Nicolás Maduro completou no domingo dois anos como presidente da Venezuela, em meio tanto a problemas herdados do predecessor Hugo Chávez quanto a outros surgidos em seu governo e incertezas diante do terceiro ano de mandato.
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Muitas das dificuldades hoje enfrentadas pela população venezuelana derivam da diminuição da produção e do colapso do preço do petróleo e dos enfrentamentos de Maduro com a oposição e seus atritos com outros governantes dentro e fora da América Latina, por exemplo.
Somam-se a isso a falta de segurança pública, o colapso da produção industrial, a deterioração da infraestrutura energética e dos serviços públicos, além da violência política, da violação de direitos humanos e das restrições ao acesso à informação. Há ainda a corrupção administrativa e o desequilíbrio causado tanto pelo modelo econômico vigente quanto pelo duro controle do câmbio, com declínio nas importações, escassez de bens básicos e inflação crescente.
Mesmo assim, alguns analistas acreditam que, nos últimos 12 meses, o governo de Maduro deu passos rumo a uma gestão menos dogmática em termos ideológicos e mais pragmática em termos políticos e econômicos. Outros, no entanto, atribuem ao "homem forte" de Caracas um limitado talento para liderar, que ele não conseguiu superar nem mesmo depois de obter poderes especiais para legislar, por decreto, em duas oportunidades distintas.
Segundo Víctor Mijares, do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (Giga), o resultado é o fato de o país ser visto, em todo o mundo, como um "Estado que começa a falhar".
"A situação não é boa para o líder venezuelano e pode piorar, porque as sequelas da queda dos preços do petróleo só serão percebidas este ano. Ao ver restringido seu espaço de manobra, o mais provável é que Maduro tenha de atiçar a polarização política, como já fez no Panamá durante a 7ª Cúpula das Américas", afirma Nikolaus Werz, cientista político da Universidade de Rostock.
Uma das perguntas feitas no momento é se Diosdado Cabello, presidente da Assembleia Nacional, seguirá como um rival perigoso para o atual chefe do governo. "Cabello não tem nada a ganhar e, sim, muito a perder numa disputa de poder com Maduro. Sua atual posição é, na verdade, muito mais cômoda, porque quando algo crítico acontecer, sempre poderá dizer: 'Maduro, marionete de Chávez, não soube governar'", diz Wertz. "Mas ninguém se atreveria, neste momento, a substituir Maduro."
Perspectivas econômicas pouco promissoras
Todos, inclusive governos opositores, parecem abster-se temporariamente do enfrentamento com Maduro, na esperança de que a situação econômica melhore, ou seja, de que os preços do petróleo subam, acredita Werz.
O preço do barril poderá voltar a subir a partir de 2016, mas, segundo Alejandro Márquez, especialista em economia latino-americana da Universidade Livre de Berlim, este não é o único fator do qual a recuperação da economia venezuelana depende.
"Em 2012, com Chávez na presidência, a inflação era de 20%. Um ano depois, saltou para 56%. E, em 2014, chegou a 70%. Se a empresa estatal Petróleos de Venezuela continuar pegando créditos do Banco Central Venezuelano (BCV), a inflação continuará aumentando, independentemente do valor do petróleo", aponta Márquez.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) já anunciou que a Venezuela poderia ter inflação de 100% ao final deste ano. E essa projeção reflete o fato de que, provavelmente, o governo tentará aumentar o gasto público diante das eleições legislativas.
As perspectivas para o PIB também não são promissoras para a Venezuela de Maduro. Em 2012, foi registrado um crescimento econômico de 5,6%; em 2013, de 1,3%. "Não se sabe como terminou o ano passado porque o Banco Central Venezuelano (BCV) ainda não publicou os dados do último trimestre de 2014, mesmo que seja obrigado, por lei, a fazê-lo", diz Márquez. Para 2015, o FMI prevê retração econômica pelo segundo ano consecutivo, de 7%.
Influência internacional
Com exceção do turismo e das empresas capazes de exportar seus produtos, nenhum outro setor produtivo pode prosperar à sombra do bolívar enfraquecido. E muitos empresários afirmam que as políticas chavistas impulsionaram a produção em países vizinhos enquanto deixavam a economia venezuelana de lado.
"Na última década, o valor das subvenções petroleiras, das ajudas financeiras e das importações da Venezuela chegou a 500 bilhões de dólares", afirma Ivo Hernández, cientista político da Universidade de Münster.
Isso contribuiu para que o Brasil, a Colômbia e outros vizinhos tenham apresentado crescimento econômico considerável e balanças comerciais favoráveis, aponta. "Agora, quando o motor venezuelano deixa de funcionar, o resto do continente sente", afirma o especialista.
As alianças construídas pela Venezuela nos últimos 12 anos só foram possíveis porque se baseavam na conveniência econômica dos parceiros, e isso permitiu que o chavismo gozasse de solidariedade na região, diz Hernández. "O problema é que, quando acaba o talão de cheques venezuelano, acaba também o respaldo externo."
Para o cientista político, Chávez desmantelou a chancelaria venezuelana ao colocar a política externa nas mãos de funcionários com menor capacidade intelectual do que ele próprio e sem nenhuma formação para o cargo. Com isso, a Venezuela perdeu a influência que tinha na América do Sul, Central e nas Antilhas.
O peso que a Venezuela perdeu na região ficou evidenciado, aos olhos de Hernández, durante a recente Cúpula das Américas, no Panamá. Para ele, o país foi somente "mais um" nas negociações para a reaproximação entre Cuba e Estados Unidos.
"Minha tese, pessoalmente, é de que a Venezuela, um país economicamente mais forte, não é um Estado independente, mas sim influenciado administrativa e politicamente por Cuba, que é mais fraca [em termos econômicos]. A Venezuela perdeu muito terreno, em sentido figurado e literal", afirma.