A BBC Brasil consultou leitores no fim de novembro sobre o que gostariam de saber sobre o presidente eleito dos Estados Unidos, o republicano Donald Trump.
As mais de 200 mensagens enviadas traziam um rol extenso de temas, abrangendo desde o futuro da relação americana com Cuba às consequências para a relação com o Brasil.
Com o objetivo de contemplar a maioria dos leitores, três dos questionamentos mais frequentes foram a votação popular para que fosse escolhido qual seria respondido em uma matéria.
Com 293 votos, foi selecionada a questão sobre os impactos - positivos e negativos - da eleição de Trump e suas propostas para seu mandato, analisadas a seguir.
Investimentos e cortes
Em seu primeiro discurso após a vitória na eleição de 8 de novembro, o primeiro tema mencionado por Trump foi o investimento em infraestrutura.
Ele prometeu melhorias nas regiões centrais das metrópoles americanas em estradas, pontes, túneis, aeroportos, escolas e hospitais.
"Colocaremos milhões para trabalhar", disse.
Seu objetivo é criar empregos em setores como construção, siderúrgica, transportes, recursos hídricos, telecomunicações e energia. E também sinaliza que protegerá os existentes ao afirmar que taxará em 35% os produtos de empresas que demitirem americanos para abrir fábricas em outros países.
Ao mesmo tempo, afirmou que reduzirá impostos cobrados de cidadãos e empresas e desregulamentará setores da economia que acredita estarem impedindo a criação de postos de trabalho.
Trump conta com um Congresso de maioria republicana para implantar seu pacote de estímulo - caso não enfrente oposição dentro do próprio partido - e buscar fazer com que a economia do país cresça acima da média anual de 2,2% durante os dois mandatos de Barack Obama.
No entanto, muitas de suas políticas encontram resistência entre os republicanos. Durante a campanha, veteranos do partido, como Colin Powell e Mitt Romney, criticaram o presidente eleito e negaram apoio à candidatura.
Se conseguir superar a resistência e obtiver sucesso, o Brasil poderia ser beneficiado pelo fortalecimento de uma atividade econômica mais forte americana - os EUA são seu segundo maior parceiro comercial, atrás apenas da China.
Ao mesmo tempo, Trump inverteu a lógica tradicional republicana de defender o livre comércio ao propor renegociar acordos comerciais firmados pelo país a fim de preservar empregos no país e reduzir o déficit americano nas transações com o resto do mundo. Se o empresário colocar essas ações em prática, o Brasil sairia prejudicado.
O Brasil (e a América Latina) não foi tratado como tema prioritário na sua campanha. Em 2015, Trump citou o Brasil ao listar países que, segundo ele, tiram vantagem dos EUA por meio de práticas comerciais "injustas". A balança comercial entre os dois países, porém, é favorável aos americanos.
Imigração
O presidente eleito prometeu diversas vezes durante a campanha deportar os 11,3 milhões de imigrantes em situação irregular no país, uma medida que teria um forte impacto sobre a comunidade brasileira. Estima-se, com base em números do Ministério das Relações Exteriores, que mais de um milhão de cidadãos do Brasil vivam nos EUA, boa parte sem documentos.
Mas, desde a vitória, Trump suavizou este discurso, afirmando que seriam deportados entre 2 e 3 milhões de imigrantes ilegais com histórico criminal. No entanto, ele pode ter dificuldade para cumprir mesmo essa promessa revisada por causa da complexidade financeira e logística.
Trump diz agora que protegerá o "bem-estar econômico de imigrantes legais" e que a admissão de novos imigrantes levará em conta suas chances de obterem sucesso nos EUA. Em tese, isso favoreceria brasileiros com alta escolaridade e habilidades específicas que queiram emigrar para o país.
Se confirmada, a expulsão dos ilegais afetaria diretamente a economia latino-americana. Estima-se que a região receba anualmente cerca de US$ 65 bilhões (R$ 218 bilhões) em remessas enviadas pelos imigrantes que vivem nos EUA.
Outra grande polêmica neste ponto é a promessa de construir um muro na fronteira com o México. Rudy Giuliani, ex-prefeito de Nova York e um dos conselheiros mais próximos de Trump, confirmou que o plano se mantém, mas o presidente admitiu que uma cerca poderá ser usada em determinados trechos.
Meio ambiente
Na corrida pela Casa Branca, o empresário disse que as mudanças climáticas são uma farsa e prometeu interromper o envio de dinheiro para programas da ONU de combate a elas - ainda que, após a vitória, tenha afirmado haver "alguma mudança" e estar mantendo sua "mente aberta" quanto ao assunto
O presidente eleito afirmou ainda que os EUA, sob seu comando, retirarão seu endosso ao Acordo de Paris, em que 195 nações concordaram, no ano passado, em reduzir as emissões de carbono. E que fará uma revisão radical na política ambiental do antecessor, Barack Obama - o empresário classifica restrições a empresas de energia, por exemplo, como "assassinas de postos de trabalho".
O presidente eleito também disse que estimulará a extração de gás e petróleo em terra federais, na contramão da medida tomada por Obama de impor uma moratória de três anos para as concessões na área enquanto são estudados os impactos ambientais da atividade.
Trump provavelmente enfrentará forte resistência a esta medida entre ambientalistas dentro e fora do Congresso e na Justica, além de ter de lidar com as legislações próprias de 29 Estados, que determinam que uma parte crescente de sua energia venha de fontes renováveis.
Relações internacionais
Trump disse após a morte de Fidel Castro que dará fim a reaproximação com Cuba se o país caribenho não oferecer um "acordo melhor para o povo cubano, os cubanos-americanos e os EUA como um todo".
A retomada de relações diplomáticas e o relaxamento de restrições comerciais entres os dois paises foram um marco do segundo mandato de Obama, que fez uma visita histórica à ilha em março. O próximo passo seria o fim do embargo a Cuba imposto pelos EUA.
Mas Trump acusou o atual presidente americano de dar muito a Cuba e receber pouco em troca. O diretor de comunicações de Trump, Jason Miller, disse que Trump deseja ver a "liberdade em Cuba para os cubanos e um bom acordo no qual americanos não sejam feitos de bobos".
Por outro lado, o presidente eleito acredita poder melhorar as relações com um antigo aliado cubano: a Rússia. Trump já elogiou seu presidente, Vladimir Putin, por sua "forte liderança" e mantém uma boa relação com ele.
Mas há tensão atualmente por conta da presença de EUA e Rússia em lados opostos na guerra civil em curso na Síria.
Trump foi vago quanto a como seria essa melhor relação e apenas manifestou o desejo de que russos e americanos lutem lado a lado contra o grupo extremista autodeclarado Estado Islâmico.
Por outro lado, já afirmou que o acordo fechado entre os EUA e o Irã, que também tem um papel-chave no conflito sírio, foi "um dos piores já negociados" e que dar fim a ele será sua "prioridade número um".
Em 2015, o Irã concordou com restrições ao seu programa nuclear em troca da suspensão de sanções econômicas por outras cinco potências globais além dos EUA: Rússia, China, Reino Unido, França e Alemanha.
Caso Trump leve a cabo sua promessa, isso teria um grande impacto no Oriente Médio. Hoje, os iranianos mantêm uma relação conflituosa com dois dos principais atores da região, a Arábia Saudita e Israel.
Mas permanece a dúvida do que é apenas retórica de campanha e quais serão as medidas tomadas por ele de fato.