Depois de meses de campanha, a eleição presidencial de terça-feira nos Estados Unidos pode ter se resumido às duas questões que definiram a democrata Kamala Harris e o republicano Donald Trump desde o início: direito ao aborto e imigração.
Em mais de 65 entrevistas nos últimos dias, os eleitores voltaram a esses temas para explicar sua escolha para presidente dos EUA. Para muitos, experiências pessoais -- como pais, vizinhos ou amigos -- moldaram suas opiniões sobre o que é mais importante.
Embora a amostra seja muito pequena para se chegar a conclusões definitivas, ela fornece uma visão geral de como os norte-americanos podem estar pensando nos últimos dias da campanha.
Para os apoiadores de Trump, a necessidade de conter a imigração ilegal -- um tema central de sua Presidência -- é o motivo número um para votar no republicano, de acordo com os entrevistados. Preocupações econômicas e inflação alta foram frequentemente mencionadas como outras questões que motivaram os apoiadores de Trump, embora a economia dos EUA continue a crescer e a taxa de desemprego permaneça baixa.
"Conheço muitas pessoas que passaram por dificuldades pessoais durante o governo Biden", disse Justin Newhouse, 23 anos, um conservador de Milwaukee.
Para muitos apoiadores de Kamala, sua promessa de proteger o direito ao aborto depois que a Suprema Corte dos EUA anulou a decisão histórica de 1973 que reconhecia o direito constitucional ao procedimento é o motivo mais convincente para votar na vice-presidente democrata. A percepção de que Trump, que frequentemente faz comentários racistas e ofensivos, é um racista também foi frequentemente lembrada.
As entrevistas foram realizadas nos Estados em que se espera que a campanha seja decidida: Pensilvânia, Carolina do Norte, Geórgia, Nevada, Arizona, Michigan e Wisconsin. Aqui está um pouco do que os eleitores tinham a dizer sobre sua escolha:
"AS FRONTEIRAS TÊM SIDO UMA LOUCURA"
Heather Thomas, 49 anos, funcionária de uma loja de conveniência perto da Las Vegas Strip, em Nevada, disse que a principal questão por trás de seu voto em Trump é a imigração ilegal e o que descreveu como a devastação econômica e social que ela trouxe.
"A fronteira aberta significa o fim do nosso país", afirmou Thomas. "E com Biden e os outros democratas, as fronteiras ficaram uma loucura, totalmente abertas."
Thomas, que ganha 13 dólares por hora, disse acreditar que os democratas têm feito pouco com relação à imigração ilegal, embora o governo Biden tenha tomado medidas para conter as travessias de fronteira.
"Como o país deve cuidar de milhões de pessoas ilegais que vêm para cá quando não estamos nem mesmo cuidando de tantos americanos que estão lá fora vivendo nas ruas, que estão lutando para comer?", perguntou Thomas.
Thomas disse que, em suas interações diárias com pessoas pobres e sem-teto em sua loja, ela tem visto muito sofrimento.
MUDANÇA DE ATITUDE
Myesha Parks, que trabalha como higienista dental em Rocky Mount, Carolina do Norte, apoia Kamala principalmente por causa da posição da candidata sobre o aborto e porque "nunca foi fã de Trump".
Parks é uma batista praticante de 27 anos que cresceu se opondo ao aborto. Mas sua opinião começou a mudar depois que duas amigas foram estupradas. "Se isso acontecesse comigo, acho que não seria forte o suficiente para carregar uma criança sozinha", disse ela.
Parks acredita que Kamala, como mulher, é mais adequada para tratar de uma questão como o aborto: "Os homens não deveriam ter permissão para dizer às mulheres o que fazer com seus corpos".
"EU QUERO UM MURO"
Judy Boyce, uma comissária de bordo aposentada de Marietta, Geórgia, votou em Trump, como fez em 2016 e 2020, citando a segurança nas fronteiras e a economia. Ela vê as questões como interligadas.
"Estamos financiando muito para estrangeiros ilegais. Estou sendo politicamente incorreta, mas é isso que eles são, eles não são americanos", disse ela. Boyce, 79 anos, afirmou que esse dinheiro deveria ser destinado aos cidadãos americanos.
"Quero um muro e quero que a imigração ilegal seja reduzida a zero. Quero que essa economia volte a ser como era quando Donald Trump era presidente."
"MEU PRÓPRIO CORPO"
Sarah Weigel, uma coordenadora de eventos de 46 anos da cidade rural de Franklin, Pensilvânia, diz que não é muito engajada politicamente, mas que este ano votará em Kamala para proteger o direito ao aborto.
Ela disse que a decisão da Suprema Corte dos EUA, em 2022, que anulou a decisão Roe vs Wade, que protegia o direito ao aborto, a levou a votar.
"Para mim, é, eu acho, poder escolher o que quero fazer com meu próprio corpo", disse Weigel. "Portanto, se uma mulher quiser fazer um aborto ou não, ela deve ter o direito de tomar essa decisão por conta própria".
"TRAIÇÃO"
Terry Balko, um angariador de fundos de caridade em tempo parcial de Marietta, Geórgia, votou cedo em Donald Trump, sua escolha nas duas eleições anteriores.
Durante o café da manhã em uma cafeteria perto de sua casa, Balko disse que quer "menos inflação, um país mais seguro" e a deportação de imigrantes ilegais.
Balko ficou animado ao discutir o assunto, citando o caso de Laken Riley, uma estudante de 22 anos que foi assassinada em fevereiro, um caso ao qual Trump se refere com frequência em seus discursos de campanha. O suspeito, um venezuelano que está ilegalmente nos EUA, se declarou inocente das acusações de assassinato.
"Biden e Kamala Harris são totalmente negligentes na proteção de nossos cidadãos", disse Balko. "Eles deveriam ser acusados de traição".
MEDO DE SER ALVO
Stephanie Lopez Gilmore, 39 anos, que trabalha em um centro de bem-estar e saúde mental em Detroit, disse que estava votando em Kamala para proteger os direitos reprodutivos das mulheres. Ela também está ansiosa para ter uma mulher negra no Salão Oval.
"Como eu mesma sou uma mulher negra, é muito inspirador ver alguém que se parece com você e que talvez tenha alguns dos mesmos interesses que você e que estará liderando o país", disse.
Lopez Gilmore, que tem ascendência latina e negra, afirmou que teme que a vitória de Trump leve a um aumento da discriminação que ela sofre rotineiramente.
CONTRA O RACISMO
Noel Soto, um motorista de caminhão de 32 anos originário do México, disse que votou pela primeira vez como cidadão americano em Kamala com um objetivo claro: posicionar-se contra o racismo.
"Não gosto do lado de Trump por causa de seu racismo. Fiz isso pela minha família mexicana", declarou Soto em espanhol em um rodeio em Phoenix organizado pelos democratas para obter o voto dos latinos.
Soto disse que estava preocupado com o que achava ser mais racismo ao seu redor, especialmente por parte dos partidários de Trump.
Ele relatou um episódio em que disse que um apoiador de Trump lhe perguntou, enquanto ele estava pedindo doces ou travessuras no Halloween, se ele estava vestido como "um imigrante latino". Soto havia se vestido de fazendeiro para fazer par com seu filho de um ano, que se vestiu de vaca.