Lucía Topolansky admite aos jornalistas que está cansada. A poucos dias das eleições municipais uruguaias, que serão realizadas neste domingo, a mulher do ex-presidente do país, o carismático José Mujica, está engajada numa campanha sem garantia de final feliz.
Ela é candidata à prefeitura de Montevidéu.
Embora conte com o apoio explícito de Mujica, que lhe foi de grande valia para ser a candidata mais votada do Senado uruguaio para a legislatura de 2010 a 2015, Topolansky tem um adversário à altura no pleito de domingo: o ex-ministro socialista Daniel Martínez, vários pontos à frente dela nas pesquisas de intenções de voto - embora Martínez também seja da Frente Ampla, a coalizão de partidos de esquerda ao qual Topolanksy e Mujica pertencem.
A lei uruguaia permite que mais de um candidato do mesmo partido concorra ao pleito.
A esquerda poderá, assim, eleger seu sexto governo consecutivo na capital uruguaia, enquanto a oposição tentará avançar na conquista das prefeituras do interior do país.
Guerrilha
A ex-primeira-dama, de 70 anos, tem décadas de ativismo político, incluindo participações na guerrilha e "temporadas" na prisão.
Mas foi como articuladora do governo do marido que sua figura ganhou maior dimensão nacional e internacional: com o apoio crucial do congresso, Mujica conseguiu passar leis como as de legalização da maconha e do aborto, assim como do casamento gay.
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A participação de Topolansky no processo contrasta com a fama de durona, que lhe valeu o apelido de "Tronca" (tronco em espanhol).
Filha de um empresário da construção civil, Topolansky nasceu numa família abastada e estudou em um colégio de freiras dominicanas. No fim da década de 60, porém, abandonou os estudos de arquitetura e se juntou à luta armada no Uruguai, mais precisamente ao movimento MLN-Tupamaros.
Nesse grupo de guerrilha urbana de esquerda influenciado pela Revolução Cubana e o marxismo, Topolansky passou anos na clandestinidade. E foi fugindo do aparato de segurança uruguaio que ela conheceu Mujica.
"O medo nos uniu", conta o ex-presidente no recém-lançado livro de memórias Uma Ovelha Negra na Presidência.
Mas quando tinham apenas poucos meses de namoro, Mujica e Topolansky foram presos. A mulher passaria quase 13 anos encarcerada, submetida a torturas e longos períodos de isolamento. Voltaram a se encontrar em 1985, com a aprovação da Lei da Anistia uruguaia.
Nunca tiveram filhos, mas compraram juntos a chácara nos arredores de Montevidéu que virou um dos símbolos da vida austera de Mujica.
Casaram-se em 2005.
"Dureza"
"(Ela) tem uma dureza feminina, que é diferente da dureza dos homens", diz Mujica sobre a esposa.
O ex-presidente rejeita a ideia de que ela seja menos pragmática que ele ("não a conhecem", responde), mas admite que os dois são políticos diferentes.
"Sim, talvez ela não tenha o carisma que eu tenho. Isso é provável", afirma Mujica. "Mas ela é sistemática como as abelhas. Uma trabalhadora daquelas infernais (obstinadas). Não é daquelas que fazem um fato histórico, mas das que constroem paredes."
Mas, para analistas políticos, a atividade parlamentar de Topolansky não se traduziu em respaldo popular.
"Lucía é vista como uma guerreira, uma mulher tenaz", mas não conseguiu construir uma imagem "de alguém com capacidade de gestão, apesar de ter sido uma articuladora de primeiro nível no Congresso", afirma Ignacio Zuasnábar, do instituto de pesquisas Equipos.
"Ela não tem uma projeção própria nem uma figura para que o eleitorado possa pensar que ela seria uma boa prefeita", opina o deputado Ope Pasquet, do opositor Partido Colorado.
Uma derrota nas eleições de domingo seria um revés para Topolansky, mas estaria longe de significar o fim da carreira política para uma mulher que ainda é senadora e sobreviveu a um câncer de mama.
O próprio Mujica minimiza a eventual derrota e diz que a candidatura da mulher enriqueceu a eleição. "Se não (tivesse concorrido), (a campanha) teria sido uma chatice."