Nos últimos quatro anos, Marina Udgodskaya faxinou o prédio da administração local em Povalikhino, vilarejo rural na Rússia.
Agora, a faxineira de 35 anos está aposentando a vassoura para assumir a cadeira do chefe, depois de vencer uma eleição no início deste mês em que só havia entrado para permitir que ele fosse reeleito.
Quando ninguém no vilarejo (a 530 km de Moscou) se inscreveu para desafiar Nikolai Loktev, que é do partido pró-Kremlin Rússia Unida, ele persuadiu Udgodskaya a se registrar como sua "rival". Assim, ele garantiria o requisito mínimo de dois candidatos nas eleições.
O tiro saiu pela culatra quando a faxineira o venceu de lavada.
"Eu pedi a ela, e ela concordou. Se tivesse tido outra opção para candidato, não teria pedido", justifica Loktev. "As pessoas apoiaram ela. Muito bom para ela. Não vejo nada de incomum em sua vitória. Estou grato a ela por ter aceitado."
'Ela ficou pasma'
"Nikolai Loktev achou que ninguém votaria nela e que ele permaneceria no cargo. Mas as pessoas se cansaram e escolheram Marina Udgodskaya", disse uma integrante da comissão eleitoral local à BBC.
"Ele ficou surpreso e ela ficou pasma!", disse a mulher, que não quis ser identificada, rindo na linha telefônica.
Ela diz que ouviu pessoalmente Loktev pedir à faxineira que concorresse com ele.
Udgodskaya foi inundada com telefonemas depois que sua vitória surpreendente chegou às manchetes nacionais.
'Não fiz nada'
Desde então, ela parou de atender o telefone e está se mantendo discreta antes de sua posse no final desta semana.
Em uma das primeiras entrevistas ela pareceu surpresa com sua vitória, descrevendo-se como uma candidata "falsa" que "não estava pronta".
"Se as pessoas me elegeram, vou trabalhar para elas", afirmou.
"Não achei que as pessoas realmente fossem votar em mim", disse ela ao canal de notícias Podyom, do Telegram. "Eu não fiz nada!"
Mesmo assim, ela conquistou quase 62% dos votos. Seu chefe conseguiu apenas 34%.
Nenhum dos candidatos fez campanha ativamente antes da eleição: nenhum cartaz, nenhum folheto, nenhuma reunião com eleitores. Os locais argumentam que não é necessário, já que todo mundo conhece todo mundo.
Povalikhino, uma vila de prédios de madeira pintados em cores vivas, é a maior das 30 vilas que estão sob a égide da administração que Udgodskaya vai comandar agora. A vila possui apenas 242 habitantes.
"Fiz tudo o que era necessário no trabalho; não há problemas na aldeia", disse Loktev à BBC em um de seus últimos dias no cargo.
"É evidente que as pessoas queriam mudança", concluiu o ex-policial de 58 anos.
'Ela vai aguentar'
Alguns sugeriram que o resultado foi um protesto contra o partido Rússia Unida, ao qual Loktev pertence e que vem caindo nas pesquisas em todo o país. Em Kostroma, divisão federal onde fica Povalikhino, o partido obteve apenas 32% dos votos para o Parlamento regional.
Em outros lugares, a estratégia de voto inteligente promovida pelo político da oposição Alexei Navalny - de apoiar o candidato com maior probabilidade de derrotar o Rússia Unida, trouxe alguns rostos novos para a política.
Mas em Povalikhino, uma lojista da vila insiste que o resultado foi pessoal: Loktev simplesmente parou de demonstrar qualquer interesse em suas responsabilidades.
"Se pudéssemos ter votado contra tudo, teríamos votado, mas tínhamos a opção de votar na Marina, então o fizemos", explicou Irina.
"Acho que ela vai aguentar. A aldeia inteira vai ajudar. Embora, é claro, sua educação precise de um incentivo."
Goste ou não, Udgodskaya está presa a seu novo emprego. Se ela recusar o cargo, o Partido dos Pensionistas, que a apoia, diz que ela terá que pagar para que toda a eleição seja disputada novamente.
O partido prefere pintar sua candidata como uma figura de uma "Cinderela" do que a de uma vencedora acidental.
"Ela trabalhava na administração como faxineira e viu como tudo era feito e, é claro, em seu coração, teve a ideia de participar", diz o porta-voz Valery Gromov, ignorando sua falta de experiência.
"Svetlana Tikhanovskaya era dona de casa e também não sabia de nada! Agora ela está no auge de sua popularidade", argumenta ele, referindo-se à líder da oposição em Belarus.
Até que ela assuma seu novo papel, Marina Udgodskaya continuará com seu trabalho de limpeza enquanto o homem que ela derrotou empacota seus pertences.
"Não estou chateado", insistiu Nikolai Loktev. "As pessoas votaram nela, então deixe-a fazer seu trabalho."
Em seguida, acrescentou: "Não acho que haja nada de ruim em ela ser a responsável pelo lugar que costumava limpar. Isso significa que ela sabe o que fazer".