Uma série de fotografias divulgadas recentemente do líder norte-coreano Kim Jong-un chamaram a atenção por um detalhe em comum: em todas elas, ele está rodeado por oficiais e generais fazendo anotações em cadernos idênticos.
As fotografias, da Agência de Notícias Central (KCNA) no país, mostram Kim Jong-un observando uma unidade de mulheres do Exército que realizavam a simulação do lançamento de um míssil.
Ele também é visto caminhando em um porto pesqueiro, conversando com um piloto que faz um voo de treinamento e desfrutando das instalações de um acampamento juvenil reformado.
Mas quem são aqueles homens fazendo tantas anotações? Eles não são jornalistas, e sim soldados, membros do partido ou funcionários do governo, segundo o professor James Grayson, especialista em Coreia do Norte da Universidade de Sheffield, na Inglaterra.
De acordo com Grayson, o que se quer demonstrar ali é o suposto poder do líder, seu conhecimento, sabedoria e preparação. É uma espécie de "aula in loco" que Kim dá a seus seguidores, uma prática que começou com seu avô Kim Il-sung nos anos 1950. "É parte da imagem do grande líder que oferece conselhos benevolentes."
Orientação prática
E do que se tratam esses conselhos? Se Kim estiver seguindo os passos do seu avô, podem ser orientações práticas muito específicas.
Depois que Kim Il-sun visitou uma peixaria em 1976, a KCNA escreveu: "Observando um caminhão em funcionamento, o presidente disse que a caçamba parecia pequena comparada com a capacidade do motor. Ele disse que o problema seria resolvido se a caçamba fosse ampliada. Depois, a capacidade da caçamba do caminhão aumentou de 800 quilos a duas toneladas. Como resultado, 20 caminhões agora podiam transportar o que antes 50 caminhões transportavam."
Apesar de tablets estarem disponíveis no país, cadernos continuam sendo o suporte favorito para anotações.
"São imagens que vão ser mostradas na televisão e na mídia estatal, então os homens que estão ali querem ser vistos registrando cada palavra de Kim Jong-un", diz Grayson.
"O objetivo é apresentá-lo como alguém de vasto conhecimento, mas é um tanto ridículo. Ele não tem como saber sobre tantas coisas diferentes. No entanto, é importante que os burocratas que o rodeiam absorvam atentamente suas palavras."
De acordo com o professor Steve Sang, da Escola de Estudos Chineses Contemporâneos da Universidade de Nottingham, os "anotadores" se esforçarão para escrever tudo com muito cuidado.
"Eles não querem escrever nada que seja politicamente impreciso, porque isso pode custar caro", afirma.
As anotações não costumam ser publicadas ou ficar disponíveis para o público, segundo Tsang. "Se algo sair delas, seria através do departamento de propaganda. Se o que for publicado corresponder realmente às anotações ou se é diferente do que o líder realmente disse no momento, não importa. Ninguém irá questionar. Se você está, por exemplo, em uma fábrica, e o conselho que foi divulgado não é o mesmo que você anotou, o que poderia fazer a respeito?"