Uruguai: ofuscado pela fama de Mujica, Vázquez toma posse

Vázquez admitiu que Mujica "é uma figura importantíssima no contexto nacional e internacional"

1 mar 2015 - 11h00
(atualizado às 12h12)
Especialistas acreditam que a fama do ex-presidente vai pesar sobre Vázquez
Especialistas acreditam que a fama do ex-presidente vai pesar sobre Vázquez
Foto: Miguel Rojo / AFP

Sob a sombra da fama mundial alcançada por José Mujica, Tabaré Vázquez assumiu neste domingo (01) a presidência do Uruguai com o desafio de manter a expansão econômica, avançar no bem-estar social e levar a maconha às farmácias, uma herança que incomoda este militante antitabaco.

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Ao prestar juramento ante o Parlamento neste domingo, este oncologista de 75 anos que foi em 2005 o primeiro presidente de esquerda do país se desvinculou do estilo de Mujica, que com sua austeridade, linguagem simples e discurso anticonsumista ganhou fama mundial.

Com um impecável terno preto e falando pausadamente, e depois de lamentar como "a violência, o medo, o terror, a intolerância vencem em diferentes regiões do planeta", Vázquez dedicou a maior parte de seu discurso de 24 minutos a lembrar do pensamento do herói nacional José Artigas, prometendo que valores como a igualdade, a liberdade e a tolerância serão referências de seu governo.

Vázquez chega à presidência "como há dez anos, decidido a realizar", segundo o cientista político Adolfo Garcé em declarações à rádio Uruguay.

A capacidade de ação deste oncologista, empresário e maçom ficou demonstrada poucos dias após sua vitória no segundo turno sobre o centro-direitista Luis Lacalle Pou - com 53,6% dos votos - ao anunciar seu gabinete sem consultar Mujica ou respeitar quotas políticas.

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O presidente planeja anunciar durante a noite as primeiras disposições de seu governo, que incluirão melhorar a gestão de governo, criar um sistema nacional de cuidados e um imposto às grandes extensões de terra.

Fiel ao seu estilo até o último dia, Mujica chegou no meio da manhã à sede da presidência em seu já famoso Fusca azul.

"Estou feliz por que há 30 anos a democracia voltou e há dez o povo chegou ao governo", declarou à AFP María del Carmen Sosa, de 51 anos, que com uma enorme bandeira sobre os ombros se dirigia à praça para ver Mujica e Vázquez protagonizem o momento mais esperado do dia, com a transferência da faixa presidencial.

"Tabaré é mais estruturado e 'Pepe' o mais simples, mas os dois fizeram governos bons que sempre estiveram voltados para o povo, para os mais pobres, para os necessitados", disse a mulher.

Mujica, que deixa o cargo com uma popularidade superior a 60%, foi o senador mais votado, e continuará atuando na política interna nos próximos cinco anos.

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Vázquez admitiu neste domingo que Mujica "é uma figura importantíssima no contexto nacional e internacional".

"Tem que ser um ponto de referência de primeira ordem", sustentou.

Para o doutor em Ciência Política Jorge Lanzaro, "a fama de Mujica pesa sobre Vázquez".

"É um contraste permanente, uma rivalidade bastante surda e às vezes não tão surda", comentou à AFP.

A cerimônia de posse é acompanhada por vários presidentes, entre eles Dilma Rousseff, a chilena Michelle Bachelet, Raúl Castro de Cuba, Rafael Correa do Equador, Horácio Cartes do Paraguai e Ollanta Humala do Peru, além de dezenas de delegações oficiais de todo o mundo.

A grande ausente é a presidente da Argentina, Cristina Kirchner, cujo governo teve atritos com o uruguaio.

Também cancelaram sua participação, no último minuto, o vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e o líder venezuelano, Nicolás Maduro, o primeiro devido a uma gripe e o segundo pela situação política em seu país.

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Diferentemente de Mujica, Vázquez receberá o governo sem o celebrado "vento de cauda" dado nos últimos anos à economia local pelos altos preços de commodities como a soja e a carne e pela expansão da região.

Após doze anos de crescimento econômico ininterrupto e desemprego em níveis historicamente baixos, a economia uruguaia deverá superar um contexto regional no qual seus dois grandes vizinhos, Argentina e Brasil, mostram sinais de desaceleração.

Conter a inflação, que supera em mais de um ponto a meta do governo (3% a 7%) e manter na linha um crescente déficit fiscal serão os desafios de Vázquez e de sua equipe econômica que, como na última década, será liderada pelo vice-presidente de Mujica, Danilo Astori.

Após a concretização, no período de Mujica, de velhas aspirações da esquerda, como a descriminalização do aborto, à qual Vázquez se opôs durante sua gestão, e a legalização do casamento homossexual, o presidente deverá se voltar para a educação e para uma infraestrutura deteriorada, mas também implementar a venda de maconha sob controle estatal, algo que Mujica deixou pendente.

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