É preciso ultrapassar ao menos sete barricadas em Caracas antes de chegar à casa do general aposentado Ángel Vivas.
O ex-militar ficou famoso neste domingo, quando uma comissão do serviço de inteligência da política venezuelana chegou à sua casa para prendê-lo por algo que ele havia escrito no Twitter.
Abrigado em sua casa no alto de uma colina no bairro de Prados del Este, na parte sudeste da capital, Vivas vestia um colete à prova de balas branco e trazia consigo uma pistola 9 milímetros e um fuzil de assalto.
Do alto do muro de sua residência, desafiou os funcionários do governo do presidente Nicolás Maduro que foram prendê-lo. Ele continua em liberdade.
A imagem desafiadora do ex-militar armado era digna de cinema. E sua figura mobilizou imediatamente seus vizinhos e vários venezuelanos críticos do governo.
Repercussão
Dezenas de vizinhos de Vivas ocupam uma área de dez quarteirões ao redor de sua casa, como uma espécie de brigada de defesa.
Quem vai ao local sente a tensão no ar. Recém-chegados são recebidos com olhares nervosos ou de raiva.
A identificação como repórter de imprensa acalma os ânimos, mas o olhar de suspeita nunca desaparece por completo.
"Defendemos o general para defender a democracia e a liberdade de expressão", disse Zenaida Rivera à BBC Mundo em frente à porta da casa do general aposentado.
Vivas sugeriu, por meio de sua conta no Twitter, formas de enfrentar uma eventual chegada de oficiais do governo, como colocar barricadas de arame farpado nas ruas.
Mas, dias depois de ele ter dado essas recomendações, um motociclista que não parecia estar envolvido nos protestos morreu ao bater contra uma barricada erguida em uma rua na parte leste de Caracas.
Isso gerou uma resposta enérgica do governo, que mandou prender o general por considerá-lo o responsável intelectual pela morte.
Sua prisão parecia certa até o envolvimento dos vizinhos, quando o ex-militar se entrincheirou e empunhou armas contra as autoridades.
Maduro declarou que isso apenas agravou a situação do ex-general.
Responsabilidade?
Vivas foi aposentado em 2008, quando solicitou por via judicial que os militares da Venezuela não fossem obrigados a gritar "Pátria, socialismo ou morte" em eventos das Forças Armadas.
Essa atitude lhe rendeu uma breve prisão e sua expulsão do Exército.
Desde então, tornou-se um ferrenho opositor do atual regime, com a liberdade conferida por não estar mais na ativa. Agora enfrenta um pedido de prisão em seu nome.
"Não podem responsabilizá-lo pela morte de uma pessoa só por ter publicado uma coisa no Twitter", disse Vivian Rey, uma da vizinhas de Vivas, à BBC Mundo.
O ex-general não atende à imprensa e só aceitou aparecer na televisão com a CNN em espanhol, emissora recentemente expulsa e depois readmitida no país.
Sua casa parece estar bem defendida pela vizinhança. Na última barricada, a dez metros de distância de sua residência, há óleo no chão para derrubar os mais descuidados.
"Fiquei incomodado pelo exagero da Guarda Nacional também ter vindo buscá-lo", disse Leoncio Marichal, vizinho de Vivas.
Junto com a caminhonete do serviço de inteligência, vieram, na ocasião 20 motos, três veículos blindados e dezenas de funcionários do governo. Tudo isso para prender um homem de quase 60 anos de idade.
"Assim que escutamos eles chegando, saímos para defendê-lo", disse Marichal.
No local, é esperado o retorno das forças de segurança.
Polêmico
A atitude de Vivas foi aplaudida por algumas alas mais radicais da oposição venezuelana, que saudaram o ex-militar por enfrentar o governo dessa maneira.
Mas outros setores da oposição expressaram preocupação pela exaltação da imagem de Vivas empunhando armas.
No amplo espectro de críticos do chavismo, existe uma ala que não vê com bons olhos o militarismo e dão como exemplo o ex-presidente Hugo Chávez, que tem um passado militar e liderou uma tentativa de golpe de Estado em 1992.
Ainda está na memória a lembrança do que ocorreu entre o fim de 2001 e o início de 2002, quando um a um vários oficiais das Forças Armadas venezuelanas instalaram-se na Praça Altamira, de Caracas, até que Chávez abandonasse o poder.
O protesto foi vencido pelo passar do tempo. Ignorados por Chávez e em meio a um golpe de Estado falido e a quase três meses de greve nacional, muitos dos que participaram do ato acabaram esquecidos.