Os colombianos vão às urnas neste domingo de olho em duas candidaturas que carregam consigo a marca do controvertido ex-presidente Álvaro Uribe.
Mas enquanto o foco de preocupação dos eleitores está em problemas como desemprego, saúde, moradia e educação precárias, vizinhos como o Brasil observam com preocupação a continuidade - ou não - do diálogo de paz que pode pôr fim a mais de meio século de conflitos com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
"Para o Brasil, a questão mais importante desse resultado eleitoral é a aposta na saída política para o conflito armado", afirmou uma fonte diplomática brasileira à BBC Brasil.
Para surpresa interna e dos países da região, o atual presidente e candidato à reeleição, Juan Manuel Santos - eleito há quatro anos graças à popularidade de Uribe -, decidiu abandonar a política linha-dura de seu antecessor e aplicada por ele quando à frente do Ministério de Defesa e apostar no caminho político para tentar resolver o conflito armado colombiano.
Há 18 meses, Santos e as Farc negociam um acordo de paz, que entre outros aspectos discute a execução de uma política agrária - ponto central da guerra - e pode abrir caminho à participação dos guerrilheiros na vida política, após a renúncia às armas.
"Santos ficou mais em sintonia com a região, não porque tenha abandonado seus ideais, mas porque assumiu o poder numa perspectiva regional favorável a este diálogo (com as Farc). É uma mudança estratégica", opinou à BBC Brasil Luis Fernando Ayerbe, coordenador do Instituto de Estudos Econômicos e Internacionais da Unesp.
No outro lado da disputa eleitoral, a ala radical conservadora de Óscar Iván Zuluaga - cuja candidatura foi apadrinhada por Álvaro Uribe - defende a via militar para derrotar a guerrilha.
A beligerância de Zuluaga é apontada como um possível foco de preocupação no Itamaraty, que tem se manifestado a favor do diálogo de paz colombiano. Em nota emitida nesta quinta-feira, a Chancelaria brasileira afirmou que "o Brasil reitera seu apoio ao processo de paz e sua confiança em que o conflito interno na Colômbia possa ser solucionado pela via do diálogo".
Além do tráfico de armas, do êxodo da população refugiada e do narcotráfico, a "internacionalização" do conflito colombiano na era Uribe-Bush incrementou a presença militar norte-americana na Colômbia, colocando sob alerta a região com a proposta de ampliação das bases militares dos EUA na Colômbia. "O conflito permite a entrada de forças militares estrangeiras alheias à nossa região e isso nos preocupa", afirmou a fonte diplomática.
Ao longo da corrida presidencial, Zuluaga cresceu nas pesquisas de intenção de voto, alcançando um empate técnico com Santos. Mas a revelação de um vídeo, na reta final da campanha, no qual o candidato aparece envolvido num suposto plano para vazar informações sigilosas das negociações entre Santos e as Farc, pode afetar sua candidatura.
Nesta semana, Zuluaga apresentou uma perícia que concluiu que o vídeo seria uma montagem.
Venezuela
Outro elemento destacado por analistas políticos é o "fator Venezuela" dentro da estabilidade regional.
A ala radical da oposição venezuelana cobra uma ação mais ofensiva de Santos na atual crise política entre o governo de Nicolás Maduro e a oposição. Meses antes do início dos protestos, o dirigente político Leopoldo López, principal expoente dos radicais, foi a Bogotá reunir-se com Álvaro Uribe.
O encontro gerou reação entre os governistas venezuelanos, que acusam o ex-presidente colombiano de participar de planos para derrocar o governo do país vizinho.
A Colômbia, no entanto, é um dos observadores da Unasul (União das Nações Sul-Americanas) e participa, junto a Brasil e Equador, do processo de diálogo entre o governo venezuelano e a coalizão opositora MUD em nova tentativa de solucionar a crise.
Esse perfil mais pragmático e menos ideológico nas relações com Caracas foi outro ponto de distância entre Santos e seu mentor político. Imediatamente após assumir a Presidência, Santos reestabeleceu relações com o governo de Hugo Chávez (morto em março de 2013), dando fim ao enfrentamento derivado pela disputa ideológica entre Uribe e Chávez.
Comércio e Unasul
No plano econômico, o crescimento da Colômbia, que pode superar em breve a economia argentina, entusiasma os investidores brasileiros. Em 2012, os investimentos do Brasil no país foram de US$ 383 milhões, e em 2013, de US$ 271 milhões, de acordo com a Câmara Colombo-Brasileira.
O país tem sido elogiado por investidores por adotar uma política fiscal mais prudente e por investimentos em infraestrutura.
Porém, o fato de a fronteira Brasil-Colômbia ser ocupada pela Amazônia impede que o comércio bilateral seja mais fluido, apontou Andrés Molano, professor de Relações Internacionais da Universidade do Rosário de Bogotá. "A relação é muito menos harmônica do que seria desejável. (A fronteira amazônica) dificulta a relação comercial."
Na opinião de Luis Fernando Ayerbe, por razões históricas e da composição da economia colombiana - mais voltada à região andina e aos EUA -, a preocupação do Brasil reside mais no campo geopolítico do que comercial quando o assunto é Bogotá.
Para o especialista, manter o controle de questões estratégicas, como o funcionamento da Unasul, é o que mais importa a Brasília.
Durante a campanha colombiana, o candidato Zuluaga disse que a Unasul abandonou a defesa das bases democráticas qualificando-a como um bloco "castro-chavista", expressão defendida por Uribe. Para o analista colombiano Andrés Molano, o uribismo tradicionalmente se opõe à Unasul, o que poderia gerar rusgas com o Brasil.
Outros três candidatos na disputa eleitoral deste domingo são o ambientalista Enrique Peñalosa, a também conservadora Marta Lucía Ramírez e a esquerdista Clara López. Com 12% de indecisos, a eleição ganha um tom de imprevisibilidade e um quase provável segundo turno, previsto para 15 de junho.
O que não deve mudar, de acordo com o analista colombiano Andres Molano, é a orientação política do país. "Em qualquer caso, a Colômbia continuará à direita do espectro político da região".