Como o papa emérito Bento XVI tenta culpar a revolução sexual dos anos 60 por casos de abuso sexual na igreja

Críticos dizem que a carta onde o papa que renunciou em 2013 comenta as mudanças da era é 'catastroficamente irresponsável'.

11 abr 2019 - 17h37
(atualizado às 17h41)
Bento XVI foi papa de 2005 a 2013
Bento XVI foi papa de 2005 a 2013
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

O papa emérito Bento XVI, que renunciou à liderança do Vaticano em 2013, publicou uma carta onde atribui os abusos sexuais de clérigos à "revolução sexual" dos anos 1960.

Ele diz que mudanças históricas e culturais levaram à "dissolução" da moralidade no catolicismo.

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A revolução sexual dos anos 1960 provocou a homossexualidade e a pedofilia em estabelecimentos católicos, disse Joseph Ratzinger no documento.

A carta recebeu fortes críticas de teólogos, que dizem que ela é "cheia de problemas".

Casos de abuso sexual na Igreja Católica foram documentados bem antes dos anos 1960.

O especialista em Vaticano Joshua McElwee disse à publicação National Catholic Reporter que a carta não fala das questões estruturais que permitiram que os abusos fossem encobertos, nem comenta o fato de o próprio Bento ter sido por 24 anos chefe da congregação para a doutrina da Igreja Católica.

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Julie Rubio, teóloga católica, disse num tuíte que a carta era "profundamente perturbadora".

É raro Bento XVI, que foi o primeiro papa a abdicar do cargo em quase 600 anos, intervir em assuntos clericais. Ele foi muito acusado de não conseguir proteger crianças de abusos cometidos por sacerdotes e abafar investigações, o que ele nega.

A única solução para o problema, dizia o papa, era "obediência e amor pelo Senhor Jesus Cristo".

A análise que ele fez dos escândalos sexuais que abalaram a igreja faz uma abordagem mais teológica e histórica do que a posição do papa Francisco, o atual líder do Vaticano.

Num evento em fevereiro deste ano, Francisco clamou por 'medidas concretas' para enfrentar o problema, e não apenas 'condenações simplórias e óbvias'
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Num evento em fevereiro deste ano, Francisco clamou por "medidas concretas" para enfrentar o problema, e não apenas "condenações simplórias e óbvias".

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Como ele "atuou numa posição de responsabilidade, como um pastor da igreja" num momento em que muitos casos vieram à tona, Bento XVI disse que queria "colaborar com um novo começo".

Publicada na revista católica alemã Klerusblatt, a carta de 5.500 palavras é dividida em três partes.

Pedofilia 'permitida e adequada'

A primeira parte apresenta "o contexto social da questão", onde ele lamenta que os anos 1960 tenham sido uma época na qual "padrões de sexualidade se romperam totalmente".

Ele culpa filmes eróticos, imagens de nudez e "as roupas da época" pelo "colapso mental" e pela "violência".

Na época da revolução sexual, "a teologia moral católica tinha entrado num colapso que deixou a Igreja indefesa contra as mudanças na sociedade", disse ele.

A revolução sexual fez a pedofilia ser "diagnosticada como permitida e adequada".

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Revolução sexual gerou 'grupos de homossexuais'

Em seguida, a carta examina como esse período afetou a "dissolução do conceito cristão de moralidade", principalmente em instituições educacionais católicas.

Em alguns casos, bispos "tentaram criar um catolicismo novo, moderno", e a revolução sexual gerou "grupos de homossexuais" nos seminários.

Ele diz que um bispo mostrou aos seus alunos filmes pornográficos para torná-los "resistentes a comportamentos contrários à fé".

"A questão da pedofilia, que me lembre, não se tornou aguda até a segunda metade dos anos 1980", diz ele.

Uma sociedade sem Deus

A carta conclui defendendo um retorno à fé.

"Por que a pedofilia chegou a esse ponto?", pergunta ele. "A razão fundamental é a ausência de Deus."

Papa Bento XVI se despedindo depois de deixar o cargo para cuidar da saúde, em fevereiro de 2013
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Ele diz que "a morte de Deus na sociedade" significa "o fim da liberdade" e a solução é "viver com Deus".

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Ratzinger, então, agradece ao seu substituto, papa Francisco, "por tudo o que faz para nos mostrar a luz de Deus, que não desapareceu, mesmo hoje".

O papa Francisco disse, numa carta publicada em 2018, que a igreja "não agiu rapidamente" em reação ao problema dos abusos e "não cuidou dos pequenos". "Nós os abandonamos."

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