A tímida e conservadora Park Geun-hye, única mulher que conseguiu se tornar presidente da Coreia do Sul, deixa o poder fazendo de novo história ao se transformar no primeiro líder democrático do país a ser cassado por conta de um famoso caso de corrupção.
Sua relação com sua inseparável amiga e confidente Choi Soon-sil, conhecida como "A Rasputina" sul-coreana, a levou nesta sexta-feira ao Tribunal Constitucional do país asiático onde foi ratificada de maneira unânime sua destituição, lhe tirando o poder de forma humilhante.
A agora ex-presidente de 65 anos, filha do falecido ditador Park Chung-hee, é acusada de ter confabulado na extorsão a grandes empresas com sua amiga, a quem permitia interferir em assuntos de Estado.
Park alcançou em fevereiro de 2013 a presidência de um país onde 80% dos deputados são homens e a imensa maioria de instituições e empresas quase não possui representante feminino em altos cargos.
A política discreta, conhecida por sua capacidade limitada de oratória, voltou a fazer história ao se tornar na primeira moradora da Casa Azul, residência oficial do Governo, a sofrer um impeachment nas três décadas da jovem democracia sul-coreana.
Desde a infância sua ligação com a política foi intensa e trágica ao mesmo tempo.
Tinha 11 anos quando seu pai chegou ao poder e acabou instaurando um governo autoritário durante quase duas décadas, que é lembrado tanto para o progresso notável que levou ao "milagre econômico" do país, como pela dura repressão dos cidadãos e graves violações dos direitos humanos.
O assassinato de sua mãe em Seul, em 1974 (Park estava com 22 anos e se acabava de formar em engenharia elétrica), nas mãos de um seguidor fiel do regime norte-coreano, a forçou a assumir o papel de primeira-dama.
Foi então quando Park começou sua relação com a agora conhecida como "Rasputina" e o pai dela, Choi Tae-min, líder de uma seita religiosa que se declarava mensageiro de sua falecida mãe.
A jovem, declarada admiradora da rainha Elizabeth II da Inglaterra, desempenhou o papel de primeira-dama até 1979, quando seu pai foi assassinado pelas mãos de seu próprio chefe de Inteligência.
Park, que nunca se casou nem tem filhos, esteve durante duas décadas afastada da vida pública até ocupar uma cadeira no parlamento em 1998.
A partir de então começou sua escalada nas fileiras do conservador Grande Partido Nacional, antecessor do Saenuri, onde se tornou em candidata e líder em 2011.
Seu mandato na presidência de quatro anos, que agora foi interrompido, esteve marcado em nível internacional pela alta tensão por conta da sempre difícil relação com a vizinha Coreia do Norte, produto da falta de vontade de diálogo em Seul e do aumento dos testes as crescentes provas armamentísticas de Pyongyang.
O momento mais crítico de seu mandato foi após o trágico naufrágio do ferry Sewol, que deixou mais de 300 mortos e desaparecidos, e provocou uma onda de indignação pela má gestão do episódio.
Park pediu desculpas e reconheceu que o governo não foi capaz de prevenir o desastre e falhou em sua resposta inicial. Após a crise política, que afundou sua popularidade, realizou vários mudanças no Executivo.
As reformas trabalhistas e educativas aprovadas por seu governo foram muito questionadas nas ruas, porém, foi no final do ano passado quando se tornou público o escândalo da "Rasputina", que começou a derrocada da agora ex-presidente sul-coreana.
As manifestações com participações históricas e que lotaram regularmente o centro de Seul para pedir sua destituição não foram suficientes e Park tentou sobreviver no poder até que o parlamento aprovou, no dia 9 de dezembro do ano passado sua destituição, ratificada hoje pelo Tribunal Constitucional.
Sem a imunidade garantida pelo cargo, a veterana política pode agora enfrentar um novo episódio trágico em sua biografia.
Park Geun-hye poderá ser julgada por corrupção e, se for condenada, trocará o conforto do Palácio presidencial, onde residiu grande parte de sua vida, para a dureza de uma prisão.