A explosão de aparelhos de mensagem do tipo pager usados pelo grupo armado Hezbollah, no Líbano, deixou ao menos nove pessoas mortas e milhares de feridos nesta terça-feira (17/9), informou o Ministério da Saúde do país.
O Hezbollah afirmou que oito membros do grupo foram mortos nos ataques. Além deles, morreu também uma menina em meio às ocorrências.
O Líbano e o Hezbollah, grupo que também atua como um partido político, responsabilizaram Israel pela explosão dos aparelhos, também chamados no Brasil de "bipe" e muito usados no passado para troca de mensagens.
As explosões teriam acontecido em diversos lugares, incluindo ruas, supermercados e barbearias.
O governo libanês afirma que 200 dos cerca de 2.800 feridos estão em estado crítico.
Entre os feridos, está o embaixador do Irã no Líbano, Mojtaba Amani. A esposa dele disse à imprensa que ele ficou "levemente ferido" por uma das explosões e que estava "bem" no hospital.
O Centro Médico LAU, em Beirute, precisou limitar o número de pessoas que pode entrar em suas instalações.
"É muito delicado e algumas cenas são horríveis", disse um membro da equipe do hospital à BBC.
A maioria dos ferimentos ocorreu na cintura, rosto, olhos e mãos, disse ele.
"Muitas vítimas perderam dedos, em alguns casos todos eles", disse a fonte.
Em um comunicado, o Hezbollah disse que Israel, que classificou como um "inimigo traidor e criminoso", "certamente" iria receber "o castigo justo por esta agressão pecaminosa, queira ou não".
O grupo armado apoiado pelo Irã, com sede no Líbano, tem sido inimigo de Israel há décadas. Os combates entre os dois lados se intensificaram nos últimos meses, princupalmente após início do guerra em Gaza, aumentando o receio de uma guerra total.
O governo do Líbano também culpou as autoridades israelenses. O ministro da Informação do país, Ziad Makary, condenou as explosões de pagers como um "ataque israelense", de acordo com a emissora libanesa Al-Manar TV.
Israel ainda não comentou sobre o ocorrido.
As explosões
A agência de notícias estatal do Líbano informou que ocorreram explosões nos subúrbios de Beirute e em outras áreas do país.
A emissora de televisão Al-Manar, ligada ao Hezbollah, também noticiou a explosão de muitos pagers, sem identificar os feridos.
Vídeos e fotos compartilhados nas redes sociais mostram homens feridos sentados ou deitados no chão, e outros sendo transportados para hospitais.
Imagens de câmeras de segurança não verificadas mostram explosões em lojas.
Um membro do Hezbollah disse à agência de notícias Reuters que se tratou da "maior falha de segurança [do grupo]" desde que as hostilidades com Israel se intensificaram há 11 meses, em paralelo à guerra de Gaza.
Em um primeiro comunicado, o Hezbollah classificou as explosões como "misteriosas" e disse que elas causaram a morte de, pelo menos, três pessoas.
"Explodiram pagers que pertenciam a funcionários de várias unidades do Hezbollah e instituições", disse a milícia armada em um comunicado, acrescentando que no incidente morreram "uma jovem e dois de nossos irmãos".
O grupo acrescentou que estava conduzindo uma "ampla investigação de segurança e científica" sobre as causas das detonações "simultâneas".
Um ex-perito em munições do Exército britânico, que pediu para não ser identificado, disse à BBC que os dispositivos provavelmente estavam carregados com entre 10 a 20 gramas de explosivo de alta qualidade, escondido dentro de um componente eletrônico falso.
Logo após as explosões, muitos apontaram para a possibilidade de um ataque hacker que poderia ter causado o superaquecimento das baterias dos pagers e as explosões — o que seria completamente inédito.
De acordo com Joe Tidy, repórter de cibersegurança da BBC, especialistas estão apontando para o fato de que as imagens das explosões não são consistentes com um possível superaquecimento de uma bateria.
Silêncio em Israel
Desde que o grupo armado palestino Hamas lançou o surpreendente e mortal ataque contra Israel no dia 7 de outubro, dando início à guerra em Gaza, a fronteira do Líbano se tornou uma espécie de segundo front, onde o Exército de Israel tem trocado fogo com o Hezbollah.
As Forças de Defesa de Israel (IDF) ainda não comentaram as explosões ocorridas nesta terça-feira no Líbano.
No entanto, os acontecimentos ocorreram horas depois de o gabinete de segurança de Israel definir como objetivo oficial da guerra o retorno seguro de 60 mil residentes ao norte do país, que haviam sido deslocados pelos ataques do Hezbollah.
"O gabinete de segurança atualizou os objetivos da guerra para incluir o seguinte: levar os moradores do norte de forma segura às suas casas", disse o escritório do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu.
"Israel continuará a agir para implementar esse objetivo."
Na segunda-feira (16/9), o ministro da Defesa israelense, Yoav Gallant, afirmou durante uma reunião com o enviado americano Amos Hochstein que a única maneira de levar de volta os residentes ao norte de Israel seria por meio de uma "ação militar".
"A possibilidade de um acordo está se esgotando, já que o Hezbollah continua 'se ligando' ao Hamas e se recusa a por fim ao conflito", afirmou um comunicado de seu escritório.
Israel advertiu repetidamente que poderia lançar uma operação militar para expulsar o Hezbollah da fronteira.
Em seu comunicado, o Hezbollah reiterou seu "apoio e respaldo à corajosa resistência palestina".
Análise: 'Devastor para o Hezbollah'
De Paul Adams, jornalista da BBC especializado em diplomacia
É difícil imaginar um ataque mais calculado para espalhar medo e confusão.
O Hezbollah depende em grande medida de pagers para as comunicações do grupo.
Os telefones celulares foram abandonados há muito tempo por serem muito vulneráveis, como demonstrou o assassinato, por parte de Israel, do fabricante de bombas do Hamas, Yahya Ayyash, em 1996.
Os membros do Hezbollah foram vítimas de explosões em supermercados, nas ruas, em automóveis, em suas casas e até mesmo em barbearias.
Incidentes foram relatados por todo o Líbano, desde Beirute até o vale do Bekaa, e até mesmo na vizinha Síria.
Cada explosão pode ter sido pequena, mas algumas causaram danos catastróficos.
Em um momento em que Hezbollah e Israel estão envolvidos em uma guerra de baixa intensidade, esses ataques terão consequências devastadoras para a força de trabalho, as comunicações e o moral do Hezbollah.
Israel ainda não comentou, mas é evidente que foi obra deles.
É o prelúdio de um ataque maior? O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, disse na segunda-feira ao enviado americano Amos Hochstein que Israel "faria o que fosse necessário para garantir sua segurança".
Ainda não há sinais de que esteja sendo reunido o número de homens e veículos blindados necessários para uma grande incursão militar no sul do Líbano, mas os ataques de hoje representam uma nova escalada e é difícil imaginar que o Hezbollah não se sinta obrigado a responder de alguma forma.