justiça que traga menos danos às vítimas.

Zephany perdeu a pessoa que via como sua mãe, um marido perdeu a mulher que foi presa e sua filha, e a família Nurse, que já ficou sem a filha por anos, ainda está sem ela.

Até o momento, não há vencedores nesta história.

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