Um acordo firmado nesta quarta-feira (28/8) entre dois partidos italianos - o populista e anti-establishment Movimento Cinco Estrelas (M5S) e o Partido Democrático (PD), de centro-esquerda - frustrou, ao menos por enquanto, as pretensões de Matteo Salvini, ministro do Interior do partido A Liga, que almejava liderar o governo italiano. E pode mudar pontos importantes da política na Itália.
O M5S e o PD, que têm um longo histórico de hostilidade entre si, anunciaram a tentativa de formar uma coalizão para um novo governo e evitar a realização de novas eleições no país.
Segundo o M5S, a coalizão será liderada pelo premiê Giuseppe Conte, que havia renunciado no início do mês.
Essa nova coalizão vigoraria até 2023, para quando estão previstas novas eleições no país. Se um acordo de coalizão não tivesse sido acertado até esta quarta-feira, seria necessário convocar eleições antecipadas - que era a aposta de Salvini.
No Brasil, Salvini tornou-se mais conhecido por manter relações próximas com Jair Bolsonaro e chegou a elogiar a indicação de seu "amigo" Eduardo Bolsonaro, filho do presidente brasileiro, à Embaixada do Brasil nos EUA.
O que está acontecendo na Itália?
Até recentemente, o M5S era parceiro de coalizão no governo do partido de extrema direita A Liga - embora fosse uma aliança incômoda, o que os unia era o discurso anti-establishment. Mas, após cerca de um ano e meio dessa aliança, a hostilidade entre os dois grupos cresceu.
A implosão da coalizão teve como estopim, no início de agosto, à oposição do M5S ao projeto de trem de alta velocidade que ligaria a cidade italiana de Turim à francesa Lyon.
Salvini, que é líder da Liga, rompeu então a coalizão e abriu uma moção de desconfiança contra a liderança de Conte, alegando impossibilidade de governar junto ao M5S. Conte não é filiado a nenhum partido, mas é próximo do M5S.
A expectativa de Salvini era de antecipar as eleições e capitalizar em cima de sua crescente popularidade para chegar ao poder na Itália.
Mas a estratégia naufragou porque Conte, embora tenha de fato renunciado, permaneceu no cargo por tempo suficiente para que o M5S e o PD negociassem um acordo de coalizão.
"Amamos a Itália e achamos que vale a pena tentar essa experiência (de se aliar ao M5S)", afirmou Nicola Zingaretti, líder do PD.
Salvini, por sua vez, afirmou que "a única coisa que os une (M5S e PD) é seu ódio contra A Liga. (...) Milhões de italianos estão sendo mantidos reféns por uma centena de parlamentares que estão apenas tentando manter seus cargos". Ele agregou que a nova coalizão é "frágil" e apostou em seu fracasso.
Vale destacar que a coalizão entre PD e M5S ainda não é uma certeza absoluta. A agência Reuters explica que o acordo ainda pode desandar, enquanto o presidente italiano, Sergio Mattarella, faz consultas com partidos na tentativa de estancar a crise política.
Além disso, o PD e o M5S ainda têm de entrar em acordo quanto à divisão de cargos principais da administração, em especial o posto de vice-primeiro-ministro.
Um complicador adicional é que o M5S abriu uma votação online para ouvir a opinião de seus apoiadores a respeito do acordo com o PD - e muitos desses apoiadores têm rejeitado o pacto com a centro-esquerda.
Se o acordo for adiante, porém, mudará pontos importantes da política italiana, aponta a Reuters. O posicionamento eurocético e pró-cortes de impostos da Liga, por exemplo, seria trocado por um tido como mais próximo da União Europeia - e também mais favorável a uma política fiscal mais prudente.
Ao mesmo tempo, analistas políticos ouvidos pela agência AFP afirmam que um eventual fracasso da aliança M5S-PD pode alienar os eleitores de cada um dos grupos e, desse modo, acabar fortalecendo Salvini indiretamente.